terça-feira, 4 de outubro de 2016

João Sem Medo

SE O REGIME MILITAR DERRUBOU SALDANHA, POR QUE PERMITIU QUE ELE ASSUMISSE A SELEÇÃO?


Um simples olhar para o período de João Saldanha no comando da Seleção brasileira (entre 1969 e 1970) deixa uma dúvida em quem reflete sobre o caso. Como puderam os militares – tão atentos aos subversores – deixar um cargo de tamanha importância e visibilidade nas mãos de alguém filiado ao, então clandestino, partido comunista?

A campanha na Copa de 1966 sacudiu a elevadíssima autoestima do futebol brasileiro. Após o torneio, vários treinadores assumiram o comando do time para depois serem dispensados após uma partida apenas. Tratava-se de um cargo instável e abalado pela falta de democracia no país após o Golpe Militar de 1964. Dadas as severas críticas ao futebol apresentado na Copa da Inglaterra e nos anos posteriores, fez-se necessária uma escolha emblemática. Vicente Feola e Aymoré Moreira – os dois últimos campeões mundiais pelo Brasil – já não bastavam. Era preciso alguém popular, que se comunicasse com 90 milhões de pessoas.

O anúncio de João Saldanha pela CBD (então presidida por João Havelange) aconteceu em pleno governo de Costa e Silva. O general e presidente concordou com a nomeação. Foi através do Capitão José Bonetti que Saldanha ficou sabendo da benevolência do comandante nacional: “Eu fui chamado para a Seleção e o Bonetti – de quem eu nunca tinha ouvido falar – colocou a mão no meu ombro esquerdo e disse que o General sabia tudo sobre mim – referindo-se às prisões e ao meu perfil. Eles queriam isso mesmo, uma aproximação, uma coisa mais popular. Eu disse que tudo bem.” – relatou o ex-treinador, no programa Roda Viva, em 1987.

Bonetti ser tornaria assessor de João Havelange na FIFA, além de presidir o Conselho Nacional de Desportos, que foi descontinuado nos anos 80. O CND cumpria um papel similar ao do Superior Tribunal de Justiça Desportiva nos dias de hoje.

O momento do escrete canarinho era muito conturbado e a escolha de um nome como de Saldanha fazia sentido, mesmo se tratando de alguém reconhecidamente de esquerda. O trabalho do treinador terminou com a classificação para a Copa do Mundo de 1970, em um jogo contra o Paraguai, no Maracanã, ainda em 1969.

Na entrevista concedida ao Roda Viva, João conta um fato curioso, que não integra a história oficial: “No dia 31 de agosto de 1969, antes do jogo contra o Paraguai no Maracanã [o jogo da classificação], o General Eloy de Menezes chegou pra mim e disse que vinha do Hospital Central do Exército, onde acabara de falecer o presidente da república. Me perguntou se eu achava que deveríamos fazer um minuto de silêncio. Eu respondi que isso não era comigo, era com o árbitro. O Eloy foi jogador e eu tinha intimidade com ele. Jogou no Fluminense e depois no Vasco. Eu ainda avisei sobre aquilo que o Nelson Rodrigues dizia: que o Maracanã vaiava até um minuto de silêncio. Ele me disse que ia pensar no que fazer. Eu insisti que ele se comunicasse com o juiz. Saí pro campo e não houve nada. A morte do Costa e Silva foi anunciada em 14 de novembro daquele ano”

*17 de novembro, segundo os registros públicos.

“Em março de 1970, veio esse cara, o Médici. Mau, rancoroso e frio. O maior assassino da história do Brasil.” — João Saldanha

Saldanha continua, explicando a ordem dos fatos que culminaram em sua controversa demissão do cargo de treinador da Seleção: “Em seguida veio o Triunvirato – um General do Exército, um da Marinha e outro da Aeronáutica no governo. Eles não se incomodaram muito comigo. Três meses depois, em março de 1970, veio esse cara, o Médici. Mau, rancoroso e frio. O maior assassino da história do Brasil. Eu já sabia e um dos meus patrões – um que sabia das coisas – me disse que não dava mais pra mim.”

O programa retomou as especulações que são levantadas até hoje – a de que Saldanha havia declarado que Pelé enxergava mal, por exemplo. João, sem medo, desmentiu todas elas. Mas com relação a Dario, o Dadá Maravilha, Saldanha fez algumas ressalvas. Disse que Havelange cansou de pedir para convocar o centro-avante do Atlético Mineiro, só para ficar bem com o “homem”.

Havelange também pediu para que Saldanha renunciasse, mas o ex-treinador insistia que jamais faria isso e que não havia problema se quisessem mandá-lo embora. Quando um repórter, na época, questionou-o sobre uma suposta intervenção de Médici nas convocações, João proferiu a célebre frase que sacramentou sua saída do comando da Seleção: “O presidente e eu temos muitas coisas em comum: somos gaúchos, somos gremistas e gostamos de futebol. Mas nem eu escalo ministério, nem o presidente escala time.” Foi uma jeito elegante e inteligente de se posicionar, estabelecer limites e deixar claro o porquê de sua saída.

“O presidente e eu temos muitas coisas em comum: somos gaúchos, somos gremistas e gostamos de futebol. Mas nem eu escalo ministério, nem o presidente escala time.” — Saldanha manda recado para Médici

É verdade que os militares sabiam quem era João Saldanha ao permitir que ele assumisse um cargo de prestígio popular naquele momento. Mas os dias do treinador estavam contados depois da morte de Costa e Silva e a designação de Emílio Garrastazu Médici como novo presidente após o Triunvirato.

O regime militar no Brasil se intensificou após a chegada de Médici, que apoiou firmemente a execução do AI-5 pouco antes de assumir a presidência. Aliás, o novo presidente foi um assíduo usuário do polêmico Ato Institucional em questão. A medida subordinou os poderes legislativo e judiciário ao poder executivo. Curiosamente, foi em 1970 que a atual presidente Dilma Rousseff foi presa. O artigo 10 do AI-5 suspendia a garantia de habeas corpus para casos de crimes políticos ou que afetassem a segurança nacional e a ordem econômica e/ou social.

A censura se estendeu à imprensa, música, teatro e cinema. Ou seja, as ferramentas sociais de expressão estavam a favor do regime militar. Permitir que João Saldanha retornasse triunfante da Copa de 1970 seria equivalente a dar poder e visibilidade a um membro do partido comunista.

A entrevista seguiu por mais uma hora e meia. Saldanha manifestou claramente que o problema do futebol brasileiro estava diretamente relacionado aos campeonatos estaduais. Alguns pontos e análises pareciam ser mais atuais do que os que estão em pauta quase trinta anos depois. João, sem medo algum, impôs um tom quase profético quando falava dos volantes de marcação, os ainda chamados cabeças-de-área, e como essa posição representava o atraso técnico e tático daquele momento do futebol brasileiro.

Em tempos de Dunga — outra vez! —, recomenda-se uma visita àquela entrevista ao Roda Viva. Uma prova de que o futebol brasileiro anda em loop há mais de três décadas, contaminado pela derrota de 1982 e pelas conquistas de 1994 e 2002, que nada deixaram além de soberba com ressalvas aos poucos craques — craques mesmo — presentes nos títulos, como Romário, Bebeto, Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho. Essa contaminação gerou o conceito de que o resultado é mais importante que a forma e foi a grande responsável por conduzir o futebol brasileiro ao estrangulamento do 7 a 1.


Fonte: REVISTA  CORNER

São Pólo

São Paulo terá faixa exclusiva para Land Rovers

3 DE OUTUBRO DE 2016 POR LUCIANA OLIVEIRA


O prefeito eleito também criará faixas equestres para a prática do pólo Revista Piauí

MIAMI – Eleito em primeiro turno, João Doria Jr. apresentou suas primeiras medidas para acelerar o desenvolvimento da cidade: “Fechamos um acordo com a Land Rover, que vai assumir todos os custos das ciclovias. Com isso, as faixas vermelhas serão pintadas nas cores da logomarca da empresa sem onerar a prefeitura. As ciclovias serão transformadas em faixas exclusivas para a circulação de SUVs da Land Rover”, explicou.

Segundo Doria, o modelo será ampliado para outras áreas, como saúde. Hospitais públicos receitarão preferencialmente medicamentos das empresas farmacêuticas que comprarem os naming rights das unidades. “Assim, caso o Hospital Municipal de M’Boi Mirim passe a se chamar Hospital Municipal M’Boi Sanofi Mirim, o paciente que estiver sentindo aquela dorzinha chata receberá 30 gotinhas de Novalgina. Mas caso tenha alergia ao medicamento e prefira aspirina, não precisará se preocupar. Basta que procure uma unidade da rede patrocinada pela Bayer”, explicou o prefeito eleito. “São medidas que estimulam a meritocracia, o trabalho duro e as minhas permutas com empresários”, acrescentou.

No campo da habitação, receberá créditos preferenciais quem já mora em cobertura mas sonha em trocar a atual unidade por um apartamento em Orlando. “Com isso, enfrentaremos o congestionamento das ruas de São Paulo e simultaneamente estimularemos a economia da Flórida, que emprega tantos dos nossos compatriotas”, disse Doria, negando, contudo, rumores de que a Prefeitura irá criar o programa “Meu Cabernet, Meu Paladar”. “No máximo, subsidiaremos o consumo de vinhos bem estruturados da Borgonha”, adiantou.

O prefeito eleito também anunciou que manterá a Paulista fechada nos finais de semana. “Para estimular o cosmopolitismo da cidade, entre a Brigadeiro Luis Antonio e a Bela Cintra só será permitido falar inglês”

Fonte: Blog da Luciana Oliveira
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Exclusivo!
Vaza imagem do novo uniforme do Ensino Municipal em São Paulo

Fonte: A JUSTICEIRA  DE  ESQUERDA
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segunda-feira, 3 de outubro de 2016

A vocação do Rio de Janeiro

Marcelo Freixo e a utopia da esquerda

Postado em 03 Oct 2016
por : Leonardo Mendes



Marcelo Freixo, o candidato do PSOL

A chegada do candidato do PSOL Marcelo Freixo ao segundo turno no Rio de Janeiro já pode ser considerada uma grande vitória.

Freixo tinha 11 segundos de propaganda na TV, contra 3 minutos e 30 segundos do candidato do PMDB Pedro Paulo, terceiro colocado na disputa e a campanha mais cara do país.

Freixo é também criminosamente perseguido já há muitos anos pela Globo, grupo empresarial que sempre guardou um carinho materno pelo atual prefeito do Rio Eduardo Paes, padrinho político de Pedro Paulo.

A Globo chegou no mês passado a oferecer uma medalha de ouro a Paes, na coluna de Noblat, um dos principais porta-vozes da família Marinho. Não se sabe se o mimo era pelas Olimpíadas ou pelos fartos anúncios que Paes sempre monopolizou no jornal em que Noblat escreve.

Já contra Freixo, a Globo chegou a produzir manchetes históricas, exemplares perfeitos do jornalismo marrom que praticam, como a do “estagiário do advogado diz que ativista vândalo afirmou ter ligação com Marcelo Freixo”, dias depois da morte do cinegrafista Santiago.

Freixo só podia contar com o apoio de “burguês metido a pobre” e “vagabundos”, segundo a vice de Pedro Paulo, Cidinha Campos.

A neta de Cidinha respondeu então que achava “melhor burguês metido a pobre do que burguês que odeia pobre”, e confirmou o voto em Freixo. Estavam criados os melhores memes dessa eleição.

Foi uma vitória dos memes, do engajamento de jovens nas ruas e nas redes, uma vitória das mídias alternativas, do acesso à internet.

Uma vitória da militância, dos movimentos sociais, de defensores do estado laico, dos direitos humanos, da distribuição de renda…

Uma vitória contra a TV, contra o jornalão, contra Cidinha, Temer, Cunha, PMDB.

Contra o atraso, o conservadorismo, a extrema-direita, fascistas, tucanos, banqueiros, bolsonaros.

Uma vitória da utopia de todos aqueles que ainda acreditam ser possível. Que acreditam que o voto é sua arma, e que eleger um bom governante pode de fato melhorar o mundo.

Talvez isso também esteja perto de acabar, e já não possamos sequer sonhar com um governo digno.

Na maioria das cidades já é assim.

Com a disputa agora entre o coronel e o bispo. Ou com o lobista eleito em primeiro turno.

Fonte: DIÁRIO DO CENTRO DO MUNDO
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Com a chegada da ditadura militar em 1964, o país passou a ter dois partidos políticos. A ARENA, dos milicos, e o MDB, daqueles contrários a ditadura. Naturalmente, pessoas contrárias a ditadura, mesmo de ideologia de direita, se alinharam com o MDB. Na outra extremidade do MDB estavam pessoas de ideologia de esquerda.

Assim foi criado, dentro do MDB, o grupo dos Autênticos, com políticos de ideologia mais a esquerda. Nas eleições parlamentares de 1970, o Rio de Janeiro, na época Estado da Guanabara, talvez tenha sido o estado que elegeu, proporcionalmente, o maior número de deputados ligados ao grupo Autênticos.

Em 1974, nas eleições parlamentares, a ARENA sofreu uma tremenda derrota, com o MDB vencendo na esmagadora maioria dos estados. A Guanabara, na época já se transformando em Estado do Rio de Janeiro, atropelou a ARENA no estado.

Em 1982, já com a existência de novos partidos políticos - quase todos criados em 1980 com o consentimento da ditadura decadente - aconteciam as primeiras eleições livres para governadores dos estados. A ARENA, reciclada como PDS ,e o MDB, transformado em PMDB - a legislação criada pelos milicos ( General Golbery) exigia que todos partidos políticos tivessem o P de partido no nome - surgiam, por força de suas bases, como principais favoritos nas eleições daquele ano na maioria dos estados. E de fato assim aconteceu, com exceção, claro, para o Rio de Janeiro, que desde 1970 não se contentava, apenas com o 'Sim' ( MDB) e o 'Sim Senhor' ( ARENA), e , com isso, para desespero dos milicos e da Globo, elegeu Leonel Brizola do PDT para o governo do estado. Era a chegada do socialismo democrático moreno nas terras fluminenses. Na ocasião, Moreira Franco, hoje ministro do governo do golpe, foi o candidato do PDS, dos milicos, derrotado por Brizola.

Em 1986, com a farsa do plano cruzado implementado pelo governo federal do PMDB de Sarney, a maioria da população brasileira acreditou que com o plano, a inflação - naquela época estratosférica - seria controlada. Qualquer semelhança com os que hoje vão para a Av.Paulista e Av.Atlântica acreditando no fim da corrupção não é mera coincidência. Uma parcela da população foi , é e ainda será bovina. Com a farsa do plano, lançado próximo das eleições de 1986, o PMDB elegeu a maioria dos governadores pelo país, inclusive no Rio de Janeiro, onde o mesmo Moreira Franco, na ocasião então no PMDB e hoje no golpe, derrotou Darcy Ribeiro, candidato de Brizola.

Chega o ano de 1989 e com ele as primeiras eleições livres para presidente da república desde 1960. Todo mundo se candidatou, mas, para o segundo turno passaram o João Dória da época ( Fernando Collor ) e Lula, que disputou voto a voto com Brizola o segundo lugar. Collor, apresentado como o caçador de marajás, o homem que iria acabar com a roubalheira no país, se elegeu por uma sigla nanica, de aluguel, o PRN - Partido da Reconstrução Nacional. Tão logo eleito, cabe o registro, o PRN se transformou na maior bancada da Câmara com uma corrida de parlamentares trocando de partido para se filiar ao novo que salvaria o país dos ladrões e oportunistas.

Naquela eleição um fato merece destaque. O Rio de Janeiro foi o estado que deu a maior votação para Lula, tanto no primeiro como no segundo turno. No segundo turno, Lula teve 75% dos votos do Estado, claro, com o apoio de Brizola que transferiu todos seus votos para o petista. São Paulo, como de costume, caiu mais uma vez no conto do vigário e apoiou em massa Collor.

O resultado da eleição, todo mundo sabe. Collor venceu Lula em uma disputa que teve até manipulação do debate , um apoio inestimável proporcionado pela TV Globo.

No ano seguinte, em 1990, aconteciam as eleições para governadores. Surgia, então, na disputa o PSDB, um partido criado em gabinetes do Congresso Nacional, que no Rio de Janeiro jamais seduziu o eleitor que o chamava de PMDB elegante, diferentemente do PT, partido criado nas lutas populares, nos sindicatos, nas ruas. Mais uma vez, o Rio elegeu Brizola. No Rio, o PSDB elegeu apenas Marcelo Alencar governador em 1994. Cabe lembrar que Marcelo Alencar foi , durante a ditadura, advogado de presos políticos e na redemocratização do país um quadro importante no PDT de Brizola, de onde saiu para o PSDB.

Nesse ano de 1994, o PRN, lembra dele?, que tinha a maior bancada da Câmara já definhava com o impeachment de Collor, acontecido em 1992.

No Rio de Janeiro, em 1992, o carioca colocava Cesar Maia - PMDB - na prefeitura da cidade e, no ano de 1998, Antony Garotinho - PSB -no governo do estado

Cabe ressaltar que Marcelo Alencar, Cesar Maia e Garotinho , como dizia Brizola. foram banhados em águas do PDT, de onde saíram para outros partidos e se elegeram.


Neste  século o Rio de Janeiro não se omitiu e fez valer sua vocação, elegendo Lula, duas vezes e Dilma, também duas vezes. 

Protagonizou uma das maiores manifestações espontâneas de rua, em 2013, quando a população foi às ruas exigir qualidade e preços justos nos serviços públicos.

Foi, e tem sido, um dos principais centros de resistência ao golpe jurídico-parlamentar -midiático  deste ano.

Agora, com a eleição municipal de segundo turno, o carioca , mais uma vez, fará a leitura sobre o futuro da cidade e, consequentemente, a mensagem que reverberará para o país.

O conservadorismo retrógrado e obscuro que apoiou o golpe ou o caminho libertário e democrático.

O Rio de janeiro deve seguir sua vocação de ousadia, e isso de fato acontecerá , para um lado ou para o  outro, uma vez que os dois projetos em disputa são diametralmente opostos.

Assim como em 1970, o Rio dirá se é Autêntico ou Sim Senhor:

Crivella  X  Freixo;
o passado X o futuro;
o fundamentalismo religioso  X  o estado laico;
a era medieval  X  o pós-modernismo;
a contenção da democracia  X  a expansão da democracia;
a aceitação do golpe  X  a resistência ao golpe;
o resgate de um projeto mundial decadente  X  a ousadia da criação de um novo modelo;
a bíblia  X  a internete;
a religião  X  a espiritualidade;
o humanismo esgotado  X  a criação de um novo humanismo;
a ecologia como ramificação  X  a ecologia no centro das decisões;
a visão de Claudius Ptolomeu  X  a visão de Werner Heisenberg;
binóculos  X  radar quântico;
o Poder centralizado  X  o Poder para o povo;
the family  X  all you need is love;
Grupo Record de mídia  X  todas as mídias;
milagre  X  ciência;
pastor do agronegócio  X  agricultor familiar;
homogeinização  X  diversificação

Vitória esmagadora do PNAB

Vitória da antipolítica

03 de outubro de 2016 Redação


Soma de votos brancos, nulos e abstenções “venceria” 1º turno em nove capitais

na Agência Brasil

Em nove capitais, o número de votos brancos, nulos e de eleitores que não compareceram foi maior do que do candidato que ficou em primeiro lugar. A situação aconteceu nos dois maiores colégios eleitorais do país. Em São Paulo, João Dória (PSDB) ganhou a eleição no 1º turno com 3.085.187 votos. O número é menor do que a soma de votos brancos e nulos e ausências: 3.096.304.

No Rio de Janeiro, a situação também se repetiu. Mesmo que fossem somados os votos dos dois candidatos que passaram para o 2º Turno, o número ainda é menor do que votos inválidos e ausências. O total de brancos, nulos e abstenções no Rio é 1.866.621. Marcelo Crivella (842.201) e Marcelo Freixo (553.424) somam 1.395.625 votos.

Além de São Paulo e Rio de Janeiro, Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Curitiba (PR), Belém (PA), Cuiabá (MT), Campo Grande (MS) e Aracaju (SE) também tiveram mais votos inválidos do que o primeiro colocado nas eleições. Confira lista:

Aracaju (SE)
Eleitores: 397.228
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 139.723
1º lugar: Edvaldo Nogueira (PCdoB) 99.815

Belém (PA)
Eleitores: 1.043.219
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 365.731
1º lugar Zenaldo Coutinho (PSDB) 241.166

Belo Horizonte (MG)
Eleitores: 1.927.456
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 741.915
1º lugar João Leite (PSDB) 395.952

Campo Grande (MS)
Eleitores: 595.172
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 167.922
1º lugar Marquinhos Trad (PSD) 147.694

Cuiabá (MT)
Eleitores: 415.098
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 127.987
1º lugar Emanuel Pinheiro (PMDB) 98.051

Curitiba (PR)
Eleitores: 1.289.204
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 360.348
1º lugar Rafael Greca (PMN)356.539

Porto Alegre (RS)
Eleitores: 1.098.517
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 382.535
1º lugar Nelson Marchezan Júnior (PSDB) 213.646

Porto Velho (RO)
Eleitores: 319.941
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 106.844
1º lugar Dr. Hildon (PSDB) 57.954

Rio de Janeiro (RJ)
Eleitores: 4.898.044
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 1.866.621
1º lugar Crivella 842.201

São Paulo (SP)
Eleitores: 8.886.195
Soma de votos brancos, nulos e abstenções: 3.096.304
1º lugar João Dória 3.085.187


Fonte: O CAFEZINHO
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Alckmin ganha força para 2018; PSDB e PSOL os grandes vencedores, com Freixo no segundo turno no Rio; PT toma surra e Temer afunda

02 de outubro de 2016 às 19h58


Da Redação

Venceu a rejeição “a tudo o que está aí”.

Venceu a antipolítica.

Perdeu o status quo.

Em São Paulo, o “gestor” João Doria se elegeu prefeito em primeiro turno surfando no pavoroso desempenho eleitoral do prefeito petista Fernando Haddad.

Aposta do governador Geraldo Alckmin, ele conquistou a Prefeitura da maior metrópole do país vencendo praticamente em toda a cidade.

Para bancá-lo como candidato do PSDB, Alckmin teve de vencer a resistência de líderes partidários como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e José Serra, causando um racha que talvez resulte na saída do atual ministro das Relações Exteriores do partido.

No extremo Sul de São Paulo, tradicional reduto petista, quando quase metade dos votos tinham sido contados Doria tinha 29% contra 17% de Haddad. Ali, em seu melhor desempenho eleitoral, a recém-convertida ao PMDB, Marta Suplicy, liderava com 36%.

No geral, Marta teve um desempenho sofrível, com cerca de 10% dos votos. Doria venceu mesmo no extremo da zona Leste de São Paulo, onde Haddad dividiu votos com Marta e Celso Russomano. Em algumas regiões, o tucano teve mais de 60% dos votos.

A taxa de abstenções mais brancos e nulos em São Paulo foi altíssima: quase 39%. Ou seja, Doria conquistou seu mandato em primeiro turno com pouco mais de 30% do eleitorado total do município.

1. O PSDB foi o grande vencedor da noite. Conquistou a prefeitura de São Paulo, foi para o segundo turno em Porto Alegre e Belo Horizonte e em redutos tradicionais do PT, como São Bernardo, onde o candidato petista ficou em terceiro lugar. Porém, onde já governavam, os tucanos sentiram o baque da revolta dos eleitores e vão enfrentar segundo turno em Belém e Manaus.

2. O PSOL conseguiu dois resultados notáveis. Marcelo Freixo avançou para o segundo turno contra Crivella (PRB) no Rio de Janeiro e Edmilson vai disputar o segundo turno contra o prefeito tucano Zenaldo Coutinho em Belém.

3. O PT deve eleger em primeiro turno o prefeito de Rio Branco e, nas capitais, só avançou ao segundo turno em uma capital, Recife — por pouco. A avaliação do desastre para o PT depende dos resultados completos das 989 prefeituras disputadas pelo partido. Alguns resultados no Nordeste não foram nem um pouco animadores: em João Pessoa o candidato do partido teve cerca de 4% dos votos, em Natal 10% e em Fortaleza 15%.

4. O PMDB tomou uma surra no Rio de Janeiro, onde Pedro Paulo teve cerca de 16% dos votos. É pouquíssimo, para quem foi bancado por um prefeito que torrou rios de dinheiro público em obras para a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Em São Paulo, Marta Suplicy, atraída pela cúpula do PMDB, teve desempenho sofrível. Em Porto Alegre, o candidato do PMDB foi surpreendido pelo avanço de última hora do tucano Nelson Marchezan Junior.

5. Individualmente, o grande vitorioso da noite foi ACM Neto, em Salvador, reeleito com 74% dos votos. Em Curitiba, Gustavo Fruet (PDT) foi outro que sentiu o inconformismo dos eleitores e nem avançou ao segundo turno.

Há fortes sinais de uma guinada à direita, ainda que as eleições municipais sejam cheias de particularidades. Parece claro que o inverno do PT está apenas começando e que a antipolítica representada pelo “gestor” João Doria tem futuro eleitoral. Digna de nota a votação de Flávio Bolsonaro (PSC) no Rio de Janeiro, com 14%. A soma de brancos e nulos praticamente empatou com a votação de Marcelo Freixo.

O dia foi particularmente ruim para o usurpador Michel Temer, que votou “de madrugada” para fugir de protestos enquanto a presidente Dilma Rousseff e os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso encararam os eleitores em seus respectivos locais de votação. O contraste ficou evidente.

PS do Viomundo: No Rio, Freixo superou Pedro Paulo por cerca de 2% dos votos, que podem ter sido originários da migração de eleitores de Jandira Feghali (PCdoB), que terminou com pouco mais de 3%. Em Porto Alegre, a soma de Raul Pont e Luciana Genro seria suficiente para passar um dos dois ao segundo turno.

PS2 do Viomundo: Em São Gonçalo, na Baixada Fluminense, foram 21,69% de abstenções, 16,9% de nulos e 7,7% de brancos.





Fonte: VIOMUNDO
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PNAB - Partido de nulos, abstenções e brancos - é o grande vencedor das eleições.

Somando, apenas, os eleitores das cidades listadas no texto acima de Cafezinho, se tem algo em torno de 15% do eleitorado brasileiro, mais ou menos 20 milhões de eleitores das cinco regiões do país.

Uma amostra significativa, que projeta para todo Brasil o sentimento do eleitor. Para o PT uma derrota previsível, grande, é verdade, mas que não acaba com o partido que a partir de agora deve se refundar.


Os políticos que venceram as eleições estão longe de representar o sentimento da maioria das pessoas de suas respectivas cidades.

Uma negação aos políticos e, principalmente, a forma do fazer política atual, demonstram de forma clara o recado das urnas.

A tentativa da grande mídia em apresentar vitoriosos nas urnas - como o prefeito eleito de São Paulo - como sendo uma expressão do novo que o brasileiro deseja, não passa de uma manipulação grosseira da realidade. A vitória de João Dória em São Paulo e a confirmação de Marcelo Freixo no segundo turno no Rio de Janeiro, são resultados da insatisfação do eleitor com o cenário político do país, onde São Paulo, como de costume,  corre para o velho e para o conservador, e o Rio de janeiro, como de costume, inaugura o novo, o  jovem e a vanguarda, ainda que com a sombra de um fundamentalismo religioso e retrógrado podendo governar a cidade.

O novo, em meio a um cenário ainda bem opaco na realidade política do país, ainda não chegou. Sua chegada, pelo que foi expresso nas urnas, depende de uma profunda reforma política que acabe com privilégios ( políticos donos de veículos de mídia, por exemplo) e que aprofunde o processo democrático, algo na contramão da onda conservadora mundial de contenção e restrição da Democracia.

Assim sendo, não se pode imaginar uma reforma política séria com o status quo político.

A democracia deve ser reinventada através do poder local, das cidades e contagiar o país.

Nesse aspecto, o Rio de Janeiro tem uma oportunidade extraordinária com Marcelo Freixo, que em seu programa contempla aspectos como orçamento participativo, aprofundar o processo Democrático, criação de conselhos populares, valorização da cultura, dentre outros aspectos não menos relevantes.

O Rio terá uma disputa no segundo turno entre a idade média e o pós -modernismo, entre o fundamentalismo religioso e o estado laico, entre o atraso e a vanguarda e, principalmente, entre tudo aquilo que representam São Paulo e o Rio de Janeiro no cenário nacional.

A vitória de Freixo no segundo turno é a luz para Democracia brasileira, e o Rio de Janeiro não pode perder sua vocação.

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Mais velho

Foucault, as Palavras e as Coisas

POR FRAN ALAVINA– Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da USP. Mestre em Estética e Filosofia da Arte pela Universidade Federal de Ouro Preto, UFOP.
ON 29/09/2016CATEGORIAS: BRASIL, CAPA, POLÍTICAS



É sintomático que Temer odeie o termo “golpe”. Nas “democracias” esvaziadas, não se tenta usurpar apenas o poder político, mas também o sentido dos termos. Por isso, a Resistência é também um ato linguístico

Por Fran Alavina

Parafraseando um texto clássico de Michel Foucault, As palavras e As Coisas [Le Mots et Les Choses] que agora em 2016 completa 50 anos de sua primeira edição, podemos afirmar que o poder se exerce sobre as palavras e as coisas. E nesses dias trágicos da vida nacional popular, tal se mostra cada vez mais claramente. O pensador francês nos faz ver ao longo de sua obra, arguta e perspicaz, que o poder não se exerce apenas sob a forma dos aparelhos repressores — ou seja, o poder não é apenas aquele que se impõe pela força física, pela coação do corpo. O poder também se faz no e por meio dos discursos. Mesmo aqueles que não são proferidos dos clássicos lugares do poder, são discursos de poder. Por isso, o caráter discursivo do Golpe não é menor que seu caráter político. São indissociáveis, pois não há política sem discurso, não há vida política sem a ação das palavras que significam e ressignificam as coisas. Sem a palavra, sobra ao poder apenas a coação física, mas esta forma, embora possa ser mais rápida e direta, é menos sutil, portanto mais fácil de ser denunciada. Espinosa, pensador seiscentista, ao denunciar os mecanismos de poder, nos lembra que: “o maior poder é aquele que reina sobre os ânimos (…)”1. Ora, mas como se estrutura esse poder que dispensando a força física, se exerce diretamente sobre os ânimos? Ele se estrutura pelos discursos, é sustentado pelas palavras, uma vez que há uma vinculação direta entre os nossos ânimos e os sentidos das palavras e das coisas.

Desde os gregos, e depois com a tradição retórica civil dos romanos, é fato que a palavra detém maior força nos regimes democráticos e republicanos. A possibilidade da palavra pública torna vivaz a vida democrática, pois os outros regimes políticos são regimes da letra morta (quando na oligarquia o direito da multidão transforma-se nos privilégios de alguns), ou da palavra de um só (nos regimes monárquicos). Ora, segundo aqueles autores da antiguidade clássica, primeiros justificadores da vida democrática, onde a Democracia fenece, degenera-se conjuntamente a potência da livre palavra. Desse modo, todo livre discurso público, toda fala coletiva é índice de vivacidade do regime democrático.

Assim, quando em uma Democracia, as palavras e seus sentidos — que são um bem comum, cotidiano e simbólico de todos, posto que pertencem ao povo, que age delimitando e estabelecendo novos sentidos — são forçadas a mudar pelo árbitro de um, ou de um grupo particular, sabemos que há algo fora da normalidade democrática. Usurpações de poder nunca se restringem apenas à esfera institucional mais imediata. Se o poder se faz pelo discurso, de modo que o próprio discurso é um elemento de poder, o discurso é o poder que se faz não apenas sobre os falantes, mas também se exerce sobre o próprio discurso, isto é, se exerce também sobre as palavras e os termos, que são a unidade mínima de todo discurso. O comando discursivo é a voz do poder; e o silêncio, o signo da obediência: consentida ou imposta.

É próprio dos regimes totalitários proibirem o uso de termos, promovendo um tipo de higienização da língua e dos discursos. Na Itália fascista de Mussolini, por exemplo, procurou-se varrer do território italiano todo falar e expressividade dialetal. A língua do povo era tida como indigna da suposta supremacia do novo regime. Supremacia que também deveria ser linguística e expressiva. No Brasil, este caráter fascista da imposição linguística e vocabular se exerce todos os dias pelo ódio de classe e pela busca de distinção social, quando aqueles que dominam a norma culta da língua usam este elemento como caráter distintivo e discriminatório. Tal vertente fascista se expressa mais ainda quando a língua do povo, gírias e construções discursivas forjadas no cotidiano nacional-popular são levadas para a mídia sob a forma do entretenimento. Sempre apresentada com a roupagem do exótico, escondendo por baixo da capa da curiosidade e do riso, o preconceito vocabular. Quem quiser ver uma boa amostra disso, acesse, por exemplo, os programas da Regina Casé, mais particularmente o “esquenta”. Neste, há a redução da língua do povo ao riso e ao escracho. O jeito espontâneo e criativo de falar do povo torna-se o divertimento dos telespectadores.

Ou ainda, por exemplo, quando os jovens da classe média paulistana tentam se apropriar das expressões da quebrada. Cada vez que pronunciam um mano, ou um suave em tom afirmativo, cometem um estupro vocabular. As palavras saem de suas bocas como que empurradas e constrangidas, pois são usurpadas do mundo de sentido no qual foram forjadas. São obrigados, os jovens da classe média, a usurpar termos, porque seu mundo linguístico é de uma penúria espantosa. A linguagem dos meios técnicos-midiáticos-informacionais lhes rouba a expressividade espontânea e a criatividade vocabular, uma vez que vivem atochados entre a imposição da norma culta e o poder da linguagem uniformizada das mídias. Dessa maneira, são forçados a ser delinquentes da língua. Não podendo usar a norma culta imitando sua melhor forma, por um lado; por outro, também não podendo criar novos termos, pois a uniformização midiática retira dos falantes a criatividade linguística, não lhes resta senão usurpar e copiar em uma imitação pobre e simplória. Fazem como fizeram seus pais ao saírem às ruas nos domingos protofascitas. Copiavam a melodiam da música de Vandré, Pra não dizer que não falei das flores, ou imitavam e usurpavam a palavra de ordem Lula, guerreiro do povo brasileiro, por uma frase de mesmo sujeito, mas de predicado diferente. Esta pobreza criativa da expressividade ganha sua forma mais loquaz no uso das camisas da CBF. Não poderia ser diferente, nada nos domingos protofascistas era espontâneo, pois não há espontaneidade no fascismo.

Essas usurpações discursivas cotidianas agora se mostram sob outro prisma, aquele político, dos discursos do centro do poder. O novo velho que chega pela usurpação, isto é, pelo Golpe, demanda a criação de legitimidade, operando em um sentido contrário ao da normalidade. Pois em regimes democráticos se supõe que quem chega ao poder, chega em virtude da legitimidade popular. De modo que essa legitimidade precede o próprio exercício do poder, logo este último é a própria expressão da legitimidade. Nos casos anormais, como o que vivemos, o exercício do poder precede a legitimidade. Por isso, sendo ilegítimo, necessita criar rapidamente uma legitimidade forçada, falsa e artificial, porém que sirva de cortina para esconder a violência brutal de chegar ao poder pela usurpação. Para tanto, a criação da legitimidade, precedida por uma violência, também ocorre de modo violento. Trata-se de anular as narrativas divergentes, de proibir termos, de querer dobrar à força o sentido das palavras e das coisas. Criando, dessa maneira, uma uniformização narrativa, que é o roubo da livre palavra, o cerceamento da divergência no espaço da palavra pública. É evidente que o poder usurpador e ilegítimo não pode fazer isso sozinho, pois o sentido das palavras e das coisas não é monopólio de ninguém.

Ocorre, porém, que isto, o furto da livre palavra não é algo extraordinário, posto que nas democracias contemporâneas a livre palavra é ameaçada hodiernamente pelos impérios mediáticos. De fato, são verdadeiros impérios, pois são propriedades de famílias que agem despoticamente em favor de seus próprios interesses. De tal modo, que o espaço público da livre palavra não é outra coisa que a defesa de interesses privados e escusos. Tal nos remete, desde já, para um dos sintomas de crise das democracias representativas contemporâneas. Estas estão intrinsecamente unidas à formação da esfera pública da livre expressão por meio da imprensa. Mas quando aquilo que antes esteve ligado à própria constituição da vida democrática torna-se seu veneno, estamos em um curto circuito constitutivo.

Não apenas o exercício do poder político é delegado aos representantes que o exercem em nome dos eleitores, mas a própria possibilidade da livre palavra, do direito ao espaço público da fala se dá por meio da representação. De modo que a livre expressão também está nas garras, isto é, presa aos limites da representação. Com efeito, este exercício da livre palavra feita de modo representativo ocorre quando aquilo que se considera ser a opinião pública se identifica diretamente com o monopólio midiático, quando a opinião pública nada mais é que o acordo forjado entre o editorial do grande jornal e a notícia manipulada da capa, sob o signo de ser um fato; e, não uma informação. Desse modo, quando a opinião pública é tragada pelo monopólio faccioso da notícia, já está montado todo um arsenal de usurpação da livre palavra que precede a própria usurpação do poder. Antes da usurpação feita pelo golpe institucional, já havia a usurpação da palavra, isto é, o golpe cotidiano que é dado contra toda voz divergente.

Donde a livre palavra estar constantemente ameaçada, mesmo na Democracia, pois a regra é a manipulação sob a forma da informação. Contudo, há coisas que são de tal modo absurdamente usurpadoras que nem a mais ferrenha manipulação pode esconder, ou escamotear. É o caso do uso da palavra GOLPE! Ora, sobre ela não se trata simplesmente de uma disputa de narrativas diferentes. Mas, da legitimidade das narrativas, sustentada no sentido, e não no termo em si. É o sentido da palavra que impõe ao usurpador a vergonha de não querer carregar sobre si o termo. Não só isso, a recusa do termo golpe esconde um sentido mais amplo, porém pouco discutido. Trata-se dos golpes contíguos que se seguem do golpe maior. Como é o caso da reforma da providência, cujo sentido do termo reformar é revogar. É o caso da flexibilização da CLT, cujo sentido é o mesmo: revogar. Também no caso da reforma do ensino médio, cujo sentido do termo é enfraquecer e fragilizar a educação pública. Há outros inúmeros exemplos do mesmo tipo, de distorção entre o termo e o sentido, mais que se nutrem de um sentido maior: golpe. Golpe contra a previdência, contra as leis trabalhistas, golpe contra o ensino publico. O governo usurpador, ao usurpar o poder, também busca usurpar o sentido das palavras e das coisas.

O jogo político também se decidirá sobre o plano linguístico, pois é no campo discursivo, apontando o real sentido dos termos, que a denúncia dos golpes contíguos, que tentam se seguir do golpe maior, deverá ser feita. Toda denúncia no jogo do poder também é um ato discursivo: que dá a ver o que deve mostrar2. O ato de desnudar o sentido que os termos do governo usurpador escondem também é um oportunidade para reconstruirmos nosso léxico político, que agora se nutre do sentido maior da Resistência. É preciso forjar o novo sentido da resistência, um novo vocabulário político que nasça das ruas, que agora ocupamos, e que não seja cooptada pela linguagem da homologação e da uniformização midiática.

Podem até distorcer os sentidos das palavras e das coisas em consonância com a usurpação do poder; podem tentar nos impor o monopólio da fala pública e a uniformização da opinião, mas não nos calarão! Podem nos cercear, mas não silenciaremos. Carregamos os sentidos da Resistência em nosso próprio corpo, desde o dia em que ousamos ser mais do que aquilo a que nos destinavam. A voz silenciada não emudece o pensamento, embora lhe possa desferir golpes lancinantes. Cada palavra de ordem que gritarmos, cada termo que forjarmos na nossa hodierna não trégua ao golpismo difuso, será um ato de restituição da livre palavra da qual se nutre a vida verdadeiramente democrática. A Resistência também é um ato linguístico: é o ato da fala persistente, é o ato da voz ousada que sustenta o sentido: das palavras e das coisas. E dar sentido às palavras e às coisas é um dos atos de resistências mais primordiais, quando além de usurparem o poder, querem usurpar até mesmo a nossa voz. Para tanto, sirvam-nos de inspiração as palavras de nosso maior poeta popular, Patativa do Assaré, homem que via o sentido das palavras nas próprias coisas, e nos advertia: “é melhor escrever errado a coisa certa, do que escrever certo a coisa errada”.

1 Espinosa, Tratado Teológico-Político, p. 252.

2 Foucault, As palavras e as Coisas, p. 23.

Fonte: OUTRAS PALAVRAS
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- é o mengão, Mais Velho.




A frase foi dirigida a mim, hoje pela manhã, quando acompanhava uma passeata da torcida do Flamengo pelas ruas do centro da cidade, com destino ao aeroporto, para incentivar os jogadores do time que embarcam para um jogo em São Paulo.

O autor da frase, um adulto jovem com vinte e tantos anos, bermuda e chinelo, morador de comunidade pobre, que percebeu minha curiosidade com esse fato novo que vem tomando as ruas do Rio de Janeiro.

No programa de Regina Casé, certamente o Mais Velho seria motivo de risos e piadas. Já os ataques de raiva, com direito a xingamentos, que grupos e pessoas contrárias as ideologias de esquerda vomitam sobre as pessoas nas ruas, passam a ser considerados normais nesses tempos estranhos que vivemos.

Na disputa pelas narrativas, é certo que o governo do golpe e seus desdobramentos midiáticos utilizam um discurso muito bem articulado para justificar suas investidas contra o povo.

Apesar do discurso bem elaborado do ponto de vista da norma culta, porém falso em essência, a comunicação do golpe é sofrível, já que não consegue sensibilizar corações e mentes da população, exceção para aquela parcela conhecidíssima da classe média inculta e preconceituosa, que não é o mengão, mas também veste uniforme de time de futebol para sair às ruas, em passeata, para pedir o fim da corrupção no país, acreditando no discurso do golpe, que ela, classe média, sequer entende, mas por reflexo condicionado age tão logo chamada.

Isso sim é motivo de piada, risos, porém, no programa de Regina Casé seria impensável ver a apresentadora dos Marinho brincando com uma parcela da população vítima de uma linguagem midiática - que  ela, Regina, reproduz -  que produz acéfalos descontrolados e violentos.

- é o golpe, galera, diria o jovem adulto de forma assertiva, ou reta, como gostam de se expressar.

A língua é viva e expressões são criadas diariamente e incorporadas.

O Mais Velho, por exemplo, é uma expressão, talvez uma gíria, muito usada pelos jovens das comunidades no relacionamento com pessoas mais velhas, não necessariamente idosos ou da terceira idade. Funciona como um reconhecimento , uma compreensão sobre alguém com mais idade, sem nenhum tipo de preconceito.

Também procura estabelecer uma igualdade, apesar da diferença de idade, e um certo respeito naturalmente embutido nas formas de comunicação existentes nas camadas mais populares da população.

Carregada de uma criatividade reta, onde a reverência e a irreverência se misturam, mas que em nenhum momento nega o reconhecimento.

Essas formas de expressão são vistas com preconceito pelas elites e  também por aquela parcela conhecidíssima.

O Mais Velho avisou :

é golpe, galera.

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Lava Jato descarrilou

Convicções - Créditos: Vitor Teixeira
Vitor Teixeira.  Fonte: BRASIL DE FATO


Fonte: A JUSTICEIRA DE ESQUERDA

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Laerte: Alimentando as feras. Fonte: VIOMUNDO

Sejam realistas. Exijam o impossível

Rebeldia para mudar um país


Levante Popular da Juventude entra em seu quinto ano como organização nacional e chama atenção por tamanho e diversidade

Rafaella Dotta
Belo Horizonte, 27 de Setembro de 2016 às 13:38

Movimento levou 7 mil jovens de todos os estados do Brasil a seu 3º Acampamento Nacional, em Belo Horizonte, realizado no início deste mês / Fotos: Divulgação / Levante Popular da Juventude

Entrar no acampamento é como chegar num mundo diferente, construído por jovens. No largo corredor que rodeia o estádio do Mineirinho ocorriam diversas ações. Pessoas estendiam no chão as “bancas” para vender ou trocar livros, toucas, camisetas, discos e até abraços (sério!). E tão sério quanto isso era o poema do Coletivo Literatura Marginales recitado de graça logo em frente. “Trocando a conformação do sistema pelo pensamento revoltante”.

O lugar cheio de interação e cultura sintetiza a política que o movimento Levante Popular da Juventude afirma estar arquitetando. Organização e arte para transformar e construir a vida dos jovens com planos que os mantenham vivos e ativos. O resultado é a aproximação de uma juventude cada vez mais parecida com o povo brasileiro.

Cinco dias

“Levante” levou 7 mil jovens de todos os estados do Brasil a seu 3º Acampamento Nacional, em Belo Horizonte, realizado de 5 a 9 de setembro no estádio do Mineirinho. O evento foi considerado um dos maiores encontros políticos de jovens dos últimos 10 anos do país e foi marcado por debates políticos e inúmeras atividades culturais.

Passaram por lá personalidades como o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva, o ex-pantera negra Eddie Conway, a ativista norte-americana Dominique Stevenson e a atriz Letícia Sabatella. Além de lideranças de movimentos populares e sindicais e do criador do site Wikileaks, Julian Assange, que participou através de videoconferência.

Novos contornos

O crescimento e a diversidade do movimento foram destaque nesse acampamento, diz Thiago Ferreira, um dos coordenadores do Levante. Em 2011, no primeiro encontro nacional, compareceram mil pessoas. Hoje, cinco anos depois, são sete mil. No primeiro acampamento a proporção era de 80% de estudantes universitários para 20% de jovens de periferia. Hoje são 52% de universitários e 48% de jovens de periferia. Admirável também que 58% dos inscritos tenham se declarado LGBT.

“Desde o primeiro acampamento discutimos como vamos ser cada vez mais parecidos com o povo brasileiro. O Brasil é composto em sua maioria por jovens de periferia, por negros, jovens trabalhadoras e trabalhadores”, relata Thiago. Segundo ele, o movimento também não faz uma negação das organizações sociais, mas “aprende com elas”. Essa seria uma das explicações para tamanho crescimento.



Um plano

Com a idade e a quantidade vieram também as responsabilidades, lembra a coordenadora Nátaly Santiago, do Rio Grande do Norte, “e pensamos: ‘temos que dar respostas mais firmes para a juventude brasileira’”. Veio nascendo então o Programa Popular para a Juventude Brasileira, desde janeiro deste ano.

São 10 eixos temáticos, entre eles o combate ao genocídio da juventude negra, a luta contra o racismo, o machismo e a LGBTfobia, o direito à educação, saúde, terra e trabalho. O programa vem sendo construído coletivamente ao longo desse ano. “Na nossa ação prática enfrentamos dilemas que estão presentes na vida juventude e lutamos para resolvê-los. Daí vem o programa”, diz.

A cultura é um dos pontos fortes. “A juventude que se interessa pelo Levante é muito criativa e já faz arte. Tem gente que trabalha como caixa de supermercado, mas quer ser artista, por exemplo. E nosso objetivo é estimular que se organizem para conseguir chegar lá”, explica Nátaly. O plano é que os jovens trabalhem juntos pra produzir sua própria renda e auxiliem um ao outro no seu desenvolvimento profissional, seguindo o lema “Nós por nós”, já adotado pelo movimento.

Um objetivo: melhorar o país

O acampamento aproveitou a potência de indignação dos jovens, que vivem um contexto político digamos… difícil, no mínimo. O “Fora Temer” foi o grito que mais se ouviu, mas pareceu não bastar. “Se conseguirmos tirar o Temer, e depois disso, o que vamos fazer?”, questiona Nataly.

Para responder à demanda, o Levante sai do encontro disposto a participar fortemente dos protestos pela retirada do presidente não eleito Michel Temer e, ao mesmo tempo, defender a realização de uma assembleia Constituinte para fazer uma reforma política no Brasil. Mas, o país precisa de uma Constituição nova?

Nataly defende que a saúde, a educação, o trabalho e os direitos individuais estão ligados umbilicalmente à atuação dos políticos e que, portanto, são necessárias regras políticas mais justas para a eleição de políticos também mais justos. Além disso, o atual Congresso Nacional tenderia a criar e destruir leis que irão “devastar a Constituição Federal”.

Uma estratégia: o povo no poder

A nossa rebeldia é…? “Povo no poder! Povo no poder! Povo no poder!”, respondem milhares de punhos cerrados e certeiros, em um grito que usa a mesma métrica da música Fogo no Pavio, de Gog. Assim se coroava, todos os dias, o lema do acampamento. Assim se lembrava, todas as horas, da estratégia a que se comprometem: resolver o problema em sua raiz.

Há uma lógica de que a radicalidade é a ação violenta, mas não é. A radicalidade é ir à raiz da questão. E hoje nosso principal problema é que a classe trabalhadora está fora do poder político”, afirma Thiago Pará. “Hoje, a atitude mais radical que podemos ter é colocar milhares de pessoas nas ruas para exigir mudanças políticas”.

A juventude que organizou os escrachos contra torturadores da Ditadura Militar, que jogou esterco na sede da Rede Globo em São Paulo, que jogou dólares no ex-deputado Eduardo Cunha, promete agora “não temer o governo Temer”.



Pedras (preciosas) do caminho

Além do esforço do próprio Levante, foram as contribuições de parceiros que ajudaram a garantir a realização do evento. “Tudo apontava para uma inviabilização, com o golpe e dificuldades financeiras”, declara Thiago Ferreira.

Na cozinha, o Movimento dos Trabalhadores por Direitos (MTD) e o Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) faziam as refeições. Dos banheiros, cadeiras, tendas e infraestrutura, o Movimento de Atingidos por Barragens (MAB) cuidava. Na comunicação o jornal Brasil de Fato e o Mídia NINJA integravam o time de cobertura. Fora uma longa lista de colaborações de sindicatos e outros movimentos.

Mas o acampamento não foi só o evento em si, explica Thiago, foi também um processo de oito meses de discussões, mobilização e formação política. “Tudo isso para que a gente chegasse com muito mais certezas do que dúvidas. Nós temos certeza de quem nós somos, temos certeza de que lado estamos e certeza da direção que a gente quer apontar”, completa.

O Mineirinho tremeu

Nas noites do acampamento as festas eram precedidas de “místicas” – momentos culturais de reafirmação de valores importantes ao movimento. Na última noite uma voz ecoava no microfone e com as luzes apagadas os 7 mil jovens mantinham-se sentados no chão do ginásio, com umas lágrimas escondidas tanto pela despedida quanto pela situação política por que passa o país.

“Esse governo vai bater, esse governo vai humilhar, esse governo vai estuprar. E nós lutaremos!”, gritou o rapaz ao microfone, se referindo ao tempo difícil por vir. Para em seguida completar com um sonoro “Pááátria Livre” e ver, mais uma vez, a multidão de jovens tremendo o Mineirinho: “VENCEREMOS!”.

Fonte: BRASIL DE FATO
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Por onde caminhar a energia poderosa, generosa e transformadora do Levante, é para lá que eu vou.
Sejam realistas. Exijam o impossível.