quinta-feira, 19 de novembro de 2015

COP - 21. Humanismo, Espiritualidade e Ecologia - Um Outro Mundo é Possível


   
                                            Appellatio

                       Fraternitatis Rosae Crucis


Primeira edição: setembro de 2015
Todos os direitos reservados

                                MANIFESTO
Caro leitor,

Em 1614, há portanto quatrocentos anos, uma misteriosa Fraternidade se deu a conhecer quase simultaneamente na Alemanha, na França e na Inglaterra através da publicação de um Manifesto intitulado "Fama Fraternitatis Rosae Crucis". Na época, esse texto suscitou muitas reações, sobretudo entre os pensadores, os filósofos e os responsáveis pelas religiões em vigor, particularmente aqueles da igreja católica. De modo geral, aquele Manifesto convocava uma Reforma universal, tanto no âmbito religioso quanto no político, no filosófico, no científico, no econômico etc. Segundo os próprios historiadores, a situação então era muito caótica em vários países da Europa, a ponto de se falar abertamente de "crise europeia". 

Lembremos que o "Fama Fraternitatis" foi seguido de dois outros Manifestos: o "Confessio Fraternitatis" e as "Bodas Alquímicas de Christian Rosenkreutz", publicados respectivamente em 1615 e 1616. Os autores desses três Manifestos invocavam a Fraternidade dos Rosacruzes e pertenciam a um círculo de místicos conhecido pelo nome de "Círculo de Tübingen". Todos eram apaixonados por hermetismo, alquimia e cabala. Alguns anos mais tarde, em 1623, essa Fraternidade se deu a conhecer ainda mais pela publicação, nas ruas de Paris, de um cartaz enigmático: "Nós, Deputados do Colégio principal da Rosacruz, demoramo-nos visível e invisivelmente nesta cidade pela graça do Altíssimo…".

O objetivo deste "Appelatio" não é expor a história dos rosacruzes e nem tampouco os seus ensinamentos. Através dele, nós desejamos antes celebrar o quadringentésimo aniversário da publicação do "Fama Fraternitatis", Manifesto fundador da Ordem Rosacruz no plano histórico.

Se especificamos "histórico" é porque no plano tradicional essa Ordem tem suas origens nas Escolas de Mistérios do antigo Egito, durante a XVIII Dinastia. Michael Maier, célebre rosacruz do século XVII, declarou, além disso, em uma de suas obras: "Nossas origens são egípcias, bramânicas, oriundas dos mistérios de Elêusis e da Samotrácia, dos Magos da Pérsia, dos Pitagóricos e dos Árabes".

Fiéis à nossa Tradição, publicamos em 2001 um Manifesto intitulado "Positio Fraternitatis Rosae Crucis," no qual comunicamos nossa posição quanto ao estado da humanidade, sobretudo através dos âmbitos maiores de sua atividade: a economia, a política, a tecnologia, a ciência, a religião, a moral, a arte etc., sem esquecer sua situação no plano ecológico. Esse Manifesto, que alguns historiadores situam na linha dos três precedentes, foi lido ao redor do mundo por milhões de pessoas e foi tido por muitas delas como um suporte para reflexão e meditação. Em certos países, sua leitura foi aconselhada aos estudantes; em outros, foi posto à disposição do público nas bibliotecas municipais e nacionais; para não falar de todos aqueles e aquelas que o reproduziram pela internet.

Quatro séculos após o "Fama" e treze anos após o "Positio", pareceu-nos necessário ecoar novamente as nossas preocupações quanto à humanidade. De fato, o tempo passa, mas o futuro que se esboça de década em década e ano após ano é muito preocupante. A "crise", como a chamamos comumente, parece ter-se instalado permanentemente em muitos países. Todavia, não somos pessimistas quanto ao futuro, e menos ainda apocalípticos. Nas "Profecias dos Rosacruzes", publicadas em dezembro de 2011, pode-se além disso ler a esse respeito: "Somos otimistas quanto ao futuro… Para além das aparências, o período conturbado que atravessamos constitui uma ‘passagem obrigatória’ que deveria permitir que a humanidade se transcendesse e renascesse para si mesma".

Assim como o "Positio", o "Appellatio" não se dirige a uma elite, qualquer que seja, mas a todos aqueles e aquelas que tomarem conhecimento de sua publicação e dedicarem tempo para lê-lo. Alguns o julgarão talvez um pouco alarmista, outros sobretudo utopista. Certamente, ele não é dogmático e nem ideológico. Através dele, queremos simplesmente exprimir ideias que não são novas e nem tampouco originais em si mesmas, sobretudo para os rosacruzes, mas que, para nós, merecem mais do que nunca uma reflexão. Com efeito, desejamos lançar um apelo à espiritualidade, ao humanismo e à ecologia, condições necessárias, segundo o nosso parecer, para que a humanidade se regenere em todos os planos e encontre a felicidade a que aspira.

O Supremo Conselho da AMORC   

                       CHAMADO À ESPIRITUALIDADE

Em nosso entender, a crise que grassa em muitos países, para não dizer em todos, não é unicamente social, econômica e financeira. Estas são as consequências de uma crise de civilização, no sentido global do termo. Em outras palavras, é a humanidade como tal que está em crise. Mas em crise de quê? Ainda que tenhamos respondido em parte a essa questão no "Positio", parece-nos necessário voltar a esse ponto e especificar o nosso pensamento. Aos olhos de nossa filosofia e de nossos ideais, consideramos que se trata de um dever que implica tanto os rosacruzes quanto os cidadãos do mundo que somos. Nesse particular, e ao contrário daquilo que podem dizer a respeito de nós, a importância que atribuímos à espiritualidade jamais ocultou o interesse que manifestamos pela materialidade, sobretudo porque o objetivo último de nossa busca é desde sempre a conquista do domínio da vida. 

Em primeiro lugar, pensamos que a humanidade está em "crise de espiritualidade". Em nosso entender, esta situação tem duas causas principais: as grandes religiões estabelecidas há vários séculos não respondem mais às questões existenciais formuladas pelos homens e mulheres de nossa época. Suas doutrinas, assim como sua moral, não estão mais adaptadas, o que explica o porquê de serem cada vez mais abandonadas, criando com isso um grande vazio espiritual que muitas pessoas não tentam nem mesmo preencher. Paralelamente, nos países ditos desenvolvidos a sociedade se tornou cada vez mais materialista, no sentido de que incita as pessoas a procurar o bem-estar através das possessões materiais e do consumo desenfreado. Essa tendência aumentou consideravelmente o poder do dinheiro e perverteu o seu uso. De meio, ele passou a ser um fim em si, uma coisa a qual se gosta de possuir como tal, ao passo que, por si mesmo, ele não é nada. 

Isso quer dizer que as religiões atuais não têm futuro? Antes de responder a essa questão, devemos lembrar que nós as respeitamos todas naquilo que elas têm de mais nobre a oferecer aos seus fiéis para que vivam sua fé no cotidiano. Contudo, como havíamos dito anteriormente, as consciências e as mentalidades evoluíram muito desde a aparição delas, de modo que seus credos parecem superados aos olhos de muitíssimas pessoas, sobretudo dos jovens. Não tendo sabido, podido ou querido atualizar seus ensinamentos, acreditamos que elas correm o sério risco de desaparecer a médio prazo. Neste caso, delas não restará nada além dos monumentos que elas originaram no decurso dos séculos, assim como os textos a elas relativos, dentre os quais aqueles que são considerados como sagrados, tais como a Bíblia, o Corão, os Upanishads, o Tripitaka etc.

Para voltarmos à questão do dinheiro, não se trata de cairmos no caricato ou na demagogia. Enquanto moeda de troca, ele é uma necessidade para se viver em sociedade. Todos necessitamos dele para que obtenhamos aquilo que é necessário ao nosso bem-estar material e para satisfazer os prazeres legítimos que a existência pode oferecer. Porém, com o tempo ele adquiriu importância excessiva, a ponto de condicionar e reger praticamente todos os setores da atividade humana. Em nossos dias, ele é objeto de um verdadeiro culto que faz as vezes de religião, sendo provavelmente aquela que tem o maior número de adeptos ao redor do mundo. Infelizmente, sacrificam-se diariamente, nos altares do dinheiro, os valores éticos mais elementares (a honestidade, a integridade, a equidade, a solidariedade etc.), de modo que ele constitui mais do que nunca um vetor de degradação. 

Pelo que acabamos de dizer, não deduza que os rosacruzes são partidários do "voto de pobreza" e que eles acham que a riqueza material é incompatível com a espiritualidade. Desde que o ser humano apareceu sobre a Terra, ele sempre buscou melhorar suas condições de vida e ser feliz. Essa tendência faz parte de sua natureza profunda e se inscreve nesse processo a que chamamos "evolução". Isso não quer dizer que o objetivo da existência seja se tornar rico, mas não é natural, nem tampouco normal, aspirar a ser pobre. Além disso, o fato de estar desprovido material ou financeiramente não faz do indivíduo alguém melhor no plano humano e não é um critério de elevação espiritual, assim como também não o é o fato de ser rico. 

Em nosso entender, a felicidade a que os seres humanos aspiram mais ou menos conscientemente reside num equilíbrio entre o material e o espiritual, e não na exclusão de um em relação ao outro. Eis a razão pela qual todo indivíduo que se consagra unicamente à espiritualidade, a ponto de se privar dos prazeres legítimos da vida, não pode ser feliz. O mesmo pode-se dizer daquele que faz das possessões materiais o único fundamento de seu bem-estar. É isso que explica o porquê de muitas pessoas consideradas abastadas serem infelizes no mais profundo de si mesmas. Se isso ocorre é porque elas sofrem de um vazio interior que nem mesmo "todo o ouro do mundo" poderia preencher. Nesse particular, todos conhecem o adágio que diz que "o dinheiro não traz felicidade", ainda que contribua efetivamente para ela. 

Se admitirmos que o ser humano não se limita a um corpo material mantido em vida por um conjunto de processos físico-químicos, mas que possui também uma alma, compreenderemos facilmente que ela também necessita de certa forma de nutrição: a espiritualidade. Mas o que é a espiritualidade? Conforme o que dissemos antes, a espiritualidade transcende a religiosidade. Em outras palavras, ela não se limita a crer em Deus e a seguir um credo religioso, por mais respeitável que ele seja. Ela consiste antes em buscar o sentido profundo da existência e a despertar gradualmente aquilo que há de melhor em nós mesmos. Ora, essa busca de sentido e de aperfeiçoamento está cruelmente ausente dos nossos dias, de onde o estado caótico do mundo e o marasmo em que ele está mergulhado há várias décadas. 

A maioria das pessoas, de todos os países e nações, tem o sentimento de se encontrar num túnel escuro cujo final ninguém distingue, nem mesmo aqueles e aquelas que dirigem e governam essas nações. Além disso, elas não têm consciência de que a luz que esperam ver despontar só pode vir delas mesmas, e não de uma causa que lhes seja exterior. Isso nos reconduz à espiritualidade e à necessidade de buscar em outra parte, que não a materialidade, as soluções para os problemas que se apresentam à humanidade. Mas talvez você faça parte do grupo dos que não admitem a existência da alma, o que é naturalmente seu direito. Nesse caso, e se você nos permitir, deixe-nos propor-lhe as seguintes perguntas e dê a si mesmo um tempo para respondê-las por si:

• A que você atribui aquilo a que se chama comumente de "voz da consciência"?

• Como você explica a aptidão do ser humano em demonstrar, entre outras virtudes, a benevolência, a generosidade, a compaixão e o amor?

• Você realmente acha que as mais belas obras de arte, sejam na pintura, na escultura, na música ou qualquer outra, se originam unicamente na mente daqueles e daquelas que as criam?

• Como você explica que milhões de homens e mulheres ao redor do mundo tenham experimentado a morte clínica e voltado à vida com a lembrança daquilo que "viram" e "escutaram" naquilo a que se chama correntemente de "além"?

• Você acha mesmo que, se a existência da alma fosse uma quimera, os maiores pensadores e filósofos que a humanidade conheceu a teriam admitido como uma evidência?

Acreditamos que todo ser humano possui uma alma. Do nosso ponto de vista, é ela que faz de cada um de nós um ser vivo e consciente, capaz de pensar e de sentir emoções. É nela também que reside aquilo que há de melhor na natureza humana. Se vivemos na Terra, é precisamente para nos conscientizarmos de suas virtudes e as exprimirmos através de nossos julgamentos e de nossa conduta. Infelizmente, pouquíssimas pessoas, inclusive entre aqueles que creem, se dedicam a isso, o que explica por que a malevolência, a intolerância, o egoísmo, a inveja, o orgulho e o ódio são tão presentes nesse mundo, com tudo aquilo que deles resulta em termos de injustiça, conflitos, desigualdade e sofrimento. Nesse particular, é verdade que o mal só existe na ausência do bem e que ele se origina unicamente no comportamento humano. Ele não é portanto obra de Deus, ou tampouco do diabo, que aliás nunca existiu, assim como também não existem os demônios que pretensamente trabalhariam a serviço dele.

E o que dizer agora sobre Deus? Durante séculos, aqueles que creem viram Nele um Ser antropomórfico localizado nalguma parte dos céus e presidindo o destino de todos os seres humanos. Preocupados em agradá- Lo a fim de obter Seus favores, eles seguiram, e ainda seguem, os preceitos pregados pelas religiões, as quais se apoiam para tanto em seus livros sagrados. No entanto, pelas evidências, crer em Deus e se conformar a um credo que se diz inspirado por Ele não basta para ser feliz. Caso contrário, os bilhões de fiéis que vivem no mundo seriam felizes, excluindo os ateus. Ora, este não é o caso. Isso quer dizer que a felicidade a que todo ser humano aspira se situa além das crenças religiosas. Ela reside de fato na espiritualidade, no sentido que demos anteriormente a esse termo. 

Antes de lhe darmos o nosso conceito de Deus, permita-nos dizer por que acreditamos que Ele existe e por que o ateísmo, ainda que respeitável por si, é um erro de julgamento. Seja você alguém que crê ou não, ninguém pode negar a existência do universo. Ora, do ponto de vista racional, ele é necessariamente o efeito de uma causa criadora. E uma vez que ele é regido por leis que assombram os próprios cientistas, isso quer dizer que essa causa é muito inteligente. Logo, por que não compará-la a Deus e ver Nele a Inteligência absoluta e impessoal que está na origem da Criação? Lembremos, caso seja necessário, que o universo se reduzia originalmente a um centro de energia com a dimensão de um átomo, o qual continha potencialmente o conjunto das galáxias, das estrelas, dos planetas e dos astros que existem atualmente, dentre os quais a própria Terra.

A verdadeira questão que se pode e se deve formular a respeito de Deus não seria portanto saber se Ele existe ou não, mas saber em que medida Ele intervém na vida dos seres humanos. Em nosso entender, Ele o faz na medida do respeito que concedemos às leis através das quais Ele se manifesta no universo, na natureza e no próprio ser humano. Isto pressupõe estudá-las, que é aquilo a que os rosacruzes sempre se consagraram. Você notará que essa abordagem de Deus e do papel que Ele desempenha em nossa existência tem uma conotação antes científica do que religiosa. A AMORC, além disso, jamais se opôs à ciência; exatamente o contrário. É por isso que a Universidade Rose-Croix Internacional, que ela apadrinha desde o começo do século XX, comporta, entre outras, uma seção de ciências físicas. 

Mais do que nunca, é chegado o tempo de se passar das crenças religiosas à espiritualidade, ou seja, de substituir definitivamente a crença exclusiva em Deus pelo conhecimento das leis divinas, no sentido de leis universais, naturais e espirituais. É nesse conhecimento e na sabedoria que dele resulta que se situa o bem-estar que todos procuramos, inclusive o bem-estar material. Um antigo adágio rosacruz enuncia que "é da ignorância, e apenas da ignorância, que o homem deve se libertar". É ela de fato que está na origem daquilo que o ser humano pode fazer de pior contra si mesmo, contra outrem e contra seu meio. É nela também que residem as diversas superstições que degradam a humanidade e a impedem de se desabrochar plenamente. Dê então à sua vida uma orientação espiritualista. Em outras palavras, não seja apenas um ser vivo; seja uma alma vivente…

Talvez você esteja se perguntando o que achamos da laicidade. Enquanto as religiões clássicas ou modernas, ocidentais ou orientais, se fundarem sobre dogmas e se estruturarem de acordo com sistemas autocráticos, acreditamos que a laicidade será uma necessidade absoluta, a fim de preservar a sociedade de todo desvio teocrático. Entretanto, esperamos que chegue o tempo em que a espiritualidade, enquanto busca de conhecimento e de sabedoria, fará parte dos costumes e condicionará a vida cidadã. Logo, a política será una com a filosofia e será portanto inspirada pelo "amor pela sabedoria", como o foi no apogeu da civilização grega. Lembremo-nos que esta civilização foi o berço da democracia e que a ela devemos, entre outras coisas, a noção de república. Lembremo-nos também que a maioria dos filósofos que lhe deram vida era espiritualista.

                        CHAMADO AO HUMANISMO

Se não responder favoravelmente ao nosso chamado à espiritualidade, nós lhe convidamos a dar prova de humanismo no cotidiano. Na "Declaração rosacruz dos deveres do Ser Humano", editada pela AMORC em setembro de 2005, está dito no artigo 10: "Todo indivíduo tem o dever de considerar a humanidade inteira como sua família e de se comportar em toda circunstância e em todo lugar como um cidadão do mundo, fazendo assim do humanismo a base de seu comportamento e de sua filosofia". É evidente que se todos os seres humanos assumissem esse dever uns para com os outros, a palavra "humanidade" se revestiria plenamente de seu sentido, de modo que ela seria na Terra a expressão viva da fraternidade na sua aplicação mais nobre e mais universal. Logo, pode-se pensar que a paz reinaria entre todos os povos e todas as nações. 

Mas o que quer dizer "ser humanista"? Em primeiro lugar, é considerar que todos os seres humanos são irmãos e irmãs de sangue e que as diferenças entre eles limitam-se às aparências. Contudo, não subscrevemos o dogma segundo o qual toda a humanidade teria sido originada de um único e mesmo casal original, no caso Adão e Eva, se fosse levar em conta o Antigo Testamento. Seja do ponto de vista ontológico ou do científico, tal afirmação não tem nenhum fundamento. De fato, tal descendência, sob efeito da consanguinidade, teria rapidamente engendrado degenerescências físicas e mentais. Em nosso entender, os seres humanos emergiram do reino animal, que foi ele próprio palco de uma longuíssima e lentíssima evolução da vida, tal qual ela se manifesta desde seu surgimento na Terra. De qualquer forma, partilhamos todos o mesmo genoma e o sangue que corre em nossas veias é fundamentalmente o mesmo. Mais do que uma fraternidade, nós formamos a humanidade como tal.

Como você sabe, alguns antropólogos citam três raças, ou mesmo quatro: branca, amarela, negra e vermelha. Há alguns anos, essa distinção foi abandonada pela maioria dos cientistas, que prefere substituí-la pela noção global de Raça Humana. Agindo assim, talvez eles esperem desarmar os racistas de qualquer argumento do tipo "fisiológico". Todavia, não é necessariamente ser racista admitir a existência de várias raças, sobretudo quando não se pode negar, por exemplo, que um europeu, um asiático e um africano correspondem a hominídeos que se distinguem bastante claramente no aspecto morfológico. O que é racista é pensar e dizer que haja uma raça superior às outras, notadamente aquela a qual se pertence. Um verdadeiro humanista considera que todos os seres humanos são células de um único e mesmo corpo: o corpo da humanidade.

Muitas pessoas tendem a preferir aqueles que pertencem à mesma "raça", que têm a mesma nacionalidade, que partilham das mesmas ideias políticas ou que seguem a mesma religião, pois isso as conforta e lhes dá segurança. Entretanto, isso não é uma razão para rejeitar os outros ou, pior ainda, para odiá-los. Um humanista digno desse nome respeita todas as diferenças, na condição de que, naturalmente, elas não ameacem nem a dignidade e nem a integridade das partes. Em outras palavras, ele dá prova de tolerância e não se comporta como se fosse ou se sentisse superior. Este é um sinal de inteligência, pois a intolerância, em todas as suas formas, é geralmente o apanágio da estupidez ou (e) do orgulho. Infelizmente, essa fraqueza, ou mais exatamente esse defeito, é um dos mais correntes, de onde os muitos conflitos que opõem os seres humanos entre si. 

A propósito da tolerância, lembremos que a AMORC tem por divisa "a mais ampla tolerância na mais irrestrita independência". É isso o que explica o fato de haver, entre os rosacruzes, cristãos, judeus, muçulmanos etc., assim como também pessoas que não seguem nenhuma religião. Alguns são até mesmo ateus, mas apreciam o caráter fraternal de nossa Ordem. Além disso, ela reúne desde sempre homens e mulheres de todas as categorias sociais e de opiniões políticas diferentes, e até mesmo opostas. Se, para além de suas diferenças, os rosacruzes são capazes de se respeitar mutuamente e de cultivar relações harmoniosas, por que a humanidade também não seria capaz disso?

Você certamente conhece o mandamento de Jesus: "amai-vos uns aos outros!", que ele explicita ao dizer que não se deve fazer aos outros aquilo que não se gostaria que fizessem a si. Seja você ateu ou crente, e nesse último caso crente de qualquer religião, não pode negar que esse mandamento resume em si mesmo o ideal de comportamento que todo indivíduo deveria seguir em suas relações com outrem. E se por um lado é perfeitamente possível não ver em Jesus nem um mestre espiritual, nem um messias e nem o redentor venerado no Cristianismo, por outro deve-se reconhecer que ele foi um humanista excepcional e que revolucionou os modos de sua época pregando a solidariedade e a paz, a ponto de exortar o amor aos inimigos.

A sociedade atual tornou-se excessivamente individualista, de modo que o "cada um por si" tornou-se algo cultural. Sob o efeito combinado do materialismo e da crise econômica e social que o mundo vivencia há muitas décadas, cada vez mais pessoas tendem a se preocupar unicamente com seu próprio bem-estar pessoal e a permanecer indiferentes ao bem-estar de outrem. Tal atitude distancia os cidadãos uns dos outros e contribui para desumanizar a sociedade. A isso acrescenta-se o fato que os meios de comunicação tomaram o lugar das trocas diretas, de modo que já não se dedica verdadeiramente tempo para se conversar com aqueles que são próximos ou com os vizinhos, ao passo que é motivo de orgulho o fato de se ter muitos amigos (virtuais) nesta ou naquela rede social. Que paradoxo! Reaprendamos a dialogar no contato físico com os outros, de coração a coração, para não dizermos de alma para alma…

Pode-se ler no "Positio": "Constatamos que a defasagem não cessa de se ampliar entre os países mais ricos e os países mais pobres. Pode-se observar o mesmo fenômeno em cada país, entre os mais desprovidos e os mais favorecidos". A situação não parou de piorar desde então. Nenhum humanista pode se conformar a esta situação, sobretudo porque a pobreza e a miséria não são uma fatalidade, mas sim o resultado de uma má gestão dos recursos naturais e dos produtos da economia local, regional, nacional e mundial. Em outras palavras, elas se devem essencialmente ao egoísmo dos seres humanos e à sua falta de solidariedade. Todavia, tenham eles consciência disso ou não, sua sobrevida depende mais do que nunca de sua aptidão para partilhar e cooperar, não apenas entre cidadãos de um mesmo país, mas também entre países. Em termos místicos, diremos que, sob efeito da globalização, seus respectivos carmas estão ligados de tal maneira que nenhuma nação poderá prosperar doravante a longo prazo se não se preocupar com aquelas que ainda estão em estado de necessidade. 

Como acabamos de nos referir à globalização, acreditamos que ela é irreversível e que é portanto inútil opor-se a ela. Desde que o ser humano surgiu sobre a Terra, ele jamais deixou de ampliar seu campo de ação e de relações, estendendo-se inicialmente de um clã a outro, depois de uma aldeia a outra, de uma cidade a outra, de um país a outro e, finalmente, de um continente a outro. Com o desenvolvimento dos meios de transporte e de comunicação, o mundo se tornou um único país. Isto é uma evolução natural com a qual deveríamos nos alegrar, pois ela é um vetor de compreensão mútua e de paz entre os povos. No entanto, esse processo ainda está em seus primórdios e esbarra na diversidade das culturas, das mentalidades e dos sistemas econômicos e políticos, de modo que ainda está a exacerbar as desigualdades. Eis a razão pela qual pensamos que é preciso acelerá-lo e dar-lhe uma orientação humanista a fim de que ele beneficie o bem-estar de todos. 

Chegamos agora a outro ponto diferente: o individualismo não é o único obstáculo ao humanismo, tal como os rosacruzes o concebem e o esperam; há também a importância da qual se revestiram as máquinas desde a mecanização e a robotização da indústria. Ao passo que elas deveriam ter-se limitado a ajudar o homem em suas tarefas mais penosas e difíceis, elas acabaram por substituí-lo por razões de rentabilidade e de lucro. Essa mecanização excessiva da sociedade contribuiu não apenas para desumanizá-la como também para piorar essa enfermidade social que é o desemprego. É urgente, pois, recolocar o humano no lugar da máquina em todos os setores em que isso for possível e romper com esse dogma materialista que consiste em pensar e dizer que "tempo é dinheiro". 

Os seres humanos, porém, não são unicamente irmãos e irmãs de sangue, com todas as "raças" misturadas. São também almas-irmãs emanadas de uma mesma fonte espiritual, a saber, a Alma Universal. O que difere intrinsecamente entre eles é o seu nível de evolução interior, ou seja, o grau que eles atingiram na tomada de consciência de sua natureza divina. Acrescentamos que nós subscrevemos a ideia segundo a qual todo indivíduo se reencarna quantas vezes forem necessárias para realizar essa tomada de consciência e para atingir o estado de Sabedoria tal como podemos manifestá-lo na Terra. Se você admitir esse princípio, ou melhor, essa lei, compreenderá que as diferenças existentes entre os indivíduos quanto a sua maturidade, sua profundeza de espírito, seu sentido de responsabilidades e seu humanismo são devidas essencialmente ao fato que alguns viveram mais encarnações do que outros. Visto desse ângulo, nenhum ser humano é superior a outro; alguns são simplesmente mais evoluídos espiritualmente. 

Se não crer em Deus, um humanista deve ao menos ter fé no homem e em sua capacidade de se transcender para exprimir o melhor de si mesmo. Certamente, ao examinarmos a história da humanidade e sua situação atual, podemos ter o sentimento de que os seres humanos são profundamente individualistas e que se dedicam a se prejudicar mutuamente sob efeito de suas falibilidades e de seus defeitos. Entretanto, para além das aparências, eles evoluíram muito em consciência. Cada vez mais pessoas ao redor do mundo se insurgem contra as injustiças e as desigualdades, se manifestam contra as guerras e a favor da paz, denunciam as ditaduras e outros regimes totalitários, exortam a uma maior fraternidade, vêm em auxílio dos mais desfavorecidos, se engajam na preservação da natureza etc. Se isso ocorre é porque todo ser humano, sob impulso de sua alma, aspira, como disse Platão, àquilo que é bom, ao bem e à verdade. É preciso simplesmente que ele tome consciência disso e que aja em consequência. 

No decurso da história, os seres humanos mostraram que são capazes de realizar coisas extraordinárias quando convocam aquilo que há de mais nobre e de mais engenhoso na natureza humana. Seja no âmbito da arquitetura, da tecnologia, da literatura, das ciências e das artes, ou ainda no das relações entre os cidadãos de um mesmo país ou de países diferentes, eles souberam dar prova de inteligência, de criatividade, de sensibilidade, de solidariedade e de fraternidade. Essa constatação por si mesma é reconfortante, pois confirma que o ser humano é inclinado a fazer o bem e a trabalhar para a felicidade de todos. É precisamente por essa razão que é preciso ser humanista e ter fé nele.

                            CHAMADO À ECOLOGIA

Em nosso entender, não é possível ser um humanista se não se for um ecologista. De fato, como é possível querer a felicidade de todos os seres humanos sem se preocupar com a preservação do planeta em que vivem? Ora, todos sabem que ele está em perigo e que a humanidade é imensamente responsável por isso: poluição de diversos tipos, destruição dos ecossistemas, desflorestamento excessivo, massacre de espécies animais etc. Quanto ao aquecimento climático, a grande maioria dos cientistas está de acordo em dizer que a atividade humana, se não o provocou, ao menos o acelerou intensamente, sobretudo por causa dos gases de efeito estufa. Além disso, muitos deles estabelecem uma ligação entre esse aquecimento e o aumento do número de tempestades e de cataclismos de todos os tipos, com tudo aquilo que resulta disso em termos de perdas humanas e de destruição material. De qualquer forma, é evidente que se nada for feito a curto prazo em escala mundial para se pôr fim aos males que infligimos ao nosso planeta, ele se tornará inviável para bilhões de pessoas, e talvez mesmo para toda a humanidade. 

Nas civilizações antigas, a Terra era considerada a Mãe de todos os seres vivos e era objeto de um culto, o da Mãe-Terra. Em nossos dias, há pouquíssimos povos ancestrais, tais como os aborígenes da Austrália, os indígenas da Amazônia e os pigmeus da África, para citarmos apenas os mais conhecidos, que conservaram esse estado de espírito. Os outros seres humanos de hoje, por sua vez, passaram a considerá-la antes de tudo como uma fonte de lucros diversos, a ponto de explorá-la para além dos limites do razoável e em detrimento de sua saúde. Se falamos em "saúde" relacionada ao nosso planeta, isto se deve ao fato que para nós é evidente que ele é um ser vivo e mesmo consciente. Para se convencer disso basta refletir sobre as forças de vida que ele exibe na natureza e sobre a inteligência que ele exprime através de seus diferentes reinos, para não falarmos de tudo aquilo que compõe a sua beleza. Isso é tão verdade que até mesmo um ateu tende a divinizá-la e a considerá-la uma obra mestra da Criação. 

De acordo com os cientistas, a Terra surgiu há cerca de quatro bilhões e meio de anos, a vida há cerca de quatro bilhões de anos e o homem há cerca de três milhões de anos. Porém, em menos de um século, nós a afetamos de tal forma que seu futuro, e o nosso, estão ameaçados a tal ponto que seu estado é agora objeto de reuniões de cúpula internacionais. Infelizmente, essas reuniões permanecem na teoria e se traduzem por decisões consensuais que estão longe de serem suficientes para reverter a situação. Preocupada em contribuir com o despertar das consciências em matéria de ecologia, a AMORC publicou em 2012 uma "Exortação para uma Ecologia Espiritual", que foi lida no Senado do Brasil por ocasião da "Cúpula da Terra" realizada no Rio de Janeiro. Outros colóquios desse gênero ocorreram em diversos países, porém as decisões anunciadas permanecem sendo ridículas face à situação e ainda acabam por sempre esbarrar nos interesses socioeconômicos de uns e outros. 

Os países desenvolvidos, dentre os quais os mais ricos do mundo, chegaram a esse estado porque em sua maioria privilegiaram a economia em detrimento da ecologia. É evidente que se as nações em vias de desenvolvimento seguirem o mesmo modelo econômico, fundado sobre a superprodução e o superconsumo, os problemas ambientais que enfrentamos vão crescer e se agravar em grandes proporções. Em nossos dias, esta é lamentavelmente a via que seguem essas nações emergentes, e não poderíamos condená-las, haja vista o exemplo que lhes foi dado. No estado atual das coisas, resta-nos esperar que elas rompam, apesar de tudo, com esse modelo e o substituam por um sistema que associe economia e ecologia. Esta seria uma lição bela e útil a toda a humanidade.

Os rosacruzes não são inocentes sonhadores preocupados unicamente com o aspecto espiritual da existência. Certamente, somos místicos, no sentido etimológico do termo, ou seja, no sentido de homens e mulheres que se interessam pelo estudo dos mistérios da vida, mas sabemos que é aqui nesse plano que é preciso instaurar o paraíso que as religiões situam no além. Para tanto, os seres humanos devem aprender a gerir com sabedoria os recursos naturais e os produtos criados por eles, de onde a necessidade de agir de modo que a economia, em todos os níveis e aspectos, beneficie com equidade todos os povos e todos os seus cidadãos, com respeito à dignidade humana e à natureza.

O que poderia levar os seres humanos a desenvolver uma economia ecológica? O medo de serem vítimas do aquecimento climático e das catástrofes naturais que são atribuídas a eles? Aparentemente não, pois o comum dos mortais tende a pensar que isso só acontece com os outros. Enquanto não são atingidos pessoalmente e não sofrem com isso, se limitam geralmente a se compadecer das vítimas dessas calamidades, participam eventualmente desta ou daquela operação caritativa em favor dos afligidos e retomam o curso de sua vida esperando serem poupados desse tipo de catástrofe. Será necessário que muito mais pessoas sejam afetadas ainda, inclusive e talvez sobretudo nos países desenvolvidos e ricos, para que a humanidade se renda por fim às evidências? É fato que nossa Mãe, a Terra, está muito doente e arrisca se tornar inviável para um número muito grande de seres humanos. 

Independentemente do número crescente de pessoas afligidas pelas catástrofes naturais que se multiplicam em todas as partes do mundo, é preciso observar também que, de acordo com alguns cientistas, a expectativa de vida, que não havia cessado de aumentar no decurso das últimas décadas na maior parte dos países, começa a diminuir. Paralelamente, o número de cânceres está em altíssimo crescimento. Por quê? Em grande parte porque o ar que respiramos, a água que bebemos e a comida que consumimos estão gravemente poluídos (nitratos, fosfatos, pesticidas, colorantes, conservantes), o que acarreta inevitavelmente desordens orgânicas, celulares e mesmo genéticas. Se a isto acrescentarmos que o consumo de álcool, de tabaco e de outras drogas também cresce exponencialmente, não é espantoso constatar que a saúde do ser humano também esteja ameaçada a curto prazo.

Outro perigo, e não dos menores, ameaça a saúde de um grande número de indivíduos: a abundância de ondas eletromagnéticas emitidas pelos computadores, telefones celulares e outros aparelhos eletrônicos. Ainda somos imprudentes quanto a essa poluição eletromagnética, mas não resta nenhuma dúvida quanto ao fato que ela origina várias doenças. Não se trata de colocar em xeque a utilidade desses aparelhos, mas tudo deve ser feito para que sua utilização não seja um vetor de diversas patologias, o que implica a responsabilidade daqueles que os fabricam e os vendem. Além disso, muitos utilizadores carecem de informação quanto ao uso que fazem dessas facilidades, no sentido de que abusam delas em detrimento de seu bem-estar. À guisa de exemplo, constatou-se que o número de tumores no cérebro aumentou consideravelmente desde a aparição do telefone celular, notadamente entre os jovens. 

Porém, existe uma poluição mais metafísica a afetar a humanidade: os pensamentos negativos que os seres humanos geram sob efeito do ódio, da crueldade, do rancor, da intolerância, da cólera, da inveja etc. Em primeiro lugar, tais pensamentos agem negativamente sobre as pessoas que os mantêm ou que os emitem, ainda que elas não tenham consciência disso objetivamente. Com o tempo, eles acabam por lhes causar problemas físicos ou psicológicos que podem provocar graves doenças. Em segundo lugar, eles infestam o inconsciente coletivo e o impregnam de vibrações negativas que, por sua vez, alimentam situações de ódio, crueldade, rancor etc. Inversamente, todo pensamento positivo beneficia não apenas a pessoa que o originou como também a consciência coletiva da humanidade. Sabendo disso, os rosacruzes se dedicam arduamente há séculos àquilo que eles designam pelo nome de "alquimia espiritual". 

Quem fala em doença, fala em medicina! Se é preciso por um lado reconhecer que esta última, a exemplo da cirurgia, fez grandes progressos e muito contribuiu para a melhoria da saúde, por outro ela não está isenta de falibilidades e mesmo de descaminhos. Como a maioria dos âmbitos de atividade humana, ela sofre a influência do dinheiro, a ponto de ficarmos tentados a dizer que a doença é o "fundo de comércio" dos grandes laboratórios farmacêuticos. Em nossos dias, demonstrou-se que um grande número de medicamentos são placebos e não têm outros efeitos senão aqueles que se lhes atribuem. Dentre aqueles cujas virtudes terapêuticas são verdadeiras, alguns trazem efeitos colaterais desastrosos. A mesma constatação se impõe a respeito de muitas vacinas, das quais sabemos que algumas estão sendo investigadas devido à suspeita de terem contribuído para a destruição das defesas imunológicas naturais do ser humano. Mais uma vez insistimos no fato que não rejeitamos a medicina e nem a cirurgia, mas dizer que tanto uma como a outra teriam por único objetivo cuidar e tratar seria pura hipocrisia. 

Seja no domínio médico ou em outro, os seres humanos devem se manter o mais próximo possível da natureza. Ao se desgarrarem dela, rompem com as leis naturais e vão contra o seu próprio bem-estar. Contudo, por ignorância, orgulho e ganância, eles se empenham há muito tempo em querer dominá-la, ao passo que deveriam cooperar com ela. Cegados por sua vaidade, eles se esqueceram de que a inteligência de que ela dá provas é infinitamente maior do que a da humanidade e que seu poder não tem praticamente nenhum limite a não ser aqueles que ela própria impõe a si. Com certeza os Homo Sapiens Sapiens, nome que os cientistas deram à nossa espécie e que significa literalmente "homem que sabe que sabe", ainda estão muito longe de saber o essencial: eles devem tudo à natureza e nada são sem ela. 

Para nós, a Terra não é unicamente o planeta em que vivem os seres humanos. Ela serve também como palco de sua evolução espiritual e permite que cada um deles atinja a plenitude enquanto alma vivente. Ela tem portanto uma vocação ao mesmo tempo terrestre e celeste, o que os mais sábios dentre os pensadores e filósofos, de todos os tempos e de todos os lugares, ensinaram. Enquanto a humanidade não tomar consciência dessa verdade e não agir em conformidade com ela, o materialismo e o individualismo que prevalecem atualmente se amplificarão com todas as consequências negativas que deles derivam em termos de consequências contra ela própria e contra a natureza. Mais do que nunca é urgente restaurar o Ternário que encontramos na base de todas as tradições esotéricas e que a própria civilização deveria adotar: Humanidade – Natureza – Divino. Enquanto ela não o fizer, se manterá no estado de sofrimento atual e não poderá alcançar o estado de harmonia a que foi prometida. 

Como todos sabem, a Terra também é um meio no qual vive uma miríade de animais, alguns em estado selvagem e outros em estado doméstico. Ora, eles também possuem alma – individual, no caso dos mais evoluídos; coletiva, no caso dos que são menos evoluídos. De fato, todos os seres vivos têm em comum o fato de serem animados pela Alma Universal e a Consciência que lhes é própria. Todavia, cada um deles, conforme o lugar que ocupa na corrente da vida e o organismo de que dispõe, manifesta essa Alma e essa Consciência num grau mais ou menos elevado. Esta é razão pela qual eles não têm o mesmo nível de inteligência e de sensibilidade. De qualquer forma, não existe nem vazio e nem fronteira entre os reinos da natureza, pois eles são animados pela mesma Força Vital e participam de um mesmo processo, o da Evolução Cósmica, tal como ela se manifesta em nosso planeta. Certamente, o reino humano é o mais avançado nesse processo. Porém, isso não lhe dá nenhum direito sobre os outros reinos. Ao contrário, lhe dá deveres…

                           EM CONCLUSÃO

Eis portanto as ideias que gostaríamos de partilhar consigo através desse "Appellatio". De fato, acreditamos que haja urgência em dar uma orientação espiritualista, humanista e ecológica aos nossos comportamentos individuais e coletivos. Não obstante, se houvesse uma prioridade a dar, esta seria a ecologia. Com efeito, se a humanidade chegasse a resolver permanentemente os problemas econômicos e sociais que se lhe apresentam ao mesmo tempo em que a Terra se torna inviável ou dificilmente habitável para a grande maioria de seus habitantes, que interesse e que prazer haveriam em se viver? A esse respeito, aqueles e aquelas que governam os países e as nações têm uma grande responsabilidade, no sentido de que têm o poder de tomar decisões e de agir de modo a aplicá-las. Entretanto, se os povos se desinteressam pela ecologia e nada fazem em seu próprio nível para preservar a natureza, é evidente que a situação não cessará de piorar e que as futuras gerações herdarão um planeta que não será mais do que a sombra daquilo que ele foi.

Em segundo lugar, e com o risco de lhe surpreender, é o humanismo, e não a espiritualidade, que deve ser privilegiado. Colocar o ser humano no coração da vida social, respeitando a natureza, só pode ser um vetor de bem-estar e de felicidade para todos, sem distinção. Isto pressupõe ver em cada pessoa uma extensão de si mesmo, além das diferenças e mesmo das divergências. Isso é uma tarefa difícil, pois cada qual tem um ego que tende a torná-lo individualista que o compromete a se preocupar antes de tudo consigo mesmo, com seus próximos e com as pessoas com as quais tem as mais diversas afinidades. Levada ao extremo, é essa atitude narcisista, e mesmo egoísta, que origina as discriminações, segregações, divisões, oposições, exclusões e outras formas de rejeição entre indivíduos. Opostamente, o humanismo é sinônimo de tolerância, de partilha, de  generosidade, de empatia e, numa única palavra, de fraternidade. Ele é fundado sobre a ideia de que todos os seres humanos são cidadãos do mundo.

A necessidade de ser ecologista é relativamente evidente quando se considera o estado do planeta. Da mesma forma, todo indivíduo suficientemente sensível e inteligente compreende por que é bom ser humanista, mesmo que ele próprio não o seja. Em contrapartida, não existe a priori nenhuma razão objetiva para que se seja espiritualista, sobretudo porque é impossível provar a existência da alma e de Deus, mesmo no sentido que os rosacruzes Lhe atribuem. Assim, mesmo que a espiritualidade nos pareça essencial para sermos felizes e darmos à vida toda a sua dimensão, compreendemos que se possa ser ateu. Porém, para nós é evidente que o universo, a Terra e a humanidade nada devem ao acaso e se inscrevem num Plano transcendental, para não dizer divino. É precisamente por essa razão que temos a faculdade de estudar a Criação e de nos interrogar sobre o sentido profundo da existência. Nesse particular, somos ao mesmo tempo atores e espectadores da Evolução Cósmica tal como ela se exprime no cosmos e em nosso planeta.

Talvez você seja ecologista e humanista, mas não espiritualista? A menos que seja profundamente materialista, isso quer dizer que, se não crê em Deus, ao menos tem fé na natureza e no homem, o que é ao mesmo tempo respeitável e louvável. Nesse particular, fazemos uma distinção entre um materialista e um ateu. Regra geral, o primeiro faz das possessões materiais o ideal de sua vida, geralmente em detrimento da natureza e sem se preocupar com os outros. O segundo, por sua vez, é na maioria das vezes um crente que se ignora ou que perdeu a fé, no sentido religioso do termo. De qualquer forma, pensamos que a espiritualidade (e não a religiosidade) é por si mesma um vetor de humanismo e de ecologia, pois, como explicamos anteriormente, ela se funda sobre o conhecimento das leis divinas, no sentido de leis naturais, universais e espirituais. Ora, quem quer que busque esse conhecimento, mesmo que não o tenha ainda adquirido, é por natureza idealista.

Segundo os antropólogos, a humanidade "moderna" surgiu há cerca de duzentos mil anos. Na escala de uma vida humana, ela pode parecer velha. Contudo, tendo em vista seus ciclos de evolução, ela está em sua adolescência e mostra todas as características dessa fase: está em busca de identidade, procura um destino, dá provas de imprudência e até mesmo de inconsciência, se acha imortal, abandona-se aos excessos, desafia a razão e ridiculariza o bom senso. Essa etapa evolutiva, com seu quinhão de dificuldades, provações e fracassos – mas também de satisfações, conquistas e esperanças –, é uma passagem obrigatória que deve permitir que ela cresça, amadureça, se desabroche e, finalmente, se realize plenamente, ou seja, que atinja a plenitude nos planos material e espiritual. Para isso, entretanto, ela deve se tornar adulta.

Em conclusão, e levando em consideração tudo o que foi dito, desejamos mais do que nunca que a humanidade adote uma orientação espiritualista, humanista e ecologista a fim de que renasça para si mesma e dê lugar a uma "nova humanidade" regenerada em todos os planos. Os rosacruzes do século XVII já faziam apelo a essa regeneração no "Fama Fraternitatis". Rejeitado pelos conservadorismos religiosos, políticos e econômicos da época, aquele apelo precursor foi ouvido apenas pelos pensadores livres. Tendo em vista a situação atual do mundo, pareceu-nos útil e necessário renová-lo abertamente, esperando que ele encontre dessa vez um eco favorável junto à maioria…

Que assim seja!

Selado em 6 de janeiro de 2014
Ano Rosacruz 3367

Fonte: AMORC - ORDEM ROSACRUZ

Descaso com a vida

“A Lei de Crimes Ambientais é apenas para prender velhinhas com papagaio?! 

Presidentes da Samarco, Vale e BHP não podem ficar impunes!”

publicado em 19 de novembro de 2015 às 14:16
Samarco, Vale e BHP
Da esquerda para a direita, os presidentes: Ricardo Vescovi, da Samarco, Murilo Ferreira, da Vale, e 
Jac Nasser, da BHP Billiton
por Conceição Lemes
Por mais que Samarco e suas controladoras, a Vale e BHP Billiton, contem com a complacência criminosa da nossa grande imprensa, elas carregarão para sempre a responsabilidade pela maior tragédia socioambiental do Brasil: o rompimento das duas barragens em Mariana (MG), em 5 de novembro de 2015.
Onde antes havia vida, a partir de 5 de novembro só há destruição. A associação do subdistrito de Bento Rodrigues, em Mariana, cujas mulheres faziam a fantástica geleia de pimenta biquinho, não existe mais (no final, vídeo mostra como era antes da tragédia). Assim como desapareceram os animais e a vegetação daquela outrora pacata cidade mineira.
Por onde a avalanche  de lama tóxica da Samarco/Vale/BHP passou, espalhou morte, devastação, caos e dor. As perdas humanas, culturais, sociais e ambientais são incalculáveis.
Vai ser possível a recuperação total? Claro que não. As vidas humanas e animais não têm volta. E a reparação completa do meio ambiente? Tudo indica que também não. Será um trabalho para muitos anos, talvez décadas, sem conseguir chegar à perfeição do equilíbrio entre os ecossistemas existente até o fatídico 5 de novembro.
Indignadíssimo, o biólogo Rogério Bertani me enviou o seguinte e-mail:
Trabalho com animais, entre as minhas tarefas está a produção de conhecimento para utilização na conservação da natureza. É duro assistir o que está acontecendo em Mariana. Enquanto isso, sabemos que crimes menores são prontamente combatidos, às vezes de forma dura. Imagine agentes do Ibama indo pra cima de velhinhas que têm um papagaio em casa às vezes por 30, 40 anos. Eles vão lá, tomam os bichos, aplicam multas, podem até processar, prender. Por outro lado, os presidentes da Samarco, Vale e BHP vão ficar impunes? Para que serve a Lei de Crimes Ambientais? É só para prender velhinhas?!
Bertani é também doutor em Zoologia e pesquisador científico. É um profissional seriíssimo, de primeira linha.  Tem outra característica: baseado em evidências, fala o que pensa, mesmo que desagrade a chefia.
Resolvi aprofundar o conteúdo da sua mensagem de Rogério, entrevistando-o.

Viomundo – A mídia tem se referido ao rompimento das barragens em Mariana como acidente. Concorda?
Rogério Bertani – Não é o caso das duas barragens que se romperam. Era tragédia anunciada. Pelo que já foi apurado não havia um plano de gestão de riscos nem um plano de contingência para retirada da população. É, como bem observou o geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos, ex- diretor do IPT [Instituto de Pesquisas Tecnológicas], em artigo publicado no Viomundo, um caso típico de irresponsabilidade na gestão de riscos.
De forma que me recuso a chamar de acidente o que aconteceu em Mariana.

Viomundo – Logo no início, a Samarco, com a cumplicidade de alguns setores da Academia, tentou vender que a causa do rompimento teriam sido abalos sísmicos. O que acha?
Rogério Bertani – Imagino que represas de forma geral têm de ser construídas para resistir a abalos sísmicos. Quantas represas existem no Brasil? Centenas. Se qualquer abalo sísmico rompesse uma barragem, não teríamos mais nenhuma. E a atividade sísmica no Brasil é muito pequena comparada com outros países, que mesmo assim possuem muitas barragens e represas e elas não vivem se rompendo.

Viomundo – O senhor classifica o que aconteceu como crime ambiental ou crime contra a humanidade?
Rogério Bertani – Veja bem. A região em que ocorreu o vazamento é de grande importância biológica. Ali, existem diversas áreas de endemismo, ou seja, flora e fauna, que só existem naquele local.
O próprio rio Doce é considerado uma barreira biogeográfica. A fauna e flora ao norte dele são distintas daquela existente ao sul. Pelas características do evento, todo o ecossistema será afetado, e durante muito tempo.
Apesar de o principal impacto ter ocorrido na fauna e flora aquáticas, a parte terrestre também será afetada, pois a natureza é toda conectada. Animais que vivem na terra dependem também dos que vivem no ambiente aquático, e vice-versa.
Embora os crimes ambientais não sejam tecnicamente considerados como crimes contra a humanidade, na essência o são, pois todos serão atingidos, de uma forma ou de outra, pelas consequências desse desastre.

Viomundo —  Quem no seu entender tem de ser punido?
Rogério Bertani — Cabe à polícia e ao Ministério Público avaliar. Porém, espero que desta vez a punição não fique limitada a técnicos e burocratas de quinto escalão. É preciso responsabilizar os dirigentes dessas empresas, ou nada mudará.

Viomundo – Pela lei brasileira quais são as penas para quem provoca dano como o de Mariana?
Rogério Bertani — A Lei de Crimes Ambientais, lei nº 9.605, de 12.02.1998, diz que os crimes ambientais poderão ser punidos por ação administrativa, civil e penal. Na área criminal, a legislação diz o seguinte:
Da Poluição e outros Crimes Ambientais
Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
* 1º Se o crime é culposo:
Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa.
* 2º Se o crime:
I – tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;
II – causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;
III – causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;
IV – dificultar ou impedir o uso público das praias;
V – ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos:
Pena – reclusão, de um a cinco anos.
* 3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível

Viomundo – Considerando o número de vítimas humanas, espécimes animais e plantas atingidos, essas penas teriam de ser multiplicadas n vezes?
Rogério Bertani – Com certeza. Além de considerar o número de atingidos, tem de se considerar o tempo que os danos perdurarão. Como a recuperação em alguns casos vão demorar anos, em outros, talvez décadas, é um agravante importante para se definir as penas.

Viomundo – Quando a lei de Crimes Ambientais foi promulgada em 1998, lembro que ela foi muito comemorada pelos ambientalistas.
Rogério Bertani – Realmente, por ser um instrumento que unificava a legislação ambiental dispersa e poderia impedir ou pelo menos diminuir a destruição ambiental, como o tráfico de animais e plantas, desmatamento e poluição, por exemplo. Todas essas ações destrutivas estão intimamente ligadas à qualidade de vida e saúde da população.

Viomundo — Na prática, a minha impressão é que os agentes do Ibama são severos com os pequenos e deixam rolar com os grandes. É isso mesmo?  Por quê?
Rogério Bertani – Veja bem, de novo. Na seção de crimes contra a fauna, a lei considera crime  “Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida“.
Ou seja, qualquer interação com um animal silvestre é qualquer contato, mesmo. Se o agente achar que você está perseguindo, pode multar. Se manusear um animal, qualquer um, dependendo da interpretação do agente, pode ser considerado crime. E isso é para evitar abusos, que realmente ocorrem. E eu concordo integralmente.
Porém, fica aberto às autoridades a interpretação se essas interações devem ser penalizadas. E, aí, também ocorrem abusos.
Tenho visto problemas sérios ocorrerem com pesquisadores, que têm como ofício o trabalho com animais, e com a população em geral.

Viomundo – Que tipo de problemas?
Rogério Bertani – A história de velhinha com papagaio é emblemática. Uma discussão recorrente.
Uma pessoa que tem o seu papagaio há 40 anos, portanto anterior à lei, deve ter seu animal de estimação apreendido e enviado a um local sem condições de recebê-lo? Ou soltá-lo, sem que tenha aprendido a sobreviver na natureza? Ou deve permanecer com o dono, com quem já está habituado?
Tenho um amigo estudante de biologia, que é um grande inimigo do tráfico e profundo conhecedor da fauna e flora. Ele mora num sítio e alguns animais aparecem lá. Acredite. Ele foi multado por colocar na internet fotos em que ele manuseia esses animais. Só que esses animais não estavam em cativeiro, eles simplesmente aparecem lá.
Por outro lado, temos circunstâncias nas quais os danos contra o meio ambiente são muito mais sérios, sem que tenhamos visto punições proporcionais. No caso específico de Mariana, não é um espécime animal ou vegetal que sofreu maltrato ou foi morto, mas todo um ecossistema que foi atingido.
Se uma pessoa matar ou apanhar um animal de espécie que esteja incluída na lista de animais ou plantas ameaçados de extinção as penas são aumentadas. O que dizer então de um evento da magnitude de Mariana, que não deve ter apenas matado animais de espécies ameaçadas de extinção, mas também, como estão afirmando vários especialistas, levado à extinção espécies inteiras?
Nunca vi nada parecido no Brasil. Ou seja, a extinção de espécies e a destruição de um ecossistema por um único evento causado subitamente por ação humana. É como a região ser atingida por um meteorito, ou a explosão de um vulcão. Algo que somente a própria natureza teria poder para fazer.

Viomundo – O senhor acha que os presidentes  da Samarco, Vale e BHP Billiton deveriam ir para a cadeia?
Rogério Bertani — Não  lembro de ler ou ouvir que executivos de alguma grande empresa tenham sido punidos criminalmente no Brasil pela prática de crime ambiental. Assistimos à prisão de madeireiros e garimpeiros, que provocam grandes danos ao meio ambiente. Porém, não vemos nenhum grande empresário sendo algemado pela Polícia Federal.
Se prender um madeireiro é possível, por que não a prisão de grandes empresários  num caso muito muito grave,  inclusive com a perda de vidas humanas? Os presidentes da Samarco, Vale e BHP não podem ficar impunes!

Viomundo – O que a sociedade brasileira tem que exigir nesse caso?
Rogério Bertani — A sociedade brasileira não pode mais se calar diante da arrogância e poder de grandes empresas e da timidez do poder público em enfrentá-las. A Lei de Crimes Ambientais está aí para garantir um meio ambiente ecologicamente equilibrado, como consta na Constituição Federal.
Não pode ser aplicada contra velhinhas que têm papagaios em casa e deixar de processar criminalmente empresários poderosos que destroem todo um ecossistema.

Fonte: VIOMUNDO
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Rompimentos de barragens de mineradoras têm se tornado mais graves nas últimas décadas, dizem especialistas


Avanço tecnológico da mineração não tem conseguido reduzir intensidade de eventos como o ocorrido em Mariana (MG); evitar próximo desastre só será possível com melhor regulamentação ambiental da atividade
19/11/2015
Por Rachel Costa,

Foto: Reprodução
Itália, 1985, África do Sul, 1994, e Hungria, 2010. Estas foram as rupturas de barragem de mineradoras mais mortíferas nos últimos 30 anos em países ocidentais. A primeira deixou 268 mortos, a segunda, 17, e a última, 10 vítimas fatais. Em Minas Gerais, o rompimento da barragem de Fundão no último dia 5 em Mariana já fez 11 mortos (quatro deles ainda sem identificação) e outras 12 pessoas seguem desaparecidas. Calcula-se em 62 milhões de metros cúbicos o volume de rejeitos lançados no meio ambiente. Grande parte dele atingindo o Rio Doce, um dos maiores do estado. A chegada ao rio tem causado uma segunda tragédia, com cidades sem água e moradores sem saber o que lhes espera. Governador Valadares, um dos principais municípios abastecido pelo rio, com 278 mil habitantes, decretou estado de calamidade pública desde o dia 10.
Falta água e faltam informações, o que torna difícil calcular a dimensão exata do desastre. A Vale e a BHP, as duas empresas multinacionais por trás da Samarco, companhia responsável pelos reservatórios, terão de desembolsar pelo menos 1 bilhão de reais neste que é um dos maiores desastres ambientais no Brasil e um dos maiores episódios de rompimento de barragem de rejeitos nos últimos 30 anos.
E o grande problema é que o avanço tecnológico da mineração não tem conseguido reduzir a intensidade de eventos desse tipo. Muito pelo contrário, afirma o geofísico David Chambers, doCenter For Science In Public Participation (CSP2) [Centro para a Ciência em Participação Popular, em tradução livre], nos Estados Unidos. Chambers mantém desde 2009 uma base de dados com o registro de problemas em barragens de rejeitos em todo o mundo, cobrindo todo o último século. O que se pode aferir pelos números é que, se a quantidade de eventos diminuiu com o avançar da tecnologia, em contrapartida eles se tornaram muito mais graves e a previsão do cientista é que eles sigam ocorrendo em uma média de um grande desastre a cada ano.

Problema internacional
Na lista mantida por Chambers, o último evento classificado como grave também aconteceu no Brasil: foi a ruptura na barragem de uma mina em Itabirito, em setembro de 2014, deixando três mortos. Entretanto, o pesquisador faz questão de enfatizar que tragédias envolvendo reservatórios não estão limitadas ao país. “Quando divulguei os dados da minha pesquisa, a resposta que recebi da indústria foi de que na América do Norte isso nunca aconteceria. Seis meses depois, houve o rompimento da barragem em Mount Polley, no Canadá”, diz Chambers.
Na tragédia canadense, a maior da história desse tipo no país, não houve mortos, mas 23 milhões de metros cúbicos de rejeitos foram lançados no ambiente, atingindo reservatórios de água da região. Em agosto de 2015, um ano depois do desastre, uma equipe da Anistia Internacionalvoltou à área e encontrou moradores ainda inseguros em relação à qualidade da água, aumento nos níveis dos lagos e muitas dúvidas em relação à possível contaminação dos peixes, uma vez que havia criadores de salmão na área.
“No caso da Imperial Metals, que operava a mina de Mount Polley, eles são uma companhia muito menor, não são um conglomerado internacional”, avalia Chambers. No Canadá, a mina onde ocorreu o desastre voltou a operar neste ano, alegadamente para a companhia ajudar a cobrir os custos ambientais do acidente causado por ela própria. “É diferente do caso brasileiro. Espero que BHP e Vale cubram os custos operacionais envolvidos. Elas são as donas da Samarco”, fala o cientista, enfatizando que usar companhias locais para fazer a exploração é um procedimento comum entre multinacionais e, portanto, não pode ser usado como pretexto para isentá-las de culpa.

Falta de dados
Durante a apuração dessa reportagem, Opera Mundi consultou três cientistas que acompanham desastres provocados por empresas mineradoras. Para todos eles, a falta de dados oficiais é um problema para definir a dimensão exata da tragédia ocorrida em Minas. Até agora, dados sobre a contaminação da água foram divulgados por Governador Valadares e Baixo Guaiú, no Espírito Santo, mostrando altos índices de alumínio, magnésio e arsênio (este último apareceu nas provas capixabas).
Apesar de alarmados com os índices obtidos pelas provas, os cientistas acreditam que o método usado para a coleta não foi o mais adequado. “Neste momento, o que mais importa é testar a contaminação da água”, diz Chambers. “Pelos resultados dos testes já feitos, parece que eles foram realizados sem filtrar os sedimentos”, completa o geofísico, esclarecendo que o risco maior ocorre quando os metais estão dissolvidos na água.
Sem informações exatas, fica ainda mais complicado montar o intrincado quebra-cabeças do impacto ambiental provocado pelo vazamento. Magnésio em excesso na água, por exemplo, pode afetar o desenvolvimento mental das crianças, lembra a geoquímica Kendra Zamzow, também da CSP2. Zamzow acredita que o mais provável no caso brasileiro é que os metais estejam “presos” aos sedimentos, reduzindo o risco de contaminação. Entretanto, outro problema pode ocorrer, este relacionado ao depósito dos rejeitos: a formação de uma espécie de “cimento” no leito do rio, o que pode afetar a vida dos seres vivos presentes nas águas.
“Este caso da Samarco é muito maior que o de Mount Polley. No rompimento da barragem canadense, os rejeitos se espalharam por apenas oito quilômetros. Eles poderiam ter ido mais longe, mas foram parados pelo lago de criação de salmão”, diz a geoquímica Kendra Zamzow, também da CSP2.

Fonte: BRASIL DE FATO
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Beatriz Cerqueira: Samarco comanda a apuração do crime que cometeu, controlando políticos, vítimas e jornalistas

publicado em 18 de novembro de 2015 às 15:40
Mariana e Bia Cerqueira
Novos capítulos da tragédia em Mariana

por Beatriz Cerqueira
Após 12 dias do rompimento das duas barragens de rejeitos da Samarco/Vale/BHP, em Mariana, a Assembleia  Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizou a primeira audiência pública, em Belo Horizonte, para debater o assunto.
Em tese, seria o momento para que deputados estaduais ouvissem os atingidos pela tragédia e órgãos do governo e de fiscalização colhessem informações para os trabalhos da Comissão Especial recém-criada.
Mas a audiência se transformou na mais demagógica atividade protagonizada por nossos políticos.  Era uma audiência conjunta com a Câmara dos Deputados.  Mas estes, após tirar fotos, dar entrevistas à imprensa e falar primeiro, foram embora.
Tiveram o mesmo comportamento no dia anterior, na cidade de Mariana, durante a audiência da Comissão de Direitos Humanos: falaram, não ouviram ninguém e foram conduzidos pelas mãos bondosas da Samarco para conhecer o local da tragédia.
Na capital mineira, assistimos a uma deprimente reunião conduzida de modo a não ter efeito nenhum, apesar do esforço isolado de alguns deputados comprometidos com os movimentos sociais.
Ouvimos o Ministério Público falar em “acidente” e se vangloriar de um Termo de Ajustamento de Conduta com o qual a mineradora rapidamente concordou para melhorar sua imagem e cujos termos todos desconheciam. Ouvimos também o representante do Governo de Minas dizer que não podemos “satanizar” as mineradoras.
Poucos prestaram atenção quando uma convidada explicou que a empresa errou ao calcular os possíveis impactos do rompimento de barragem, considerando que atingiria apenas o distrito de Bento Rodrigues e não outras dez localidades, além de toda a bacia do Rio Doce.
Poucos se importaram com a fala do representante dos trabalhadores, que denunciou desconhecer as condições a que estão submetidos os 20 trabalhadores que estão na linha de frente da barragem de Germano, que está trincada.
Aliás, quem informou quantos trabalhadores  estavam desaparecidos foi a empresa, livremente, sem qualquer fiscalização, pois ela impede que se tenha acesso à informações detalhadas.
Os deputados não entenderam nada do que o Padre Geraldo disse, de que é preciso respeitar os atingidos, os verdadeiros protagonistas dessa história. Só que, infelizmente, os protagonistas foram os próprios deputados, na maioria preocupados em falar e não em ouvir.
Enquanto isso o povo atingido está nas mãos da Samarco, que atua livremente em Mariana e região.  Onde está o Estado? Ainda não chegou. A Samarco já está presente, contrariando o lamento da deputada desavisada que reclamou da suposta ausência da Samarco. O desconhecimento da realidade leva a equívocos assim.
A Samarco está mais presente do que nunca: demitiu no dia anterior à audiência 90 trabalhadores terceirizados, dos quais muitos já eram vítimas da tragédia, pois suas famílias perderam tudo na lama.
A Samarco controla todo o acesso aos atingidos que estão nos hotéis e pousadas da cidade, impedindo que se organizem livremente.
A Samarco reúne-se com os atingidos sem nenhuma proteção do poder público. Nas horas das infinitas reuniões com a população, não há Ministério Público nem Governo do Estado presentes e os movimentos sociais são impedidos de acompanhar.
A Samarco controla a cena do crime e chega a selecionar quais jornalistas podem entrar. Assim como controla o acesso da população ao Comando de Operações da Defesa Civil e do Corpo de Bombeiros, que funciona dentro da sede da empresa.
Livremente, a Samarco chantageia a cidade de Mariana pelo poder econômico e pelos impactos que a suspensão do seu trabalho na região causará, como se não tivesse que dar assistência à cidade por todos os prejuízos causados.
Pelo que se vê, muita gente já está dando retorno ao investimento que as mineradoras fizeram nas eleições de 2014. Na verdade, quem está pagando esta conta é povo!

Beatriz Cerqueira é presidenta da CUT/MG e coordenadora-geral do Sind-UTE/MG

Fonte: VIOMUNDO
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Com avanço tecnológico que se vivencia neste início do século XXI, é inaceitável que barragens se rompam com frequência.

Outro aspecto diz respeito a tecnologia de construção e manutenção de barragens como algo  consagrado e de domínio em todo o mundo, já por algumas décadas.

Mesmo assim, o que deveria ser motivo de segurança para as pessoas se transformou em pânico, com bombas de líquidos, contaminados ou não, prontas para destruírem tudo que encontram pela frente.

A supremacia das finanças e das corporações sobre os governos, aspecto marcante do capitalismo global atual, explica, em grande parte , a ocorrência de tantas tragédias.

Pelo  lucro, para o lucro e com o lucro, as empresas ignoram protocolos de segurança e até mesmo conceitos básicos de engenharia. 

Crise fabricada

Associação Brasileira de Comércio Exterior se junta ao CADE em ação contra bancos internacionais


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por Carlos Eduardo, editor-assistente do Cafezinho
Engraçado como a grande imprensa brasileira adora dizer que o "Petrolão" é maior caso de corrupção da história do Brasil. Ou seus jornalistas são muito ruins de conta, ou se trata de pura má-fé. Nem vou entrar aqui no mérito dos escândalos das privatizações do Governo FHC, ou relembrar o caso do Banestado, dois exemplos que superam e muito os valores do "Petrolão".
Pois vejam só esta história absurda.
Entre 2007 e 2013, 30 operadores de bancos estrangeiros que atuam no Brasil conspiraram para influenciar as taxas de câmbio do real em relação ao dólar, com o objetivo de destruir a indústria nacional e prejudicar nossas exportações, além é claro de obter lucros fáceis
Estima-se que operação fraudulenta tenha ocasionado um prejuízo US$50 bilhões à economia ao longo de seis anos. Se convertermos os valores para reais teremos um desvio de R$200 milhões, ou dez vezes os valores desviados no "Petrolão".
Os membros do esquema usavam uma plataforma de chat eletrônico da Bloomberg e ainda tiveram a cara de pau de nomear os grupos como "A Máfia" e "O Cartel", certamente convictos da impunidade por seus atos. E o pior de tudo é que a Associação Brasileira de Comércio Exterior acredita que o país tenha deixado de criar dois milhões de empregos por causa dessa manipulação da banca internacional.
Abaixo segue entrevista da agência russa Sputnik com o empresário José Augusto de Castro, presidente da Associação Brasileira de Comércio Exterior.
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Comércio Exterior brasileiro se junta ao CADE em atuação contra bancos internacionais

Do Sputnik News
No início de julho deste ano, o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica divulgou a instauração de processo investigativo contra 15 grandes bancos com sede no exterior e contra 30 pessoas físicas. A acusação: “suposto cartel de manipulação das taxas de câmbio envolvendo o real e as moedas estrangeiras”. O processo, segundo o CADE, é o mesmo adotado nos Estados Unidos, na Suíça e no Reino Unido.
As instituições financeiras sob investigação do Conselho brasileiro são: Barclays, Citigroup, Credit Suisse, Deutsche Bank, HSBC, JPMorgan, Bank of America, Merrill Lynch, Morgan Stanley e UBS. Também estão sob investigação o Banco Standard de Investimentos, Banco Tokyo-Mitsubishi UFJ, Nomura, Royal Bank of Canada, Royal Bank of Scotland e Standard Chartered, além de 30 pessoas físicas.
Segundo o CADE, não havia, na  época da instauração do processo, indícios de envolvimento de bancos brasileiros nesta manipulação do câmbio.
A tática era valorizar a moeda brasileira com o claro objetivo de baratear as importações e prejudicar a receita com as exportações de produtos nacionais.
Alguns analistas avaliam as perdas econômicas em 50 bilhões de dólares, além de 2 milhões de empregos que deixaram de ser criados.
A AEB está acompanhando a evolução dos fatos. Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, o empresário José Augusto de Castro, presidente da Associação, disse que ao final do processo os empresários do comércio exterior e a entidade que os representa pretendem reunir as informações disponíveis e adotar as medidas cabíveis, de ordem judicial, para buscar a reparação pelos danos sofridos.

Sputnik: Há quanto tempo a AEB – Associação Brasileira de Comércio Exterior está se mobilizando contra essas manobras dos grandes bancos internacionais de manipulação da moeda brasileira?
José Augusto de Castro: No final do mês de junho nós tomamos conhecimento de que poderia ter havido uma valorização do real no período entre 2008 e 2012, e começamos a avaliar o que de fato ocorreu, porque não temos como saber o que está ocorrendo. Nós só sentimos os efeitos da valorização do real, que tornou as exportações brasileiras muito caras e as importações muito baratas. Ocorre que o processo que existe hoje no CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica é conduzido em segredo de Justiça. Após as poucas informações que foram divulgadas, nós começamos a acompanhar. Mais tecnicamente falando, houve um período em que o volume de negócios através das operações de hedge – são os derivativos – tiveram um crescimento muito forte, e infelizmente a maioria dessas operações caminhava para tornar o real valorizado, ou seja, tornar o real mais barato. Isso fazia com que a exportação ficasse muito mais cara quando tivesse que ocorrer. Como consequência, nos últimos cinco anos nós falamos muito aqui – nós o Brasil como um todo – do processo de desindustrialização do país, do processo de transferência de linha de produção do Brasil para o exterior. A quantidade de empresas exportadoras dobrou e em contrapartida as empresas exportadoras diminuíram, nós passamos a ter crescente déficit na conta de manufaturados, um conjunto de fatores negativos. E, claro, a origem disso tudo era a taxa de câmbio.

S: A investigação está sendo conduzida pelo CADE, mas o Banco Central e demais órgãos do Governo como o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e o Ministério das Relações Exteriores não teriam alertado os empresários brasileiros para o que estava ocorrendo com a moeda nacional?
JAC: Na verdade o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior não tem as informações, porque ele não acompanha as operações. Ele tem a taxa de câmbio, mas, como o câmbio é flutuante, pode subir ou descer. O Banco Central, em princípio, tem obrigação de acompanhar. Alguns dados que são divulgados hoje, nós vemos que são dados que chamariam a atenção: o real passou a ser a segunda moeda mais negociada no mundo, somente atrás dos Estados Unidos; o volume de operações no mercado futuro passou a ser cinco vezes o volume de operações no mercado à vista. O normal é ter um equilíbrio ou o mercado à vista ser até um pouco maior do que o mercado futuro. Agora, depois do fato passado, nós passamos a verificar. Mas nós, do setor empresarial, não temos como saber, em detalhes, o quanto está sendo negociado e, principalmente, o que é de uma operação ou da outra. Os dados foram surgindo a partir da avaliação feita pelo CADE e que vem a público, e nós começamos a tomar conhecimento.

S: A quem beneficiariam essas manipulações da moeda brasileira?
JAC: Basicamente aos bancos que fizeram as operações, porque geraram lucros muito altos para eles, porque além do lucro da aplicação no mercado financeiro havia a diferença de taxa de câmbio: quanto mais valorizado o real, maior seria o lucro desses bancos. São bancos de peso. O que eu acho – é a minha opinião, não é uma afirmação – que começou a chamar a atenção foi porque nos EUA e na Europa, especificamente na Inglaterra, houve também esse processo, e os bancos fizeram um acordo, nos EUA e na Inglaterra, em torno de 5 bilhões de dólares. Cada um dos bancos pagou essa quantia em cada país. E o levantamento que foi feito nos EUA, na investigação, os próprios EUA sugeriram que possivelmente o Brasil poderia ser vítima do processo. Acho que a partir daí o CADE começou a avaliar, e depois que um determinado banco fez acordo de leniência admitindo que o que ocorreu foi de fato uma manipulação cambial. Como o processo corre em segredo de Justiça, nós estamos aguardando que acabe o prazo de apresentação de defesa pelos bancos para, a partir daí, começarmos a ter acesso e acompanhar os processos.
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Relembre o caso
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Superintendência do Cade investiga cartel na manipulação de taxas de câmbio

da Assessoria de Comunicação do CADE, em 02 de julho de 2015.
A Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade abriu, nesta quinta-feira (02/07), processo administrativo para investigar suposto cartel na manipulação de taxas de câmbio envolvendo o real e moedas estrangeiras. Também será apurada a manipulação de índices de referência de mercado de câmbio, tais como o do Banco Central do Brasil (PTAX), do WM/Reuters e do Banco Central Europeu.
As empresas investigadas no processo (PA 08700.004633/2015-04) são Banco Standard de Investimentos, Banco Tokyo-Mitsubishi UFJ, Barclays, Citigroup, Credit Suisse, Deutsche Bank, HSBC, JP Morgan Chase, Merril Lynch, Morgan Stanley, Nomura, Royal Bank of Canada, Royal Bank of Scotland, Standard Chartered e UBS, além de trinta pessoas físicas.
As supostas condutas anticompetitivas envolveram o mercado de câmbio (em inglês "Foreign Exchange market" ou "FX market”) e as instituições financeiras que operam neste mercado.
No mercado de câmbio são realizadas as operações que se referem à compra de uma moeda em troca de outra. Essas operações têm como base a taxa de câmbio, considerada um preço chave da economia, que influencia desde os níveis de consumo interno de um país, como os níveis de investimento, importação e exportação, além de todas as transações financeiras que a tomem por base.  Ainda que o real seja a moeda oficial do país, um número considerável de operações cambiais realizadas por entidades brasileiras também são feitas por meio de moedas estrangeiras, como euro, dólar, libra esterlina, franco suíço, dentre outras.
O mercado de câmbio conta ainda com os índices de referência (ou taxas de câmbio de referência), calculados com base nas taxas de câmbio à vista de mercado e publicados periodicamente por entidades públicas e privadas - tais como o Banco Central do Brasil (PTAX), o WM/Reuters e o Banco Central Europeu - em todo o mundo para pares específicos de moedas. Esses índices de referência são usados como parâmetro por empresas multinacionais, instituições financeiras e investidores que avaliam contratos e ativos mundialmente, entre outros.
Os clientes das instituições financeira que executam operações de câmbio  são, dentre outros, todos aqueles agentes que periodicamente necessitam realizar operações de compra e venda de moeda, como bancos, fundos de investimentos, pessoas físicas (investidores, turistas), empresas privadas e entidades governamentais, por exemplo. Quando os clientes desejam realizar transações no mercado de câmbio, as instituições financeiras que oferecem esse serviço concorrem entre si para executar a operação, oferecendo um preço competitivo (taxa de câmbio para compra ou para venda de determinada moeda). As operações de câmbio também podem ser feitas com base nos índices de referência.

Conduta - O parecer da Superintendência aponta que existem fortes indícios de práticas anticompetitivas de fixação de preços e condições comerciais entre as instituições financeiras concorrentes. Segundo as evidências, os representados teriam feito um cartel para fixar níveis de preços (spread cambial); coordenar compra e venda de moedas e propostas de preços para clientes; além de dificultar e/ou impedir a atuação de outros operadores no mercado de câmbio envolvendo a moeda brasileira.
As instituições financeiras acusadas também teriam se coordenado para influenciar índices de referência dos mercados cambiais, por meio do alinhamento de suas compras e vendas de moeda. Foram encontrados indícios adicionais de práticas anticompetitivas de compartilhamento de informações comercialmente sensíveis sobre o mercado de câmbio, como informações sobre negociações, contratos e preços futuros; ordens de clientes; estratégias e objetivos de negociação; posições confidenciais em operações e ordens específicas; e o montante de operações realizadas (fluxos de entrada e saída).
Todas as supostas condutas teriam comprometido  a concorrência nesse mercado, prejudicando as condições e os preços pagos pelos clientes em suas operações de câmbio, de forma a aumentar os lucros das empresas representadas, além de distorcer os índices de referência do mercado de câmbio.
As práticas anticompetitivas foram viabilizadas por meio de chats da plataforma Bloomberg – por vezes autodenominados pelos representados como “o cartel” ou “a máfia”. As condutas teriam durado, pelo menos, de 2007 a 2013.
Com a instauração do processo administrativo, os acusados serão notificados para apresentar defesa no prazo de 30 dias. Ao final da instrução processual, a Superintendência-Geral opinará pela condenação ou arquivamento e remeterá o caso para julgamento pelo Tribunal do Cade, responsável pela decisão final.

Leniência - A investigação teve início a partir de um acordo de leniência celebrado com a Superintendência-Geral do Cade e o Ministério Público Federal. Por meio da leniência, instituto previsto na Lei 12.529/11, um participante de cartel denuncia o ilícito do qual fazia parte, aponta os demais envolvidos e se compromete a colaborar com as autoridades na apuração do caso, em troca da extinção ou redução da punibilidade.

Fonte: O CAFEZINHO
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Crise econômica foi alimentada artificialmente, diz diretor do Le Monde Diplomatique Brasil

O movimento, segundo ele, teria iniciado ainda no final de 2014, logo após o final das eleições presidenciais que garantiram a reeleição de Dilma Rousseff
Crise econômica foi alimentada artificialmente, diz diretor do Le Monde Diplomatique Brasil

Por: Agência PT, em 20 de novembro de 2015 às 10:41:51

O sociólogo Silvio Caccia Bava, diretor e editor chefe do Le Monde Diplomatique Brasil, alertou, na quarta-feira (18), durante palestra, sobre a real natureza da crise econômica que o Brasil atualmente enfrenta. Para ele, houve um processo de construção artificial de uma crise econômica, a partir da mídia e de acadêmicos.
O movimento, segundo ele, teria iniciado ainda no final de 2014, logo após o final das eleições presidenciais que garantiram a reeleição de Dilma Rousseff.
“No final de 2014, começamos a vivenciar um clima de terrorismo econômico para forçar uma mudança de rumos na política econômica”, declarou.
O verdadeiro objetivo desse movimento, acrescentou, era um só: o Brasil precisa promover uma recessão para rebaixar o custo do trabalho. Esse objetivo, destacou ainda, faz parte de uma agenda global de recuperação de perdas do capital financeiro após a crise internacional de 2008.
Quem pagou o pato neste processo é a economia real e todos aqueles que vivem da renda do próprio trabalho. Já o capital financeiro tratou de recuperar o terreno perdido.
“Os grandes fundos de investimento praticamente dobraram de tamanho depois da crise de 2008. No caso o Brasil, o país virou uma plataforma de exploração rentista internacional, com taxas de juros que não têm paralelo no mercado”, observou o sociólogo.
No plano político, esse movimento do sistema financeiro é acompanhado por um Congresso Nacional onde cerca de 70% dos parlamentares eleitos foram financiados por apenas dez grandes grupos econômicos.
“Os partidos, de modo geral, deixaram de representar esses interesses porque seus parlamentares passaram a responder a interesses privados, de seus financiadores de campanha”, ressaltou
O antídoto para esse quadro, defendeu, é mais democracia e o aprofundamento do debate na sociedade sobre o que está acontecendo no país, quais os agentes que estão atuando e construindo as narrativas da crise.
“Estamos vivendo o fim de um ciclo, mas há um fato positivo acontecendo, que é a formação de novas frentes de luta como a Frente Brasil Popular”, avaliou.

Fonte: PT
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quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Educação para o PSDB é porrada em adolescente

quarta-feira, novembro 18, 2015


Da série: vale a pena ler de novo

No momento em que o governo do Estado de São Paulo (do PSDB, é bom frisar) fecha 94 escolas e bota sua Polícia Militar pra cima dos alunos que protestam pacificamente contra essa medida arbitrária (inclusive prendendo professores), vale recordar essa notícia aqui, dos tempos da campanha presidencial de 2006 (os grifos são meus):
CLARICE SPITZ
da Folha Online, no Rio de Janeiro (07/09/2006)

A 24 dias das eleições, o candidato do PSDB à Presidência, Geraldo Alckmin, lançou nesta quinta-feira sua proposta de governo para a educação, com a promessa de aumentar o número de horas-aula. Em visita à favela de Rio das Pedras, na zona oeste do Rio, Alckmin disse que seu plano também prevê o reequipamento de escolas e a melhoria do acesso as creches.

O candidato afirmou que sua meta é de [sic] estabelecer um padrão de 5 horas aula para o ensino fundamental em todo o país e disse que, em alguns lugares, as crianças ainda permanecem somente 3 horas na escola. O tucano ainda afirmou que vai trabalhar para melhorar a qualidade da educação básica e universalizar o ensino médio. "Hoje, o grande gargalo é o ensino médio: não deixar o aluno terminar a oitava série e parar de estudar", disse ele.

No programa de governo, o comitê de campanha afirma que a oferta de vagas no ensino médio ainda é insuficiente aos 10 milhões de jovens nessa
Fonte: FUTEPOCA
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Izabel Noronha: Senhor Secretário, pare de tratar as questões educacionais como caso de polícia!; já são 42 escolas ocupadas, veja quais

publicado em 17 de novembro de 2015 às 21:41
secretário da educação e bebel
O secretário de Educação do Estado de São Paulo, Herman Jacobus Cornelis Voorwald
Senhor Secretário: educação não é caso de polícia!
da assessoria de imprensa da Apeoesp, via e-mail
O Secretário Estadual da Educação declarou em entrevista coletiva na tarde desta terça-feira, 17/11, que pretende retomar a posse de todas as unidades escolares ocupadas por estudantes e comunidades. No momento em que escrevo este texto já são 44 escolas ocupadas. A primeira a ser ocupada foi a EE Diadema, em 9/11.
A declaração do Secretário causa perplexidade, pelo que revela de autoritarismo, insensibilidade e descompromisso com os direitos e necessidades de estudantes, professores, funcionários e todos os que utilizam as escolas públicas estaduais.
O secretário deveria saber que as reintegrações de posse não irão resolver a situação criada pelo Governo Estadual ao pretender fechar 94 escolas e “reorganizar” outras 752, fragmentando o ensino fundamental e segmentando em prédios diferentes as etapas e níveis de ensino que compõem a educação básica.
Não há justificativa pedagógica para esta segmentação (como o Secretário denomina o processo), pois a convivência entre crianças de diferentes idades é natural e salutar para o processo ensino-aprendizagem e para a construção do conhecimento.
A ocupação das escolas é um sintoma do profundo descontentamento de estudantes, seus pais, professores e funcionários com um processo decidido a portas fechadas e imposto autoritariamente.
Como o Secretário pretende realizar a reintegração de tantas unidades escolares ocupadas por crianças e adolescentes? Utilizará a força bruta? Não posso crer que um educador acredite que este é o método correto para lidar com um problema de política pública, como se todos fôssemos obrigados a aceitar seus ditames.
Se levar adiante sua intenção de desocupar as escolas, sem qualquer tipo de encaminhamento ou solução para as reivindicações formuladas pelos diversos movimentos que hoje se realizam contra a “reorganização” da rede estadual de ensino, o Secretário certamente conseguirá produzir um repúdio ainda maior por parte dos estudantes, suas famílias e toda a população, alimentando um processo de enfrentamento potencialmente incontrolável.
É preciso que o Secretário da Educação pare de tratar as questões educacionais como caso de polícia. É preciso que utilize o método correto para equacioná-las.  Diante de evidências tão cristalinas de que seu projeto de reorganização não é aceito pela sociedade, deveria suspender sua execução, abrindo um amplo processo de debate durante o ano de 2016, para que se produzam soluções verdadeiras para os problemas reais da rede estadual de ensino de São Paulo.
Maria Izabel Azevedo Noronha
Presidenta da APEOESP
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Fonte: VIOMUNDO
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A aula dos 'secundas'

Uma boa forma para acelerar o processo de mudanças seria o retorno dos políticos e governantes à escola, para terem uma aula de cidadania com os estudantes


A
Jorge Luiz Souto Maior
reprodução














O Brasil vive um momento bastante complexo, que nos dificulta a compreensão dos fatos, também porque muito do que se sabe pela grande mídia não são os fatos propriamente ditos, mas versões, tantas vezes deturpadas, sentimental ou propositalmente construídas.

O resultado é o imobilismo, porque fica bem difícil saber para onde ir, o que e a quem defender.

Em meio a tudo isso, eis que os estudantes secundaristas, pessoas de 13 a 16 de idade – alguns com 17 ou 18 –, resolvem mostrar que é possível ter boas e certeiras causas pelas quais lutar e saem às ruas em defesa das escolas públicas nas quais estudam.

E não o fazem por mera farra. Agem com convicção, com consciência em torno da importância do ensino público. Defendem as escolas não apenas para si, mas por princípio. Sabem bem do descaso em que, estruturalmente, foi deixada a coisa pública. Sofrem, em inúmeras situações, com a precariedade das acomodações e com a redução de material. Mas não acolhem, de forma radical, ou seja, sem titubear, a ideia do governo do Estado de fechar escolas, de aumentar o número de alunos por sala, de separar o ensino fundamental do ensino médio e, consequentemente, de transferir de forma arbitrária estudantes de uma escola para outra, dificultando o acesso à educação.

Os estudantes, ao saírem em defesa de “suas escolas”, demonstram, para todo o país, que o Brasil não é só corrupção, não é só desmandos administrativos, não é só favoritismo, não é só egoísmo, individualismo e busca de sucesso pessoal por meio de ganhos financeiros e de “status”, como a grande mídia insiste em divulgar. Aliás, para essa gente destruidora da moral da população brasileira todas as pessoas são iguais a ela e, segundo tenta difundir, os jovens são alienados, drogados, descomprometidos, preguiçosos e, consequentemente, ignorantes.

Mas o que se tem em concreto na mobilização dos “secundas”, como se intitulam, são jovens levantando a bandeira da defesa da educação pública de qualidade. São jovens, portanto, que querem estudar, mas que também se preocupam em defender a instituição responsável por isso, mesmo reconhecendo as deficiências estruturais das escolas, sendo que isso, ao mesmo tempo, representa o reconhecimento da qualidade de ensino que os professores e professoras, com todas as dificuldades, ainda conseguem lhes transmitir.

Então, era para que todas as pessoas sérias e que se consideram minimamente preocupadas com a melhora do país estivessem na frente das escolas aplaudindo os estudantes, porque, afinal, estão dando uma aula, que, inclusive, serve à redenção de todos nós. Os estudantes estão dando uma aula de cidadania, de compreensão, de comprometimento, de consciência, de organização e de luta. Uma aula que deixa uma grande e essencial mensagem: o Brasil tem jeito!

No entanto, bem ao contrário, o que se vê é um esforço midiático muito grande para desconsiderar a importância “revolucionária” do movimento, que está refletido em ocupações em 20 (vinte) escolas, mas que, obviamente, não se reduz a isso. De fato, a defesa coletiva e consciente das escolas públicas reflete a situação de que os estudantes compreendem bem a sociedade em que vivem e que não pretendem ficar ali parados, seguindo um destino que lhes foi traçado de serem, no futuro, força de mão-de-obra desqualificada para alimentar um sistema que reforça as desigualdades.

Aliás, é bem isso, ou seja, o risco da perda da mão-de-obra desqualificada, para a realização de serviços que, embora dignos, foram socialmente reduzidos a uma condição subalterna e impregnados de submissão, que incomoda tanto à classe economicamente dominante, que vai às ruas defender um Brasil melhor, mas que olha com desdém a mobilização dos secundaristas.

É também por isso, aliás, que o governo do Estado não apenas tenta implementar uma política para a escola pública que visa punir os professores e as professoras pela sua atuação politicamente consciente, como também trata os estudantes, não como adolescentes, que de fato são, mas como rebeldes que não querem seguir os seus desígnios, chegando a enxergá-los como “operários” que se recusam a trabalhar, sendo por essa razão, ademais, que se interligam as pautas dos estudantes, dos professores e dos trabalhadores.

E a cena extremamente deprimente que se vê é a da escola pública transformada em uma prisão, cercada de policiais, fortemente armados e cegamente preparados, fazendo parecer que os estudantes que ocupam a escola, em ato político, já estão presos e sob a ameaça de males ainda maiores, chegando a situações de gravidade e dramaticidade como se verifica na EE José Lins do Rego, na zona sul e na EE Salvador Allende, na zona leste de São Paulo, e na EE CEFAM, em Diadema.

E alguém pode se perguntar: que Estado é esse que enfrenta com força bruta estudantes adolescentes de escolas públicas que defendem a sua escola e o seu direito constitucional de estudar? A resposta é simples: é um Estado que protege interesses do poder econômico e que não quer permitir a ocorrência das transformações sociais possibilitadas pela melhora do ensino que, provoca, inclusive, a diminuição das diferenças de oportunidades. Um Estado que é capaz de transformar o ato político de adolescentes que querem estudar em caso de polícia, sob o falso argumento da defesa do patrimônio público, afinal, estamos falando de um patrimônio que o Estado nunca cuidou e que, portanto, se fosse para punir juridicamente a depredação do patrimônio público das escolas os governantes já deveriam estar presos há muito tempo. Estado que, ao mesmo tempo, é totalmente incapaz de tratar com o mínimo rigor, no que se refere ao menos ao cumprimento das leis, grandes empresas, que, a cada dia, poluem, exploram, quando não matam, como se viu, agora, na região de Mariana/MG, e como está impregnado em tantos monumentos, da transamazônica aos estádios da Copa, passando por usinas, hidroelétricas e pontes.

É um Estado, portanto, que quer manter a ocupação de doméstica para a filha da doméstica.

Mas a brutalidade não vence a consciência e, portanto, o que os governantes de plantão pretendem é, de fato, uma grande ilusão, pois as mudanças sociais no Brasil, sobretudo a partir de junho de 2013, já estão em curso irreversível, até porque a mudança em termos de compreensão de mundo não é um fenômeno exclusivo do ensino público. Também no ensino privado, nas consideradas melhores escolas do país, por obra de competentes gestores e valorosos professores e professoras, o economicismo cede espaço ao humanismo, à solidariedade, à naturalização quanto à equiparação das oportunidades e a repartição da riqueza, à tolerância, à condenação aos preconceitos, sobretudo, de raça e de etnia, ao respeito às diversidades, às opções de sexualidade e à igualdade de gênero, fazendo com que a distância de mentalidade entre os jovens de classes sociais diversas seja cada vez menor, o que favorece à superação de um conflito tão estimulado em gerações passadas.

Essa mudança é tão sentida que adeptos do “status quo”, impregnados pelo escravismo, pelo racismo, pelo machismo, pela discriminação e pela intolerância, financiam campanhas contra o que chamam de “doutrinação marxista” nas escolas. Gente que nunca leu as obras de Marx e que nem de longe sabe o que é marxismo. Gente que despreza, inclusive, os Direitos Humanos e que, no fundo, tem medo do conhecimento, porque conhecer a realidade das coisas pode ser doloroso e incômodo.

Outro dia li em uma mensagem de Facebook: “São esses Direitos Humanos que impede (SIC) o desenvolvimento do país”. Mas como já dizia o personagem de Mário Tupinambá, na Escolinha do Professor Raimundo, “a ignorança é que astravanca o progréssio!”

Fato é que a escola, pública e privada, não pode deixar de cumprir o seu papel essencial de transmitir o conhecimento, não se reduzindo, pois, a formar mão-de-obra para o mercado, sendo inevitável, por conseguinte, que assumamos o “risco” de sermos seres humanos dotados de consciência e conhecimento.

E que ninguém se iluda, esse não é um caminho fácil e a reação policial aos jovens estudantes demonstra bem isso, assim como as diversas formas de opressão, criadas nos regimes ditatoriais brasileiros, que ainda estão vigentes, sobressaindo a reprimenda moral e jurídica às greves dos trabalhadores, sendo que se alia a tudo isso, para conter os avanços, a forte campanha que se tem difundido “a favor” da crise econômica, cuja função é a de instaurar o medo e, com isso, inibir as lutas políticas pela consagração e efetivação de direitos sociais.

Ainda assim as mudanças em torno da diminuição das desigualdades sociais, políticas e econômicas estão ocorrendo e continuarão em curso e se os políticos e governantes não sabem disso seria de todo conveniente que aproveitassem o momento em que os estudantes os chamam para o diálogo e se dignassem de ir às escolas não só para conversar com os secundaristas, mas para aprender com eles, como, aliás, de forma exemplar, fez o membro do Ministério Público, João Paulo Faustinoni e Silva, que, após comparecer à ocupação da EE Fernão Dias e compreender o que estava de fato acontecendo no local, pediu a revogação da liminar de reintegração de posse e conseguiu, com o reforço argumentativo da APEOESP, que o juiz da causa, Luis Felipe Ferrari Bedendi, da 5ª Vara de Fazenda Pública, adotasse a grandiosa postura de rever seu posicionamento e proferisse belíssima e importantíssima decisão sobre o caso (Processo n. 1045195-07.2015.8.26.0053).

Eu também fui ao local, onde passei toda a tarde e o início da noite de sexta-feira, dia 13, e posso garantir que se aprende muito com os estudantes, notadamente quanto à sua capacidade de organização e à sua compreensão de mundo.

Ou seja, uma boa forma para acelerar o processo de mudanças, tornando-o menos traumático, seria a de uma espécie de retorno dos políticos e governantes à escola, para terem uma aula de cidadania com os estudantes.

Enfim, quero deixar consignado aqui um manifesto de apoio à defesa das escolas públicas, contra, portanto, o projeto de reestruturação apresentado pelo governo do Estado de São Paulo, transmitindo toda a força aos “secundas” e aos professores e professoras pela sua luta, não porque, de fato, precisem de mim, mas porque todos nós, cidadãs e cidadãos brasileiros, precisamos muito de uma aula como essa!

Fonte: CARTA MAIOR
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