terça-feira, 3 de novembro de 2015

Caos ambiental

País poderá viver drama climático em 2040


Seca em Silves (AM) em 2005. Foto: Ana Cintia Gazzelli/WWF
Seca em Silves (AM) em 2005. Foto: Ana Cintia Gazzelli/WWF

Em 25 anos, Brasil conviverá com calor extremo, falta d’água e de energia, queda na produção agropecuária, doenças e prejuízo por ressacas, sugere maior levantamento já feito sobre impactos do clima.

Por Claudio Angelo e Cíntya Feitosa, do OC –
Daqui a apenas 25 anos, no tempo de vida da maior parte dos leitores deste texto, o Brasil poderá ter seu cotidiano e sua economia transformados – para pior – pela mudança do clima. Secas violentas impedirão o parque hidrelétrico de gerar energia para atender à população e tornarão fúteis investimentos bilionários em barragens na Amazônia. Culturas como a soja poderão ter redução de até 39% em sua área. A elevação do nível do mar deixará exposto a alto risco de destruição um patrimônio imobiliário de até R$ 124 bilhões apenas na cidade do Rio de Janeiro. Mais idosos morrerão por ondas de calor, especialmente no Norte e no Nordeste
As más notícias vêm do maior estudo já realizado sobre impactos da mudança climática no Brasil. Trata-se do “Brasil 2040 – Alternativas de Adaptação às Mudanças Climáticas”, encomendado pela Secretaria de Estudos Estratégicos da Presidência da República a diversos grupos de pesquisa do país e divulgado nesta quinta-feira (29/10), sem alarde, na página do extinto ministério na internet. O Ministério do Meio Ambiente, que herdara o estudo após a demissão de seus idealizadores pela SAE em março, se preparava para publicá-lo nos próximos dias.
O trabalho busca entender como o clima poderá variar no Brasil nos próximos 25, 55 e 85 anos, de forma a embasar políticas públicas de adaptação em cinco grandes áreas: saúde, recursos hídricos, energia, agricultura e infraestrutura (costeira e de transportes).
Os cenários para os diversos setores foram construídos a partir de dois modelos climáticos globais usados pelo IPCC, o painel do clima das Nações Unidas, e regionalizados para o Brasil pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Esses modelos são grandes simulações da Terra, onde são incluídas variáveis como vento, oceanos e florestas. Alimentando-os com dados sobre a taxa de emissões de gases de efeito estufa, eles conseguem estimar como o clima vai variar nas próximas décadas ou séculos.
Os modelos do IPCC têm a vantagem de enxergar o planeta inteiro, porém são “míopes”: eles dividem o mundo em células de 200 km x 200 km, grandes demais para permitir investigar variações climáticas dentro de uma região geográfica menor ou um país. O que o Inpe fez foi usar dois desses modelos e aumentar sua resolução para 20 km x 20 km, dando um zoom na América do Sul. Isso permitiu montar pela primeira vez cenários detalhados de chuva e temperatura para as próximas décadas no Brasil.
Dois modelos foram utilizados: o britânico HadGEM-2 e o japonês Miroc-5. Por uma questão de personalidade matemática, por assim dizer, ambos “enxergam” o clima no futuro de jeitos diferentes: o britânico tende a apontar um mundo mais seco no futuro, enquanto o japonês vê um mundo mais chuvoso.
Cada modelo, por sua vez, foi rodado em dois cenários de emissão de gases de efeito estufa do IPCC, as chamadas “trajetórias representativas de concentração”: o RCP 8,5, que assume que a humanidade não fará nada para controlar as emissões de CO2; e o RCP 4,5, que assume esforços limitados de controle de emissões, mas ainda fora da trajetória dos 2oC considerados o limite máximo “seguro” de aquecimento.
O que a modelagem revelou foi que, em todos os cenários, o Brasil de 2040 será um país mais quente e mais seco. As temperaturas médias nos meses mais quentes do ano podem subir até 3oC em relação às médias atuais no Centro-Oeste. A região Sul tende a ficar mais chuvosa, enquanto o Sudeste, o Centro-Oeste e partes do Norte e Nordeste teriam reduções nas chuvas, em especial nos meses de verão.
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O primeiro efeito disso é uma redução na vazão dos rios que abastecem a maior parte da população brasileira, como mostraram os estudos sobre recursos hídricos do “Brasil 2040”.
Um grupo liderado por Francisco de Assis Souza e Eduardo Martins, da Universidade Federal do Ceará e da Fundação Cearense de Meteorologia, usou os dados de chuva para construir um modelo de vazão – não é possível estimar quanto um rio enche ou seca apenas olhando para a média de chuvas.
O resultado é dramático para quem acha que o Sudeste do Brasil já sofreu o suficiente com falta d’água e ameaça de racionamento de energia nos últimos três anos: no melhor cenário, vários rios de Minas Gerais, São Paulo, Goiás, Tocantins, Bahia e Pará terão reduções de vazão de 10% a 30%.
Transpostos para as usinas hidrelétricas, os dados de vazão trazem um desafio para o setor de energia no Brasil: as mais importantes usinas do país – Furnas, Itaipu, Sobradinho e Tucuruí – teriam reduções de vazão de 38% a 57% no pior cenário.
Na Amazônia, região eleita pelo governo a nova fronteira da hidroeletricidade no país, as quedas também seriam significativas, como adiantou o OC em abril: a vazão de Belo Monte cairia de 25% a 55%, a de Santo Antônio, de 40% a 65%, e a da usina planejada de São Luís do Tapajós, de 20% a 30%.
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Vazões estimadas de algumas das principais hidrelétricas do país para o período 2011-2040. A linha verde mostra o melhor cenário; a vermelha, o pior.

Hidrelétricas em colapso
À exceção de São Luís, a maioria das novas usinas na Amazônia é a fio d’água, ou seja, não possui grande reservatório. Isso significa que seu fator de capacidade, ou seja, a quantidade de energia constante gerada ao longo do ano, é reduzido, já que a vazão dos rios amazônicos varia enormemente entre a estação da seca e a da chuva. Belo Monte, por exemplo, tem um fator de capacidade de cerca de 40%, que, reduzido à metade, daria à hidrelétrica de R$ 30 bilhões um fator de capacidade menor que o de usinas eólicas – para as quais os planejadores energéticos brasileiros e a presidente Dilma Rousseff torcem o nariz, já que essas usinas não são capazes de gerar “energia firme” nos períodos sem vento. No total, a geração hidrelétrica cai de 8% a 20% no país.
“O planejamento energético precisa ser revisto urgentemente à luz dos dados do ‘2040’, sob pena de a sociedade enterrar bilhões de reais em projetos que não se pagam”, disse Carlos Rittl, secretário-executivo do OC.
Os dados de Martins e Souza foram utilizados por uma equipe de pesquisadores da Coppe-URFJ liderada por Roberto Schaeffer para analisar o que acontece com a eletricidade do Brasil nos próximos 25 anos caso se confirmem os cenários de mudança do clima.
O grupo usou em sua análise, por sua vez, dois modelos computacionais: um deles leva em conta a matriz energética, a demanda por eletricidade e o crescimento do PIB para estimar o comportamento do sistema elétrico brasileiro – que fontes crescem na matriz, que fontes diminuem, de acordo com o custo e o fator de capacidade. O outro modelo simula como as usinas hidrelétricas e termelétricas operam no mundo real de acordo com a disponibilidade de água nos reservatórios.
A principal conclusão do estudo de Schaeffer e colegas é filosófica: o planejamento elétrico no Brasil não poderá mais ser feito como vem sendo. Hoje, os responsáveis pelo setor no governo trabalham segundo a filosofia do “estado estacionário” de variáveis climáticas, ou seja, o comportamento dos rios no futuro seguirá o comportamento do passado.
“Não dá mais para fazer isso. O futuro não vai obrigatoriamente repetir o passado”, disse Schaeffer ao OC.
A análise dos pesquisadores mostra que, em todos os cenários analisados, há uma queda na vazão das principais bacias hidrográficas brasileiras, que empurra o sistema elétrico para uma situação de desequilíbrio estrutural: o sistema não dá conta de atender a demanda, provocando cortes de carga – em português claro, apagões.
Sem medidas de corte de emissões (ou seja, no RCP 8,5), no pior cenário, a vazão dos reservatórios cai 30% e o risco de déficit em alguns anos se aproxima de 100% – a margem considerada “segura” pelo governo para evitar apagões é de 5%. No melhor cenário, a queda de vazão das hidrelétricas chega a 10%, e o risco de déficit, a 60% em alguns anos. O custo de operação do sistema, que leva em conta inclusive o acionamento de térmicas, sobe em oito vezes no melhor cenário e em 16,7 vezes no pior.
A consequência do colapso das hidrelétricas é o aumento do uso de carvão mineral e gás natural na matriz brasileira, o que tanto aumenta o custo de operação do sistema quanto as emissões de carbono, agravando ainda mais o efeito estufa. Outra consequência pode ser o retorno das usinas com grandes reservatórios, em especial na região Sul, onde vai chover mais.
Os resultados surpreenderam até os pesquisadores. “Se isso acontecer, o país para se não tiver um seguro”, disse Schaeffer.
Parte desse “seguro” não depende apenas do Brasil: é o corte de emissões dentro de um acordo global do clima. Segundo o estudo, somente o custo de expansão do sistema elétrico cairia em R$ 122 bilhões entre o cenário RCP 8,5 (sem mitigação da mudança do clima) e o cenário RCP 4,5 (com mitigação).
O “seguro” cabe ao país contratar, segundo o pesquisador, é a adaptação do sistema. E a melhor maneira de adaptar, curiosamente, é reduzindo emissões: aumentando em muito a eficiência energética e o uso de renováveis, de modo a reduzir a dependência de termelétricas fósseis e de hidrelétricas, e colocando um preço nas emissões de carbono – não necessariamente uma taxa, Schaeffer apressa-se a dizer.
Os dados de energia e recursos hídricos do “Brasil 2040” foram apresentados ao governo federal ao longo do ano e recebidos com algumas críticas – o estudo da UFCE foi considerado “alarmista” pela própria SAE.
“Uma crítica que a gente pode receber é que há incerteza. Mas também há incerteza sobre se você vai ficar doente, e nem por isso você deixa de fazer um plano de saúde”, compara Roberto Schaeffer.

Mico no Mapitoba
Os relatórios sobre agricultura, elaborados por equipes da Embrapa e do Agroicone, também devem causar arrepios no governo. Eles mostram que a maior aposta da ministra Kátia Abreu (Agricultura) para a futura expansão da produção no país, o chamado Mapitoba (uma zona de cerrados entre Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia), pode virar um mico na mão de investidores.
Uma das análises aponta para a tendência de desvalorização das terras por decorrência das mudanças na produção e aumento do risco climático. Em Pernambuco, as terras podem perder até 43% do seu valor. No Pará, a perda pode ser de até 36%.
No estado do Maranhão, as perdas podem variar de 2% a 16%, no Tocantins de 14% a 26% e de 3% a 14% no Piauí. Um dos cenários aponta valorização das terras na Bahia, mas esse estado também pode ter perdas de 5% no valor das terras.
Os impactos das mudanças do clima na agricultura podem levar a perdas de área agriculturável em quase todas as culturas avaliadas – o efeito mais grave deve recair sobre a área de cultivo de soja, com perdas de até 39%. O feijão, arroz e milho safrinha podem ter redução de área cultivável de 26%, 24% e 28%, respectivamente.
No caso da cana-de-açúcar, as áreas cultiváveis podem aumentar, por ser um gênero que precisa de calor, em especial para a produção de etanol. Porém, o cultivo deve migrar para regiões que hoje são mais frias. A produção de mandioca deve sair do Nordeste, muito seco, e migrar para áreas de Cerrado e Amazônia. O caupi, ou feijão-de- corda, já está migrando do Nordeste para o Centro-Oeste.
A pesquisa sugere que a própria dinâmica do mercado vai ser uma das medidas de adaptação: a redução de áreas aptas para produção deve afetar os preços das commodities agrícolas; as regiões de maior aptidão produtiva devem responder positivamente, enquanto outras regiões deverão perder produção; haverá impactos sobre os preços ao produtor e ao consumidor final; novos equilíbrios de oferta, demanda e preços serão gerados, influenciando na produção.

Calor
O capítulo de saúde, que não está entre os relatórios disponibilizados pela SAE mas ao qual o OC teve acesso, avaliou apenas os impactos das ondas de calor sobre taxas de mortalidade. Os efeitos são heterogêneos, de acordo com a faixa etária, clima regional e as condições de saneamento. Os idosos são o grupo populacional mais vulnerável, enquanto na avaliação por região, Norte e Nordeste devem ser as mais afetadas.
No Tocantins, por exemplo, o aumento do número de mortes entre idosos pode chegar a 9%, em decorrência de doenças respiratórias agravadas por ondas de calor. Rio Grande do Norte e Paraíba também devem ter aumento superior a 5% nos índices de mortalidade no mesmo grupo.
“Temos o dado demográfico: a população vai envelhecer. Então, o Brasil vai se tornar mais vulnerável às mudanças do clima”, diz o coordenador do estudo, José Feres, do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas).
O estudo também alerta para a disseminação de doenças infecciosas endêmicas, que podem aumentar de acordo com as condições climáticas, como malária, dengue e leptospirose. Outra preocupação são eventos climáticos extremos como tempestades, ocasionando inundações, afogamentos, desabamentos, aglomerações, entre outros. “Nossa principal recomendação é a criação de um sistema de alerta para ondas de calor e outros eventos climáticos extremos. É uma medida simples, mas que o Brasil ainda não tem”, diz Feres.

Estradas ruins
A avaliação dos impactos sobre a infraestrutura de transportes traz a informação que os brasileiros que viajam de carro ou ônibus já sabem: nossa malha rodoviária já é ruim. Mas pode piorar. O estresse por chuvas intensas, acúmulo de umidade e altas temperaturas demanda altos investimentos em adaptação.
Combinando informações sobre sinalização, qualidade do asfalto e condições das rodovias, elaborou-se o Índice de Vulnerabilidade da Infraestrutura Rodoviária (IVIR). Quanto mais alto, mais vulneráveis são as rodovias. Observando os mapas, é possível comparar o número de rodovias vulneráveis hoje e em 2040.

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As regiões Sudeste e Sul, que hoje já apresentam estradas em boas condições, serão as menos afetadas. Atualmente, apenas oito estados apresentam segmentos vulneráveis, contra 22 estados no cenário futuro, além do Distrito Federal. A região Nordeste é campeã em vulnerabilidade, em especial no litoral – tanto pela possibilidade de aumento de temperaturas quanto pelas condições das rodovias.
“No Brasil, não há um banco de dados consistente sobre os efeitos de eventos climáticos na infraestrutura rodoviária e não há indícios de que essa situação irá mudar no curto prazo”, diz o relatório. “Tal banco de dados é importante para determinar a resiliência atual e para prover a base para estudos sobre impactos relacionados ao clima futuros.”
A análise ressalta que os custos de adaptação e reparos podem ser muito superiores à economia feita com obras mais baratas, que não serão satisfatórias em médio e longo prazo. Também recomenda o desenvolvimento de estudos sobre o risco de afogamento da infraestrutura rodoviária em decorrência de chuvas fortes, em todo o território nacional.
“São soluções de engenharia tradicional, mas que sairão caríssimas por causa do tamanho da rede”, disse Sérgio Margulis, economista carioca que idealizou o “Brasil 2040”.

Olha a onda
A equipe do engenheiro Wilson Cabral Jr., do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) também criou um índice de vulnerabilidade para a infraestrutura costeira e portuária do Brasil, na tentativa de estimar o que aconteceria com o litoral em caso de elevação do nível do mar conforme previsto pelo IPCC.
Os pesquisadores tiveram de lidar com um problema adicional: a absoluta falta de informações sobre como o nível do mar vem subindo no país nas últimas décadas e sobre como as ondas vêm ficando mais fortes. “A rede de marégrafos no Brasil é incipiente, e a de ondógrafos mais ainda”, disse Márcia Oliveira, coordenadora de Gerenciamento Costeiro do Ministério do Meio Ambiente.
Segundo Cabral, nem mesmo as bases de dados usadas para estimar a altimetria (a altura do terreno acima do nível do mar) e a batimetria (o perfil do fundo oceânico), dois dados que precisam ser combinados para informar a elevação da lâmina d’água e o risco de inundação, conversam entre si. Há um erro sistemático nas medições que os pesquisadores não conseguem nem mesmo estimar.
Cabral e seu aluno Vítor Zanetti usaram, então, as projeções de nível do mar do IPCC para estimar risco de alagamento e ressacas em Santos e no Rio de Janeiro. Um outro grupo, da USP, estimou o impacto nos portos e as medidas de adaptação necessárias.
Os resultados mostram que quase todos os portos do país precisam já hoje de medidas de adaptação, seja para aumentar a chamada “borda livre”, o espaço seco entre o cais e a água, seja para aumentar o calado por causa de assoreamento. O custo dessas medidas, que inclui a construção de quebra-mares, foi calculado em R$ 7 bilhões – mais do que o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) investiu em portos.
Para Santos e para o Rio, foram mapeadas as zonas em risco alto e muito alto de deslizamento, ressaca e inundação, o que inclui hospitais e a infraestrutura de transporte público, além de estações de tratamento de esgotos. A Linha Vermelha, no Rio, está longe da praia, mas deve alagar com frequência ainda maior devido ao efeito de “barragem” que o mar mais alto exerce sobre os canais que a rodovia cruza. O quadro que emerge nas duas cidades é o de colapso urbano em caso de ressacas e inundações muito graves no futuro. Apenas no Rio, o patrimônio imobiliário sob alto risco foi estimado em R$ 124 bilhões.
“É de se esperar que tomadores de decisão, em seus diversos níveis, tenham conhecimento destes estudos e resultados e possam utilizá-los em abordagens de planejamento de curto, médio e longo prazos”, escreveram os pesquisadores. (Observatório do Clima/ #Envolverde)
* Publicado originalmente no site Observatório do Clima

Fonte: ENVOLVERDE
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Altair Sales Barbosa: Extinção do cerrado ameaça aquíferos, bacias do São Francisco, Amazonas e Paraná; crise hídrica está apenas no começo

publicado em 04 de novembro de 2015 às 12:01
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“O Cerrado está extinto e isso leva ao fim dos rios e dos reservatórios de água”


Uma das maiores autoridades sobre o tema, professor da PUC Goiás diz que destruição 
do bioma é irreversível e que isso compromete o abastecimento potável em todo o País
Elder Dias, no Jornal Opção
Uma ilha ambiental em meio à metrópole está no Campus 2 da Pon­tifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás). É lá o local onde Altair Sales Barbosa idealizou e realizou uma obra que se tornou ponto turístico da capital: o Memorial do Cerrado, eleito em 2008 o local mais bonito de Goiânia e um dos projetos do Instituto do Trópico Subúmido (ITS), dirigido pelo professor.
Foi lá que Altair, um dos mais profundos conhecedores do bioma Cerrado, recebeu a equipe do Jornal Opção. Como professor e pesquisador, tem graduação em Antropologia pela Universidade Católica do Chile e doutorado em Arqueologia Pré-Histórica pelo Museu Nacional de História Natural, em Washington (EUA). Mais do que isso, tem vivência do conhecimento que conduz.
É justamente pela força da ciência que ele dá a notícia que não queria: na prática o Cerrado já está extinto como bioma. E, como reza o dito popular, notícia ruim não vem sozinha, antes de recuperar o fôlego para absorver o impacto de habitar um ecossistema que já não existe, outra afirmação produz perplexidade: a devastação do Cer­rado vai produzir também o desaparecimento dos reservatórios de água, localizados no Cerrado, o que já vem ocorrendo — a crise de a­bastecimento em São Paulo foi só o início do problema.
Os sinais dos tempos indicam já o começo do período sombrio: “Enquanto se es­tá na fartura, você é capaz de re­partir um copo d’água com o ir­mão; mas, no dia da penúria, ninguém repartirá”, sentencia o professor.

“Memorial do Cerrado” – o nome deste espaço de preservação criado pelo sr. aqui no Campus 2 da PUC Goiás, é uma expressão pomposa. Mas, tendo em vista o que vivemos hoje, é algo quase que tristemente profético. O Cerrado está mesmo em vias de extinção?

Para entender isso é preciso primeiramente entender o que é o Cerrado. Dos ambientes recentes do planeta Terra, o Cerrado é o mais antigo. A história recente da Terra começou há 70 milhões de anos, quando a vida foi extinta em mais de 99%. A partir de então, o planeta começou a se refazer novamente. Os primeiros sinais de vida, principalmente de vegetação, que ressurgem na Terra se deram no que hoje constitui o Cerrado.
Por­tanto, vivemos aqui no local onde houve as formas de ambiente mais antigas da história recente do planeta, principalmente se levarmos em consideração as formações vegetais. No mínimo, o Cerrado começou há 65 milhões de anos e se concretizou há 40 milhões de anos.
O Cerrado é um tipo de am­biente em que vários elementos vi­vem intimamente interligados uns aos outros. A vegetação depende do solo, que é oligotrófico [com nível muito baixo de nutrientes]; o solo depende de um tipo de clima especial, que é o tropical subúmido com duas estações, uma seca e outra chuvosa. Vários outros fatores, incluindo o fogo, influenciaram na formação do bioma – o fogo é um elemento extremamente importante porque é ele que quebra a dormência da maioria das plantas com sementes que existem no Cerrado.
Assim, é um ambiente que de­pen­de de vários elementos. Isso significa que já chegou em seu clímax evolutivo. Ou seja, uma vez degradado não vai mais se recuperar na plenitude de sua biodiversidade. Por isso é que falamos que o Cerrado é uma matriz ambiental que já se encontra em vias de extinção.

Por que o sr. é tão taxativo?

Uma comunidade vegetal é medida não por um determinado tipo de planta ou outro, mas, sim, por comunidades e populações de plantas. E já não se encontram mais populações de plantas nativas do Cerrado. Podemos encontrar uma ou outra espécie isolada, mas encontrar essas populações é algo praticamente impossível.
Outra questão: o solo do Cerrado foi degradado por meio da ocupação intensiva. Retiraram a gramínea nativa para a implantação de espécies exóticas, vindas da África e da Austrália. A introdução dessas gramíneas, para o pastoreio, modificou radicalmente a estrutura do solo. Isso significa que naquele solo, já modificado, a maioria das plantas não conseguirá brotar mais.
Como se não bastasse tudo isso, o Cerrado foi incluído na política de ex­pansão econômica brasileira co­mo fronteira de expansão. É uma á­rea fácil de trabalhar, em um planalto, sem grandes modificações geomorfológicas e com estações bem definidas. Junte-se a isso toda a tecnologia que hoje há para correção do solo. É possível tirar a acidez do solo utilizando o calcário; aumentar a fertilidade, usando adubos. Com isso, altera-se a qualidade do solo, mas se afetam os lençóis subterrâneos e, sem a vegetação nativa, a água não pode mais infiltrar na terra.
Onde há pastagens e cultivo, então, o Cerrado está inviabilizado para sempre, é isso?
Onde houve modificação do solo a vegetação do Cerrado não brota mais. O solo do Cerrado é oligotrófico, carente de nutrientes básicos. Quando o agricultor e o pecuarista enriquecem esse solo, melhorando sua qualidade, isso é bom para outros tipos de planta, mas não para as do Cerrado. Por causa disso, não há mais como recuperar o ambiente original, em termos de vegetação e de solo.
Mas o mais importante de tudo isso é que as águas que brotam do Cerrado são as mesmas águas que alimentam as grandes bacias do continente sul-americano. É daqui que saem as nascentes da maioria dessas bacias. Esses rios todos nascem de aquíferos. Um aquífero tem sua área de recarga e sua área de descarga. Ao local onde ele brota, formando uma nascente, chamamos de área de descarga. Como ele se recarrega? Nas partes planas, com a água das chuvas, que é absorvida pela vegetação nativa do Cerrado.
Essa vegetação tem plantas que ficam com um terço de sua estrutura exposta, acima do solo, e dois terços no subsolo. Isso evidencia um sistema radicular [de raízes] extremamente complexo. Assim, quando a chuva cai, esse sistema radicular absorve a água e alimenta o lençol freático, que vai alimentar o lençol artesiano, que são os aquíferos.
Quando se retira a vegetação na­tiva dos chapadões, trocando-a por outro tipo, alterou-se o ambiente. Ocorre que essa vegetação introduzida – por exemplo, a soja ou o al­go­dão ou qualquer outro tipo de cul­tura para a produção de grãos – tem uma raiz extremamente superficial. Então, quando as chuvas caem, a água não infiltra como deveria. Com o passar dos tempos, o nível dos lençóis vai diminuindo, afetando o nível dos aquíferos, que fica menor a cada ano.

Qual é a consequência imediata desse quadro?

Em média, dez pequenos rios do Cerrado desaparecem a cada ano. Esses riozinhos são alimentadores de rios maiores, que, por causa disso, também têm sua vazão diminuída e não alimentam reservatórios e outros rios, de que são afluentes.
Assim, o rio que forma a bacia também vê seu volume diminuindo, já que não é abastecido de forma suficiente. Com o passar do tempo, as águas vão desaparecendo da área do Cerrado. A água, então, é outro elemento importante do bioma que vai se extinguindo.
Hoje, usa-se ainda a agricultura irrigada porque há uma pequena reserva nos aquíferos. Mas, daqui a cinco anos, não haverá mais essa pequena reserva. Estamos colhendo os frutos da ocupação desenfreada que o agronegócio impôs ao Cerrado a partir dos anos 1970: entraram nas áreas de recarga dos aquíferos e, quando vêm as chuvas, as águas não conseguem infiltrar como antes e, como consequência, o nível desses aquíferos vai caindo a cada ano.
Vai chegar um tempo, não muito distante, em que não haverá mais água para alimentar os rios. Então, esses rios vão desaparecer.
Por isso, falamos que o Cerrado é um ambiente em extinção: não existem mais comunidades vegetais de formas intactas; não existem mais comunidades de animais – grande parte da fauna já foi extinta ou está em processo de extinção; os insetos e animais polinizadores já foram, na maioria, extintos também; por consequência, as plantas não dão mais frutos por não serem polinizadas, o que as leva à extinção também. Por fim, a água, fator primordial para o equilíbrio de todo esse ecossistema, está em menor quantidade a cada ano.

Como é a situação desses aquíferos atualmente?

Há três grandes aquíferos na região do Cerrado: o Bambuí, que se formou de 1 bilhão de anos a 800 milhões de anos antes do momento presente; os outros dois são divisões do Aquífero Guarani, que está associado ao Arenito Botucatu e ao Arenito Bauru que começou a se formar há 70 milhões de anos.
O Guarani alimenta toda a Bacia do Rio Paraná: a maior parte dos rios de São Paulo, de Mato Grosso, de Mato Grosso do Sul – incluindo o Pantanal Mato-Grossense – e grande parte dos rios de Goiás que correm para o Paranaíba, como o Meia Ponte. Toda essa bacia depende do Aquífero Guarani, que já chegou em seu nível de base e está alimentando insuficientemente os rios que dependem dele. Por isso, os rios da Bacia do Paraná diminuem sua vazão a cada ano que passa.

Então, podemos ter nisso a explicação para a crise da água em São Paulo?

Exato. Como medida de urgência, já estão perfurando o Arenito Bauru – que é mais profundo que o Botucatu, já insuficiente –, tentando retirar pequenas reservas de água para alimentar o sistema Cantareira [o mais afetado pela escassez e que abastece a capital paulista]. Mesmo se chover em grande quantidade, isso não será suficiente para que os rios juntem água suficiente para esse reservatório.
Assim como ocorre no Can­tareira, outros reservatórios espalhados pela região do Cerrado – Sobradinho, Serra da Mesa e outros – vão passar pelo mesmo problema. Isso porque o processo de sedimentação no fundo do lago de um reservatório é um processo lento. Os sedimentos vão formando argila, que é uma rocha impermeável. Então, a água daquele lago não vai alimentar os aquíferos. Mesmo tendo muita quantidade de água superficial, ela não consegue penetrar no solo para alimentar os aquíferos. Se não for usada no consumo, ela vai simplesmente evaporar e vai cair em outro lugar, levada pelas correntes aéreas. Isso é outro motivo pelo qual os aquíferos não conseguem recuperar seu nível, porque não recebem água.

Geologicamente sendo o mais antigo, seria natural que o Cerrado fosse o primeiro bioma a desaparecer. Mas isso em escala geológica, de milhões de anos. Mas, pelo que o sr. diz, a antropização [ação humana no ambiente] multiplicou em muitíssimas vezes esse processo de extinção.
Sim. Até meados dos anos 1950, tínhamos o Cerrado praticamente intacto no Centro-Oeste brasileiro. Desde então, com a implantação de infraestrutura viária básica, com a construção de grandes cidades, como Brasília, criou-se um conjunto que modificou radicalmente o ambiente. A partir de 1970, quando as grandes multinacionais da agroindústria se apossaram dos ambientes do Cerrado para grandes monoculturas, aí começa o processo de finalização desse bioma. Ou seja, o homem sendo responsável pelo fim desse ambiente que é precioso para a história do planeta Terra.

Em que o Cerrado é tão precioso?

De todas as formas de vegetação que existem, o Cerrado é a que mais limpa a atmosfera. Isso ocorre porque ele se alimenta basicamente do gás carbônico que está no ar, porque seu solo é oligotrófico.
Diz-se que o Cerrado é o contrário da Amazônia: uma floresta invertida, em confirmação à definição que o sr. deu sobre o fato de dois terços de cada planta do Cerrado estarem debaixo da terra. Ou seja, a destruição do Cerrado é muito mais séria do que alcança a nossa visão com o avanço da fronteira agrícola. É uma devastação muito maior, porque também ocorre longe dos olhos, subterrânea.
Isso faz sentido, porque, na parte subterrânea, além do sequestro de carbono está armazenada a água, sem a qual não prospera nenhuma atividade econômica. A Amazônia terminou de ser formada há apenas 3 mil anos, um processo que começou há 11 mil anos, com o fim da glaciação no Hemisfério Norte. A configuração que tem hoje existe na plenitude só há 3 mil anos. A Mata Atlântica tem 7 mil anos. São ambientes que, se degradados, é possível recuperá-los, porque são novos, estão em formação ainda.
Já com o Cerrado isso é impossível, porque suas árvores já atingiram alto grau de especialização. Tanto que o processo de quebra da dormência de determinadas sementes é extremamente sofisticado. Uma semente de araticum, por exemplo, só pode ter sua dormência quebrada no intestino delgado de um canídeo nativo do Cerrado – um lobo guará, uma raposa. Como esses animais estão em extinção, fica cada vez mais difícil quebrar a dormência de um araticum, que é uma anonácea [família de plantas que inclui também a graviola e a ata (fruta-do-conde), entre outras].
As abelhas europeias e africanas são recentes, foram introduzidas no século passado. O professor Warwick Kerr, que introduziu a abelha africana no Brasil, na década de 1950, ainda é vivo e atua na Universidade Federal de Uber­lândia (UFU). São boas produtoras de mel, mas não estão adaptadas para fazer a polinização das plantas do Cerrado. As abelhas nativas do Cerrado, que não tem ferrão e são chamadas de meliponinas – jataí, mandaçaia, uruçu – eram os maiores agentes polinizadores naturais, juntamente com os insetos, em função de sua anatomia. Hoje estão praticamente extintas, como esses insetos, pelo uso de herbicidas e outros tipos de veneno, que combatiam pragas de vegetações exóticas em lavouras e pastagens. Quando se utiliza o pesticida para extinguir essas pragas também se mata o inseto nativo, que é polinizador das plantas do Cerrado. Por isso, se encontram muitas plantas nativas sem fruto, por não terem sido polinizadas.

A flora do Cerrado é geralmente desprezada. O que ela representa, de fato?
Nós vivemos em meio à mais diversificada flora do planeta. O Cerrado contém a maior biodiversidade florística. Isso não está na Amazônia, nem na Mata Atlântica, nem em uma savana africana ou em uma savana australiana. Nem qualquer outro ambiente da Terra. São 12.365 plantas catalogadas no Cerrado. Só as que conhecemos. A cada expedição que fazemos, cada vez que vamos a campo, pelo menos 50 novas espécies são descobertas. Dessas 12.365 plantas conhecidas, somos capazes de multiplicar em viveiro apenas 180. Isso é cerca de 1,5% do total, quase nada em relação a esse universo. E só conseguimos fazer mudas de plantas arbóreas.
Para as demais, que são extremamente importantes para o equilíbrio ecológico, para o sequestro de carbono e para a captação de água, não temos tecnologia para fazer mudas. Por exemplo, o capim-barba-de-bode, a canela-de-ema, a arnica, o tucum-rasteiro, esses dois últimos com raízes extremamente complexas. Se tirarmos um tucum-rasteiro, que está no máximo 40 centímetros acima do nível do solo, e olharmos seu tronco, vamos encontrar milhares ou até milhões de raízes grudados naquele tronco. Se tirarmos um pedaço pequeno dessas raízes e levarmos ao microscópio, veremos centenas de radículas que saem delas. Uma pequena plantinha com um sistema radicular extremamente complexo, que retém a água e alimenta os diversos ambientes do Cerrado. É algo que não se consegue reproduzir em viveiro, porque não há tecnologia. O que conseguimos é em relação a algumas plantas arbóreas.
Outro aspecto que indica que o Cerrado já entrou em vias de extinção é que as plantas do Cerrado são de crescimento muito lento. Uma canela-de-ema atinge a idade adulta com mil anos de idade. O capim-barba-de-bode fica adulto com 600 anos. Um buriti atinge 30 metros de altura com 500 anos. Nossas veredas – que existiam em abundância até pouco tempo – eram compostas de plantas “nenês” quando Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil, estavam nascendo naquela época e sua planta mais comum, o buriti, está hoje com 25 metros, 30 metros.

Mas a tecnologia e a biotecnologia não fornecem nenhuma alternativa para mudar esse quadro?

Para se ter ideia da complexidade, vamos tomar o caso do buriti, que só pode ser plantado em uma lama turfosa, cheia de turfa, com muita umidade. Se o solo estiver seco, o buriti não vai vingar ali.
Mas, mesmo se conseguíssemos plantar – o que é difícil, porque não existe mais o solo apropriado –, aquele buriti só atingiria a idade adulta e dar frutos depois de muitos séculos. Então, não tem como tentar dizer que se pode usar técnicas para revitalizar o Cerrado. Isso é praticamente impossível.
A interface do Cerrado, para falar em uma linguagem moderna, não é amigável para o uso da tecnologia conhecida. Não tem como acelerar o crescimento de um buriti como se faz com a soja.
Não dá para fazer isso, até porque as plantas do Cerrado convivem com uma porção de outros elementos que, para outras plantas, seriam nocivos. Por exemplo, certos fungos convivem em simbiose com espécies do Cerrado. Um simples fungo pode impedir a biotecnologia. Seria possível desenvolver, por meio de tecidos, tal planta em laboratório. Mas sem aquele fungo a planta não sobrevive. E com o fungo, mas em laboratório, ela também não se desenvolve. Ou seja, é algo extremamente complicado, mais do que podemos imaginar.

Mesmo que os mais pragmáticos menosprezem a importância de um determinado animal ou uma “plantinha” em relação a uma obra portentosa, como uma hidrelétrica, há algo que está sob ameaça com o fim do Cerrado, como a água. Isso é algo básico para todos. A contradição é que o Cerrado – assim como a caatinga e os pampas – não são ainda patrimônio nacional, ao contrário da Mata Atlântica, o Pantanal e a Amazônia. Há uma lei, a PEC 115/95 [proposta de emenda constitucional], de autoria do então deputado Pedro Wilson (PT-GO), que pede essa isonomia há quase 20 anos. Essa lei ajudaria alguma coisa?

Na prática, não poderia ajudar mais em nada, porque o que tinha de ser ocupado do Cerrado já foi. O bioma já chegou em seu limiar máximo de ocupação. Mas o governo brasileiro é tão maquiavélico e inteligente que, para evitar maiores discussões, no ano passado redesenhou todo o mapa ambiental brasileiro. Dessa forma, separou o Pantanal do Cerrado – embora o primeiro seja um subsistema do segundo –, transformou-o em patrimônio nacional e a área do Cerrado já ocupada foi ignorada e incluída no plano de desenvolvimento como área de expansão da fronteira agrícola. Ou seja, o Cerrado, em sua totalidade, já foi contemplado para não ser protegido.

O que os parques nacionais poderiam agregar em uma política de subsistência do Cerrado?

Existe um manejo inadequado dos parques existentes na região do Cerrado. Esse manejo começa com o fogo, quando se cria uma brigada para evitar incêndios no Parque Nacional das Emas, por exemplo. O fogo natural é importante para a preservação do Cerrado. Ora, se se trabalha com o intuito de preservar o Cerrado é preciso conviver com o fogo; agora, se se trabalha com a visão do agrônomo, o fogo é prejudicial, porque acentua o oligotrofismo do solo. O Cerrado precisa desse solo oligotrófico, mas, se o fogo é eliminado, as condições do solo serão alteradas e a planta nativa vai deixar de existir, porque o solo vai adquirir uma melhoria e aquela planta precisa de um solo pobre. Assim, quando se barra o uso do fogo em um parque de Cerrado, o trabalho se dá não com a noção de preservação do ambiente, mas dentro da visão da agricultura. Raciocina-se como agrônomo, não como biólogo.
Outra questão nos parques é que o entorno dos parques já foi tomado por vegetações exóticas. Entre essas vegetações existe o brachiaria, que é uma gramínea extremamente invasora que, à medida que espalha suas sementes, alcança até as áreas dos parques, tomando o lugar das gramíneas nativas. No Parque Nacional das Emas já temos gramínea que não é nativa, o que faz com que haja também vegetação arbórea, de porte maior, também não nativa. Os animais, em função do isolamento do parque, não têm mais contato com áreas naturais, como os barreiros, que forneceriam a eles cálcio e sais naturais. Quando encontramos um osso de animal morto em um parque vemos que está sem calcificação completa, porque falta esse elemento, que é obtido lambendo cinzas queimadas ou visitando os barreiros, que são salinas naturais em que existe esse o elemento. Geralmente há poucos barreiros nos parques, o que torna mais difícil a sobrevivência do animal, que acaba entrando em vias de extinção, o que está acontecendo.
Não há, em nenhum parque nacional criado, aumento da vegetação nativa ou da fauna nativa. O que há é a diminuição dos caracteres nativos daquela vegetação, bem como da fauna. Isso prova que esse isolamento não trouxe benefícios. O que poderia funcionar seria se essas áreas de preservação estivessem interligadas por meio de corredores de migração faunística. Isso evitaria uma série de erros cometidos quando se delimita uma área.

Mas, pelo que o sr. diz, hoje isso seria impossível.

Praticamente impossível, por­que as matas ciliares, que de­ve­riam servir como corredores ecológicos, de migração, foram totalmente degradadas. A maioria dos rios foi ocupada, em suas margens, por ambientes urbanos, com a presença do homem, que é um elemento extremamente predatório. Mais que isso: os sistemas agrícolas implantados chegam, em alguns locais, até a margem de córregos e rios, impedindo, também, a existência desses corredores de migração.
Fica, assim, um cenário praticamente inviável. É triste falar isso , mas, na realidade, falamos baseados em dados científicos, no que observamos. Sou o amante número um do Cerrado. Gostaria que ele existisse durante milhões e milhões de anos ainda, mas infelizmente não é isso que vemos acontecer. Se, por exemplo, você observar as nascentes dos grandes rios, verá que elas ou estão secando ou estão migrando cada vez mais para áreas mais baixas. Quando isso ocorre, é sinal de que o lençol que abastece essa nascente está rebaixando.
Observe, por exemplo, o caso das nascentes do Rio São Francis­co, na Serra da Canastra; o caso das nascentes do Rio Araguaia ou do Rio Tocantins, que tem o Rio Uru em sua cabeceira mais alta. A cada dia que passa as nascentes vão descendo mais. Vai ocorrer o dia em que chegarão ao nível de base do lençol que as abastece e desaparecerão.

Ao mesmo tempo em que o­cor­re esse fenômeno, temos um au­mento rápido do consumo de água.
Há o aumento da população. Mas, além do mais, o Cerrado entrou, nos últimos anos, por um processo extremamente complicado, que chamamos de desterritorialização. O grande capital chegou às áreas do Cerrado e expulsou os posseiros que lá moravam, por meio da falsificação de documentos, da negociata com cartórios e com políticos. Com a grilagem, adquiriu milhares de hectares e tirou os moradores antigos da região. Isso desestruturou comunidades inteiras.

Isso ainda ocorre em Goiás e em diversos lugares?
Ocorreu e está ocorrendo. E o que isso provoca? O aumento das cidades. Quase não há mais cidadezinhas na região do Cerrado, elas são de médio ou grande porte, porque a população do campo, desamparada e sem terra, veio para a zona urbana. Essas pessoas vêm buscar abrigo na cidade, que oferece a eles algum tipo de serviço. Na cidade, se transformam em outro tipo de categoria social: os sem-teto. Estes vivem aqui e ali, ocupando as áreas mais periféricas da cidade. Vão ocupar planícies de inundação, beiras de córregos, entre outros ambientes desorganizados.
Um homem que vive em um ambiente assim, que nasce, é criado e compartilha dessa desorganização, terá uma mente que tende a ser desorganizada. Ou seja, ao fazer a desterritorialização trabalhamos contra a formação de pessoas sadias. Formamos pessoas transtornadas, mutiladas mentalmente, ocupando as periferias. Não existe plano diretor que dê conta de acompanhar o desenvolvimento das áreas urbanas no Brasil, porque a cada dia chegam novas famílias nessas áreas.
Crescendo em um ambiente desorganizado, sem perspectivas para o futuro, essas pessoas acabam caindo em neuroses para a fuga. A neurose mais comum desse tipo é o uso de drogas. Acabam cometendo o que chamamos de atos ilícitos, mas provocados por uma situação socioeconômica de limitação, vivendo em ambientes precários. Essas pessoas constroem sua vida nesses locais, formam famílias e passam anos ou décadas nesses locais. Só que um dia vem um fenômeno natural qualquer – como El Niño ou La Niña – que, por exemplo, acomete aquele local com uma quantidade muito maior de chuva. Então, o córrego enche e encontra, em sua área de inundação, os barracos daquela população. Aí começa a tragédia urbana, com desabrigados e mortos. Aumenta, ainda mais, o processo de sofrimento no qual estão inseridas essas populações.
Hoje vejo muitos profissionais, principalmente arquitetos, falando em mobilidade urbana. Falam em construir monotrilhos, linhas específicas para ônibus, corredores para bicicletas, mas ninguém toca na ferida: o problema não está ali, mas na desestruturação do homem do campo. Quanto mais se desestrutura o campo, mais pessoas vêm para a cidade, que não consegue absorvê-las, por mais que se implantem linhas novas, estações e bicicletários. O problema está no drama do campo, não na cidade.

Antigamente, se usava a expressão “fixação do homem no campo”. Isso parece que ficou para trás na visão dos governos.

Desistiram porque o que manda é o grande capital. Os bancos estatais se alegram com as safras recordes, fazem propaganda disso. Eles patrocinam os grandes proprietários, só que estes não têm grande quantidade de funcionários, têm uma agricultura intensiva, mecanizada. Isso não ajuda de forma alguma a manter as pessoas na zona rural.

Uma notícia grave é a extinção do Cerrado. Outra, tão ou mais grave, que – pelo que o sr. diz – já pode ser dada, é que em pouco tempo não teremos mais água. A crise da água no Brasil é uma bomba-relógio?
A extinção do Cerrado envolve também a extinção dos grandes mananciais de água do Brasil, porque as grandes bacias hidrográficas “brotam” do Cerrado. O Rio São Francisco é uma consequência do Cerrado: ele nasce em área de Cerrado e é alimentado, em sua margem esquerda, por afluentes do Cerrado: Rio Preto, que nasce em Formosa (GO); Rio Paracatu (MG); Rio Carinhanha, no Oeste da Bahia; Rio Formoso, que nasce no Jalapão (TO) e corre para o São Francisco. Se há a degradação do Cerrado, não há rios para alimentar o São Francisco. Você po­de contar no mínimo dez afluentes por ano desses grandes rios que estão desaparecendo.

Como o sr. analisa a transposição do Rio São Francisco?
É um ato muito mais político do que científico. Ela atende muito mais a interesses políticos de grandes proprietários do Nordeste na área da Caatinga, no sertão nordestino. A transposição está sendo feita em dois canais, um norte, com 750 quilômetros e outro, leste, com pouco mais de 600 quilômetros. A água é sugada da barragem de Sobradinho (BA), através de uma bomba, para abastecer esses canais, com 10 metros de profundidade e largura de 25 metros. Ao fazer essa obra, se altera toda a mecânica do São Francisco: o rio, que corria lento, passa a correr mais rapidamente, porque está tendo sua água sugada. Seus afluentes, então, também passam a seguir mais velozes. Isso acelera o processo de assoreamento e de erosão.
Consequente­mente, aceleram a morte dos afluentes. Fazer a transposição do São Francisco simplesmente é estabelecer uma data para a morte do rio, para seu desaparecimento total. Podem até atender interesses econômicos e sociais de maneira efêmera, em curto prazo, mas em dez anos acabou tudo.

E será um processo rápido, assim?

Sim, é um processo de décadas. Basta ver o Rio Meia Ponte, na altura do Setor Jaó. Onde havia uma bonita cachoeira, na antiga barragem, há só um filete d’água. O nível da água do Meia Ponte é o mesmo do Córrego Botafogo há décadas atrás. Este praticamente não existe mais, a não ser por uma nascente muito rica no Jardim Botânico, que ainda o alimenta. Mas ele só parece mesmo exis­tir quando as chuvas o en­chem rapidamente. Mas, no outro dia, ele vira novamente um filete.

Goiânia foi planejada em função também dos cursos d’água. Tendo em vista o que ocorre hoje, podemos dizer que ela é, então, o cenário de uma tragédia hidrográfica?
Eu não diria que apenas Goiânia está realmente dessa forma. Mas foi toda uma política de ocupação do centro e do interior do Brasil que motivou essa ocupação desordenada, desde a época da Fundação Brasil Central, da Expedição Roncador–Xingu, depois a construção de Goiânia e de Brasília, a divisão de Mato Grosso e a criação do Tocan­tins. Isso é fruto do capital dinâmico que transforma a realidade. Vem uma urbanização rápida de áreas de campo, aumentando as ilhas de calor e, consequentemente, pela pavimentação, impedindo que as águas das chuvas se infiltrem para alimentar os mananciais que deram origem a essas mesmas cidades. Se continuar dessa forma, com esse tipo de desordenamento, podemos prever grandes colapsos sociais e econômicos no Centro-Oeste do Brasil. E não só aqui, mas nas áreas que aqui brotam.

O que significa quase toda a área do Brasil, não?
Sim, até mesmo a Amazônia. O Rio Amazonas é alimentado por três vetores: as águas da Cordilheira dos Andes, que é um sistema de abastecimento extremamente irregular; as águas de sua margem esquerda, principalmente do Solimões, que também é irregular, em que duas estiagens longas podem expor o assoreamento, ilhas de areias – ali foi um deserto até bem pouco tempo, chamado Deserto de Óbidos. Ou seja, o Amazonas é alimentado mesmo pelos rios que nascem no Cerrado, como Teles Pires (São Manuel), Xingu, Tapajós, Madeira, Araguaia, Tocantins. Estes caem quase na foz do Amazonas, mas contribuem com grande parte de seu volume. Ou seja, temos o São Francisco, já drasticamente afetado; o Amazonas, também afetado; e a Bacia do Paraná, afetada quase da mesma forma que o São Francisco, provavelmente com período de vida muito curto.

Será um processo tão rápido assim?
Uma vez que se inicia tal processo de degradação e de diminuição drástica do nível dos lençóis, isso é irreversível. Em alguns casos duram algumas décadas; em outros, até menos do que isso. Temos exemplos clássicos no mundo de transposições de rios que não deram certo e até secaram mares inteiros. No Mar de Aral, no Leste Europeu, há navios ancorados em sal. Sua drenagem é endorreica, fechada, sem saída para o oceano.
A União Soviética, na ânsia de se tornar autossuficiente na produção de algodão, fez a transposição dos dois rios que abasteciam o mar. Resultado: no prazo de uma década, as plantações não vingaram, o mar secou e uma grande quantidade de tempestades de poeira e sal afetam 30 milhões de pessoas, causando doenças respiratórias graves, incluindo o câncer.
Com nossos rios, acontecerá o mesmo processo. A diferença é que o processo de ocupação aqui foi relativamente recente, a partir dos anos 1970. São 40 e poucos anos. Ou seja: em menos de meio século, se devastou um bioma inteiro. Não acabou totalmente porque ainda há um pouco de água. Mas, quando isso acabar, imagine as convulsões sociais que ocorrerão. Enquanto se está na fartura, você é capaz de repartir um copo d’água com o irmão; mas, no dia da penúria, ninguém repartirá. Isso faz parte da natureza do ser humano, que é essencialmente egoísta. Isso está no princípio da evolução da humanidade. A Igreja Católica chama isso de “pecado original”, mas nada mais é do que o egoísmo, apossar-se de determinados bens e impedir que outros usufruam deles. Isso já levou outros povos e raças à extinção. E pode nos levar também à extinção.
Até bem pouco tempo tínhamos duas humanidades: o homem-de-neanderthal, o Homo sapiens neanderthalensis; e o Homo sapiens sapiens. Hoje podemos falar também em duas humanidades: uma humanidade subdesenvolvida, tentando soerguer em meio a um lodo movediço; e outra humanidade, que nada na opulência. A questão é que, se essa situação persistir, brevemente teremos a pós e a sub-humanidade.

É um cenário doloroso.

É doloroso, mas são os dados que a ciência mostra. Tem jeito, tem perspectiva para um futuro melhor? Possivelmente, a saída esteja na pesquisa. Mas uma pesquisa precisa de um longo tempo para que apareçam resultados positivos. E nossas universidades não incentivam a pesquisa, o que é muito triste, porque essa é a essência de uma universidade.

O sr. vê, em algum lugar do mundo, trabalhos e pesquisas pensando em um mundo mais sustentável?
Não. O que existe é muito localizado e incipiente. Não tem grande repercussão. Mas, mesmo se fossem proveitosas, jamais poderiam ser aplicadas ao Cer­rado, que é um ambiente muito peculiar. Teria de haver pesquisa dirigida especialmente para nosso bioma. Como recuperar uma nascente de Cerrado? Eu não sei dizer. Um engenheiro ambiental também não lhe dará resposta. Nenhum cientista brasileiro sabe a resposta, porque não temos pesquisas sobre isso. Talvez poderíamos ter um futuro melhor se houvesse investimentos em pesquisa.

E a educação ocupa que papel nesse contexto sombrio?

Nós, como educadores, deveríamos pensar mais nisso – e eu penso: talvez ainda seja tempo de salvar o que ainda resta, mas se não dermos uma guinada muito violenta não terá como fazer mais nada. É preciso haver real mudança de hábitos e mudar a forma de observar os bens patrimoniais do planeta e da nossa região. A água tinha de ser uma questão de segurança nacional. A vegetação nativa, da mesma forma.
Os bens naturais teriam de ser tratados assim também, porque deles depende o bem-estar das futuras gerações. Mas isso só se consegue com investimento muito alto em educação, mudando mentalidade de educadores. As escolas têm de trabalhar a consciência e não apenas o conhecimento. Uma coisa é conhecer o problema; outra, é ter consciência do problema. A consciência exige um passo a mais. Exige atitude revolucionária e radical. Ou mudamos radicalmente ou plantaremos um futuro cada vez pior para as gerações que virão.

Fonte: VIOMUNDO
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Lula

O alvo é o pescoço do povo brasileiro

O pescoço de Lula está no meio do caminho do parafuso; silenciar diante do percurso da rosca é ser cúmplice do estrangulamento final.

 
por: Saul Leblon

Ricardo Stuckert / Instituto Lula













Quem ainda acha que o cerco de fogo em torno de Lula abrirá uma clareira propícia ao florescimento da ‘esquerda consequente’ no país, flerta com a tragédia da própria extinção.

O pescoço de Lula, a goela de Lula, a voz que ela ecoa, as coisas que diz e, sobretudo, o que esse conjunto simboliza (leia o blog do Emir) representam um obstáculo ao que almeja, de fato, o maquinismo conservador no Brasil.

O que se cobiça é a restauração plena do neoliberalismo na economia e na sociedade.

Para que esse revival se consolide, e nesse processo o PSDB possa concluir o serviço iniciado nos dois governos FHC, é necessário estralar e quebrar os sete ossos que compõem o pescoço do povo brasileiro.

Esse é o verdadeiro e definitivo alvo do garrote vil em movimento na sociedade.

O pescoço de Lula está no meio do caminho do parafuso; silenciar diante do percurso da rosca é ser cúmplice do estrangulamento final.

Não existe meio golpe na história.

A natureza explícita de 1964 revelou-se plenamente no AI-5 de 13 de dezembro de 1968.

Da mesma forma, a seletividade obscena de Moro contra o PT logo ganhará sucessores omnívoros que não pouparão sequer a atual conivência silenciosa em relação a Lula.

O alvo impõe a abrangência da intolerância.

Adernamos em uma transição de ciclo de desenvolvimento, que a restauração conservadora pretende transformar em um aluvião de supremacia  granítica dos interesses dos mercado sobre as urgências da sociedade.

Trata-se, para isso, de reduzir o interesse popular a um frango desossado da Sadia; de retroceder o Brasil pobre ao ponto de ser incapaz de se equilibrar na sarjeta social por onde transitam a fome, o desemprego e o limbo das vidas franqueadas às demandas just in time da casa grande.

Descolar o país de todos os elos constitucionais, políticos e simbólicos que sustentam a solidariedade coletiva é crucial.

Inclua-se aí a derrubada de escoras emancipadoras recentes, históricas ou futuras  --entre estas, a legislação trabalhista de Vargas, a semente de democracia social contida na Constituição Cidadã de 1988, o salário mínimo revigorado de Lula, a aposentadoria dos pobres do campo, o Bolsa Família, o pré-sal...

São esses os objetivos subjacentes à ofensiva buliçosa do conservadorismo.

O tamanho da empreitada requer afastar as pedras do caminho, sendo Lula a peça angular de uma estrutura, cujo deslocamento permitirá demolir o conjunto.

Restarão de pé montes de testemunhos desprovidos de relevância política, exceto evidenciar a dimensão arrasadora do revés.

Quem critica –com razão, como o faz Carta Maior, desde 2005-- a letargia do governo e do PT diante do passo de ganso da Liga dos Golpistas não deve alimentar ilusões.

Vive-se um acelerado assalto ao espaço político da resistência democrática no Brasil.

Com todas as virtudes e defeitos listáveis, Lula é hoje uma espécie de esteio simbólico do solo expandido ao redor dessa voçoroca que avança célere sobre o legado da lenta construção verdadeira democracia social no país.

Decepá-lo a enxadadas de descrédito e suspeição –como tem sido feito--  até arrancá-lo do chão das possibilidades eleitorais, como se uiva explicitamente, é o plano acalentado pela Liga Golpista desde 2005.

Uma década de diuturno labor nessa direção atingiu agora seu ponto de inflexão.

Significa que as ambiguidades e hesitações petistas devam ser poupadas de críticas, avanços e confrontações?

Ao contrário.

A autocrítica e a superação dos erros cometidos é crucial para enfrentar uma encruzilhada de hesitações e escolhas angustiantes.

Mas cada crise tem uma contradição central.

Ignorar essa hierarquia ou ombreá-la em importância às demais costuma ser devastador para a sorte e o destino das grandes maiorias de uma nação.

À dialética dura das transformações históricas não importam as boas intenções avocadas no caminho.

O longo amanhecer de uma sociedade mais justa é um labirinto de contradições, que emperra, arfa, explode, desperdiça energia, cospe, vomita, patina, salta ou retrocede em cada aclive do terreno arestoso da história.

Não regredir nesse ambiente requer, antes de mais nada, a renúncia a qualquer sectarismo para enxergar em meio à neblina, a contradição central do percurso e contra ela unir forças da nação.

A contradição central e objetiva do projeto conservador hoje no Brasil é a existência de uma vasta maioria de milhões de famílias que passaram a desfrutar de emprego, sorver ares de consumo, aspirar à cidadania plena, nutrir esperança em si mesmas e manifestar confiança no horizonte da nação, após 12 anos de governos progressistas.

Juntas, elas formam uma espécie de pré-sal de possibilidades emancipadoras, cuja espinha de discernimento precisa ser vergada para que volte a se arrastar de cabeça baixa, deformada pela tragédia, conformada em não pertencer a lugar nenhum, e tampouco dispor de qualquer voz, organização ou liderança que fale por ela.

A existência de Lula atrapalha o primeiro estirão desse assalto.

Se lograr êxito em esmigalhar seu pescoço, desfrutando do silêncio obsequioso de um pedaço da esquerda e de lideranças sociais, rapidamente o garrote conservador fechará seus anéis sobre o que restar do campo progressista para, ato contínuo, asfixiar o que de fato importa: a respiração social do povo brasileiro. A ver.

Luiz Inácio Lula do Brasil

           

Lula se projetou como o líder popular mais importante no mundo, cujo som do nome passou a remeter a justiça social, a dignidade, a um mundo mais humano.


por Emir Sader em 01/11/2015 às 08:48      

 
Emir Sader
Há pessoas cuja biografia – segundo Hegel – são histórias particulares, das suas vidas privadas. Há outras que, por estarem no olho do furacão, suas biografias são cósmicas, refletem os grandes dramas e aventuras de cada período histórico.

O filme sobre o Lula reflete sua historia particular, de maneira tocante, mas é, ao mesmo tempo, a história de milhões de brasileiros – uns sobreviveram, outros não -, afetados pela seca do nordeste, atraídos pelas promessas do sul, que protagonizaram a construção industrial do país. Lula sobreviveu a tudo, mas soube alçar-se a níveis que o elevaram a ser a melhor expressão do Brasil da sua e da nossa época.

Líder sindical na resistência à ditadura, conduziu o movimento sindical à ruptura de um dos pilares da ditadura – o arrocho salarial. Projetou a luta de massas dos trabalhadores a uma saga nacional, vitoriosa, que abriu o caminho para o fim da ditadura e a retomada da democracia.

Dirigente político, Lula conduziu a fundação do PT, um partido que apontou novos horizontes para o Brasil – não apenas a retomada da democracia, mas a justiça social. Foi candidato a presidente, até que foi eleito presidente, numa trajetória espetacular a que nos acostumamos, mas que condensa todos os dramas, os dilemas e o potencial do Brasil contemporâneo.

Lula passou também a representar o que o Brasil precisa e pode ser. De país da miséria, da violência, da ditadura, do neoliberalismo, passou a ser o pais da esperança, de que os brasileiros passaram a se orgulhar.

Lula projeto o Brasil no mundo como p pais símbolo do sucesso na luta contra a fome. Aquele objetivo mínimo que ele se havia proposto no começo – que todos os brasileiros comessem tres vezes ao dia – expandiu-se para que todos os brasileiros tenham direito à vida e à esperança.

Lula se projetou como o líder popular mais importante no mundo, mais universal, cujo som do nome passou a remeter a justiça social, a dignidade, a um mundo melhor e mais humano. Sua imagem correu o mundo – depois de ter corrido tanto perigo – e provou que um líder de origem popular é quem melhor sente e resolve os problemas das grandes maiorias.

Lula tornou-se o símbolo maior da nossa história, das lutas seculares do Brasil, do sofrimento e da capacidade de superação de milhões de brasileiros. Projetam-se nele a esperança e a confiança dos milhões de brasileiros que viram reconhecidos seus direitos e sabem que suas vidas mudaram radicalmente para melhor graças às politicas do governo Lula.

Por isso Lula é objeto do amor de milhões e do ódio de milhares. Por boas razões, o amam por um lado e o odeiam por outro. Porque ninguém fez tanto bem pro povo e tanto mal pras elites conservadoras. Ninguém deu tanta esperança ao povo e ninguém fechou os caminhos da direita reacionária.

Lula representa o Brasil que dá certo, o Brasil da esperança, da auto estima, do progresso com justiça social, do crescimento com distribuição de renda. Lula representa para o mundo o país que superou a fome a saiu do mapa da miséria. E representa, para as elites tradicionais, a ameaça de que nunca mais vão poder fazer o que bem entendem deste país.

Nunca mais vão poder impor uma ditadura, quando perdem o controle do país. Nunca mais vão poder destruir a democracia e impor o arrocho sobre os trabalhadores. Nunca mais vão poder destruir os direitos dos trabalhadores e a propriedade pública, no altar do mercado e da privatização.

Daí o desespero da direita, da mídia conservadora, dos partidos das elites, dos que sentem que o país tornou-se um país de todos e não somente deles. Toda a energia lhes resta é canalizada para atacar Lula, na expectativa de gerar rejeições que lhe impossibilitem voltar a governar o Brasil. Mas fracassam, porque o caráter e a trajetória do Lula não foram construídos artificialmente pela mídia, mas foram feitos de suor e de sangue, de dignidade e de luta, resistem a tudo e a todos.

Luiz Inácio Lula do Brasil – esse é o teu nome, Lula.

Fonte: CARTA MAIOR
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A estratégia bizarra de atacar a família do Lula

Com o impeachment de Dilma cada vez mais difícil de acontecer, o conservadorismo se volta para atacar Lula, na tentativa de limitar o ciclo progressista a 16 anos, impedindo a vitória do ex-presidente em 2018; a estratégia medieval parece ser atacar sua família primeiro, para preparar o terreno para a prisão dele
Foto: Agência Brasil
Foto: Agência Brasil
Após 38 anos de predomínio do conservadorismo (1964-2002), o progressismo brasileiro caminha para completar 16 anos no governo federal, já que a possibilidade de impeachment de Dilma está cada vez mais difícil de se realizar. Apesar de 2015 ser um ano complicado economicamente, os 13 anos de progressismo revolucionaram a pirâmide das classes sociais, acabando com a fome e colocando o Brasil a meio caminho de se tornar um país de classe média. A perspectiva de Lula se eleger em 2018 elevaria para 20 anos seguidos a permanência do progressismo no governo federal, com possibilidade de reeleição em 2022, o que levaria essa permanência a 24 anos. Neste tempo, o Brasil talvez chegue a ser um país de classe média. Infelizmente, o conservadorismo brasileiro quer que o Brasil continue sendo um país pobre, “pois esse é seu lugar”. Assim, atacar Lula e impedi-lo de ser candidato em 2018 é a estratégia lógica para o conservadorismo neste momento.
Dado que Lula é um dos maiores líderes mundiais da atualidade e caminha para se tornar (se é que já não é) o maior líder político da história do Brasil, a questão de como impedir sua candidatura em 2018 é um desafio para o conservadorismo. Apenas reduzir sua popularidade não parece ser suficiente para impedir sua vitória em 2018. Acusá-lo de algo não bastaria. Tudo indica que a única forma realmente “segura” de impedir sua vitória seria garantir alguma condenação judicial contra ele. Assim, Lula pode acabar na prisão, como já está José Dirceu. Aliás, mesmo sem condenação judicial também é possível que Lula seja preso, como mostra a experiência recente (e nem tão recente).
Então, a questão para o conservadorismo (por incrível que pareça) é: “como prender Lula ou condená-lo judicialmente?” Uma prisão provisória de Lula, se seguida de um habeas corpus, é algo arriscado demais para o conservadorismo. Para não ser desmoralizante para a estratégia anti-Lula, ele teria que permanecer preso por um tempo, para que se forme no inconsciente das pessoas aquela ideia de que “se está preso, é porque deve ter cometido algum crime”. Mas como garantir que o STF não emita rapidamente um habeas corpus a Lula? É aí que entraria a família do Lula. Para o conservadorismo conseguir que Lula seja preso, facilitaria muito que algum de seus familiares, por exemplo, um filho seu, já estivesse preso. Ou seja, imaginem que um filho de Lula, mesmo através de uma prisão provisória, esteja preso por meses. Estará preparado o terreno para uma eventual prisão provisória de Lula, ou pelo menos uma virulenta acusação judicial, com busca e apreensão em sua casa, etc. O conservadorismo precisa, para evitar a candidatura de Lula, de alguma condenação em tribunal colegiado, e depois tentar a todo custo que o STF não reverta essa condenação a tempo dele disputar as eleições presidenciais.
A questão é que se o conservadorismo continuar nesse rumo horroroso, ele pode diminuir de tamanho. Ou seja, muita gente que hoje em dia vota em candidatos conservadores, ou que dá algo de credibilidade a meios de comunicação conservadores, pode parar de fazê-lo. Assim, quem faz parte do conservadorismo pode simplesmente sair do conservadorismo e vir para o progressismo. Hoje em dia, é inegável que o conservadorismo de direita e de esquerda têm como característica marcante o ódio alucinado ao PT. Portanto, para ser progressista, você não precisa ser petista; é só não ser antipetista. Vem com a gente construir um país de classe média, rumo ao futuro!

Fonte: CULTURA POLÍTICA
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sábado, 31 de outubro de 2015

Crise e Retrocesso

O sonho europeu de voltar ao passado

Vale a pena recordar que, até a crise financeira de 2008, a xenofobia e os partidos de direita radical eram entidades marginais em quase toda a Europa.


Roberto Savio*  
Imigrantes europeus nos Estados Unidos
As recentes eleições na Suíça e na Polônia são bons indicadores do que vai ocorrer em outros países da Europa devido à crescente e imparável onda de refugiados. Vamos situar os acontecimentos num contexto mais vasto, mas primeiro é necessário fazer algumas considerações cruciais, sobre as quais existe um consenso cada vez maior.

A primeira é que o sistema atual de relações internacionais e governança nacional deixou de funcionar. Estamos vivendo um período de transição, mas ninguém sabe aonde ele vai dar. A esquerda não tem um manifesto e a direita apenas cavalga no status quo. Não há um pensamento político a longo prazo.

A segunda é que se vive numa época de “nova economia”, baseada na supremacia das finanças sobre a produção. Funcionários não eleitos governando os bancos centrais e os banqueiros, que com isso têm muito mais poder que antes.

Essa “nova economia” considera os empregos precários uma realidade legítima, a desigualdade social natural, o mercado como a base exclusiva para o desenvolvimento da sociedade, e estima que o Estado é ineficiente e um freio permanente para o setor privado.

A terceira é que as instituições políticas vêm sendo ofuscadas. Nenhum partido conta mais com um movimento juvenil. São vistos cada vez mais como parte do sistema de poder, forças fisiológicas que consideram os cidadãos como mero eleitorado, e não mais porta-vozes da cidadania.

As cifras da política (e da corrupção) estão crescendo ano após ano. As próximas eleições norte-americanas custarão mais de 4 bilhões de dólares e até agora apenas 145 doadores já pagaram mais de 50% da campanha eleitoral.

Segundo a Escola de Economia de Londres, o custo de uma campanha eleitoral na Europa aumentou 47% na última década. Em outras palavras, muitos consideram que vivemos agora numa democracia que está se tornando uma plutocracia. A Hungria está defendendo abertamente uma democracia autocrática, ao estilo de Cingapura e da China, e está tendo sucesso com essa proposta.

A quarta consideração é que o multilateralismo está em crise. Os Estados Unidos deixaram de ratificar todos os tratados internacionais, começando pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Crianças e pelo Direito Marítimo. As Nações Unidas foram marginalizadas. As organizações regionais, como a União Africana, ou a Organização dos Estados Americanos, se tornaram notoriamente ineficazes.

A União Europeia está saindo de uma crise existencial do euro (a questão da Grécia) para entrar em uma ainda mais grave, a dos refugiados. O Reino Unido está liderando uma ofensiva contra Bruxelas para a restituição de poderes, o que criará um precedente que outros invocarão, começando por Hungria e Polônia.

Se essas considerações, entre muitas outras, forem consideradas válidas, então não é difícil entender porque os eleitores europeus estão votando com base na nostalgia política e na falta de segurança. Devido a um futuro incerto, o sonho de voltar a um melhor passado se fortalece.

As eleições suíças e polonesas premiaram os partidos que anunciaram que defenderão a identidade nacional contra os estrangeiros, especialmente os muçulmanos. As tradições religiosas nacionais contra os valores europeus de liberdade sexual, o casamento homossexual, o aborto livre e os estilos de vida decadentes.

O caso da Polônia é emblemático. O país tem sido um dos maiores beneficiados pela ajuda da União Europeia – o leste europeu quis ingressar ao bloco para conseguir fundos e apoio, mas sem nenhuma intenção de dar algo em troca, como vemos na negativa de aceitar os imigrantes agora.

Vale a pena recordar que, até a crise financeira de 2008, a xenofobia e os partidos de direita radical eram entidades marginais em quase toda a Europa.

Em pouco tempo, os outrora marginais ganharam espaço, inclusive em países conhecidos por seu sentido cívico e tolerância, como a Holanda e os países nórdicos.

É desconcertante ver trabalhadores e pessoas de baixa renda votarem pela Frente Nacional na França, pelo Cinquestelle na Itália, pelo UKIP no Reino Unido, e agora pelo Paz e Justiça na Polônia.

O sonho de voltar a um passado seguro e ordenado é o que os leva a votar num partido xenófobo, de direita radical e antieuropeu.

Não que queiram votar por um futuro incerto: para eles é mais tranquilizador votar por uma época durante a qual a política era nacional, não havia uma burocracia sem rosto em Bruxelas indicando como empacotar tomates, não havia o euro – uma moeda supranacional, manobrada em Frankfurt por banqueiros poderosos do BCE –, não havia uma Alemanha hegemônica ditando instruções aos outros países.

Também vale a pena recordar que grande parte dos cidadãos europeus ainda não recuperaram a qualidade de vida que tinham antes de 2007. Os jovens pagam um custo desproporcional por uma crise provocada pelo setor financeiro, que foi resgatado com uma quantidade de recursos muito maior que a destinada para as políticas de emprego ou para a recuperação social.

O sonho de voltar ao passado também foi o motivo da criação do Tea Party nos Estados Unidos – criado pela ala radical do Partido Republicano – e da vitória de Justin Trudeau no Canadá. As diferenças entre Estados Unidos e Canadá foram claramente reduzidas pelo primeiro-ministro Stephen Harper, que acaba de deixar o cargo. Os canadenses quiseram voltar aos bons tempos de Pierre Trudeau, elegendo o seu filho Justin nas eleições federais de 19 de outubro.

Enquanto o Ocidente pode sonhar com uma idade de ouro recente, no Sul do mundo, o nacionalismo, irmão gêmeo da nostalgia política, está aumentando – especialmente no caso dos países com um passado glorioso, e me refiro não só ao Japão de Shinz%u04D Abe e à China de Xi Jinping, mas também à Índia, à Tailândia e ao Sri Lanka.

Se apresenta, assim, um problema para o Ocidente. Atualmente, existem 60 milhões de refugiados, sem considerar neste número os que enfrentam perseguições sexuais, como os gays na África, ou as mulheres que enfrentam o Boko Haram na Nigéria. Tampouco estão contabilizados os que estão obrigados a escapar das mudanças climáticas – que, segundo a ONU, serão outros 15 milhões até o ano de 2025 –, que devem ser somados aos que lutam contra a fome e contra as ditaduras.

O termo “migrantes” é muito mais representativo da realidade que a palavra “refugiados”, que são, para a Europa, somente os que fogem de conflitos claramente reconhecidos. E o Ocidente está por trás de muitos desses conflitos. Se calcula que desde que a Rússia começou a intervir na Síria, deve haver uns 150 mil sírios refugiados da guerra, aumentando o êxodo que já existia.

A expansão demográfica é clara. A África terá um bilhão de habitantes em 2030, enquanto a Europa vai perder ao menos 15 milhões este ano. A Europa que conhecemos, homogênea, branca, cristã e tolerante vai desaparecer. Isso, inevitavelmente, vai requerer uma boa dose de sofrimento.

Os Estados Unidos vai se transformar num país multicultural e multiétnico em pouco mais de cem anos. De acordo com os registros da ilha de Ellis, o ponto de entrada de imigrantes mais importante do país, nove milhões de irlandeses, alemães, austríacos e escandinavos entraram no país nos tempos do barco a vapor, além de outros oito milhões de poloneses, búlgaros, romenos, húngaros, russos e bálticos, e mais uns cinco milhões de italianos e gregos.

Em poucas décadas, um total de 22,5 milhões de europeus se tornaram norte-americanos. A Europa não está preparada para abrigar nem mesmo um décimo disso.

* Jornalista ítalo-argentino, cofundador e ex-diretor-geral da Inter Press Service (IPS). Nos últimos anos, também fundou Other News, um serviço que difunde “informação que os mercados eliminam”.

Tradução: Victor Farinelli
 
Fonte: CARTA MAIOR
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A Dolorosa Queda de um Império - Malandragem Verborrágica

The Voice é um show de calouros que tem a ver com tudo, menos com vozes.
Por Kiko Nogueira
Postado em
31 out 2015

O calouro
Às vezes, fazer algo muito romântico não tem a pegada do que as pessoas querem em um programa de calouro”, falou o candidato Matteus Brunetti no The Voice

O The Voice não apenas é uma versão mais rica do que os concursos do Raul Gil ou do Chacrinha, como não tem nada a ver com voz. É um reality show ordinário em que todos soam exatamente iguais, seja interpretando samba, pagode, rock ou baião.
Em nome de um suposto favorecimento dos atributos vocais sobre os físicos, o juri fica de costas para o cidadão — como se já não tivesse havido uma triagem anterior.
Gente que alimenta o desejo de ficar famosa ou algo que o valha se submete aos argumentos dos quatro “especialistas”, que prometem fazer da pessoa uma estrela. Ninguém parece notar: “Opa, aquele ali é o Michel Teló, que fez um hit na vida, uma besteira cujo nome já foi esquecido. Vou nessa. Ele vai me transformar no novo Michel Teló”.
Nos bastidores, o pegajoso Tiago Leifert promove uma apelação aos instintos mais baixos com pais, mães, namorados e amantes chorando e contando como o cara cantava em Cachaceiro do Itacurumi, a galera aplaudia e alguém falou que ele era tão bom quanto Alcione e que precisava tentar uma chance e lágrimas, eu sempre acreditei nele etc etc.
A música brasileira não merecia esse espancamento. Qualquer sinal de originalidade é sufocado no berço. O primeiro colocado ganha 500 mil reais, um carro zero, contrato de gravação e “gerenciamento de carreira” com a Universal. As carreiras foram tão bem gerenciadas que os ganhadores das três edições anteriores continuam desconhecidos.
Os únicos que se saem bem são os técnicos. Lulu Santos voltou a ter agenda de shows, Cláudia Leitte virou nome de perfume, Carlinhos Brown saiu do limbo e Michel Teló ganhou uma sobrevida.
Não é só no Brasil. Nas versões do The Voice em todo o mundo, os técnicos levam a melhor sem que consigam lançar um único nome novo no cenário, o que é, em tese, a razão de ser do programa. O The Voice depende da inocência dos calouros que precisam fingir não ser calouros para que todo o mundo fature, menos os calouros.

Fonte: DIÁRIO DO CENTRO DO MUNDO
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Após estreia na Globo do "É de Casa", ibope do SBT cresce 34%


Colunas - Ricardo Feltrin
A aposta da Globo em acabar com a programação infantil aos sábados e substitui-la por um programa verborrágico e de amenidades é provavelmente um dos grandes erros da emissora em 2015.
Desde que o "É de Casa" estreou, em agosto, a Globo só fez ficar em segundo lugar no horário, dando ao SBT a liderança isolada.
Foram 12 confrontos e 12 derrotas consecutivas da Globo para o "Sábado Animado", que inclui a faixa da Disney --contrato assinado pela TV de Silvio Santos com o estúdio norte-americano.
Nos meses anteriores à estreia do "É de Casa", a Globo liderava o ibope das manhãs de sábado com média de 6,5 pontos. O SBT vinha em segundo com 4,9 pontos e a Record, em terceiro, com 4,6.
Após a estreia, porém, o ibope da Globo caiu para 5,9 pontos, o SBT subiu para 6,6 pontos --um crescimento de  34% e a captura do primeiro lugar isolado.
Aliás, mesmo com arrendondamento de casas decimais fica 6,6 (ou melhor, 7) para o SBT e 5,9 (6) para a Globo.
Cada ponto de ibope em SP vale por 67 mil domicílios

Fonte: BOL
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Muita malandragem e  muita esperteza para pouco conteúdo.

O resultado é um sonoro tombo.

Tudo bem que a internete está secando a audiência das emissoras de TV, no entanto, tem emissora, como a globo, que a incompetência de seus diretores acelera o tombo.

Em breve a globo lança o Bozo, tendo um de seus diretores como personagem do palhaço.

Tudo a ver.

E logo a globo que em seus anos de hegemonia chamava o SBT, de Sistema Bozo de TV.

Que o Bozo pode ser uma boa metáfora da tv aberta , isso é fato.

 

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Assim na Bolívia e Venzuela como no Brasil


Os arquivos wikileaks da América Latina

Os EUA levaram muito a sério a possibilidade de um golpe de estado ou assassinato de Evo Morales e treinaram manifestantes anti-chavistas na Venezuela.


Alexander Main & Dan Beeton - Jacobin - Tradução de Alejandro Garcia para o Diario Liberdade
wikimedia commons
No início deste Verão, o mundo viu a Grécia a tentar resistir a um desastroso “diktat” neoliberal e a receber uma sova dolorosa no processo. Quando o governo de esquerda grego decidiu fazer um referendo nacional sobre o programa de austeridade imposto pela “troika”, o Banco Central Europeu retaliou restringindo a liquidez dos bancos gregos. Com isso acarretou um fechamento prolongado dos bancos e submergiu a Grécia ainda mais na recessão.

Apesar dos eleitores gregos terem rejeitado em massa a austeridade, a Alemanha e o cartel de credores europeu foi capaz de subverter a democracia e obter exatamente o que queria: submissão total à sua agenda neoliberal. Na última década e meia, uma luta similar contra o neoliberalismo vem sendo travada em toda a extensão de um continente e maioritariamente fora do olhar do público. Ainda que Washington inicialmente tenha procurado anular toda a dissidência e frequentemente utilizando táticas mais violentas que as utilizadas contra a Grécia, a resistência da América Latina à agenda neoliberal tem sido parcialmente bem sucedida. É um conto épico que gradualmente vem vindo a ser conhecido graças à contínua exploração do massivo tesouro de telegramas diplomáticos dos Estados Unidos e difundidos pela WikiLeaks.

O neoliberalismo foi firmemente implantado na América Latina bem antes da Alemanha e as autoridades da zona euro terem imposto ajustes estruturais à Grécia e a outros países periféricos endividados. Através da coerção (e.g., condições anexadas a empréstimos do FMI) e endoutrinação (e.g., treinamento de “chicago boys” regionais apoiados pelos Estados Unidos), os Estados Unidos tiveram êxito, em meados dos anos 80, em difundir o evangelho da austeridade fiscal, desregulação, “mercados livres”, privatização e cortes draconianos no setor público por toda a América Latina.

O resultado foi incrivelmente parecido ao que vimos na Grécia: crescimento estagnado (quase nenhum crescimento per capita durante vinte anos de 1980-2000), aumento da pobreza, declínio do nível de vida para milhões e muitas novas oportunidades para os investidores internacionais e empresas fazendo dinheiro em pouco tempo. Começando nos finais dos anos 80, a região começou a ter convulsões e a levantar-se contra as políticas neoliberais. No início a rebelião era maioritariamente espontânea e desorganizada — como foi no caso venezuelano das revoltas do “Caracazo” no início de 1989.

Mas depois, candidatos anti-neoliberais começaram a ganhar eleições e, para choque do establishment da política externa dos EUA, um número crescente destes manteve as suas promessas de campanha e começou a implementar medidas anti-pobreza e políticas heterodoxas que reafirmavam o papel do estado na economia. De 1999 a 2008, candidatos com inclinação de esquerda ganharam eleições presidenciais em Venezuelana, Brasil, Argentina, Uruguai, Bolívia, Honduras, Equador, Nicarágua e Paraguai. Muita da história das tentativas dos governos dos EUA para conter e reverter a onda anti-neoliberal pode ser encontrada nas dezenas de milhares de telegramas diplomáticos dos EUA na região, difundidos pela WikiLeaks e datados desde os primeiros anos de George W. Bush até aos primeiros anos da administração do Presidente Obama.

Os telegramas — que analisamos no novo livro, The WikiLeaks Files: The World According to US Empire — revelam os mecanismos do dia-a-dia da política de intervenção de Washington na América Latina (e fazem do mantra do Departamento de Estado de que “os EUA não interfere na política interna de outros países” uma farsa). Apoio material e estratégico é providenciado aos grupos de oposição de direita, alguns dos quais são violentos e anti-democráticos. Os telegramas também pintam uma imagem vívida da mentalidade ideológica de Guerra Fria dos emissários mais velhos e os expõem a tentar usar medidas coercivas que fazem lembrar o recente estrangulamento aplicado à democracia grega.

De forma nada surpreendente, os principais meios de comunicação ignoraram ou falharam em grande medida em expor estas perturbadoras crônicas de agressão imperial, preferindo focalizar os relatos potencialmente embaraçosos dos diplomatas ou as ações ilegais de oficiais estrangeiros. Os poucos especialistas que deram uma análise de fundo aos telegramas afirmaram que não havia uma disparidade significativa entre a retórica oficial dos EUA e a realidade descrita nos telegramas. Nas palavras de um analista de relações internacionais dos Estados Unidos, “não obtemos uma imagem dos Estados Unidos como sendo esse todo poderoso mestre das marionetas a tentar puxar as cordas dos vários governos à volta do mundo para servir os seus interesses corporativos.” No entanto, uma leitura atenta dos telegramas desmente claramente esta afirmação.

“Isto Não é Chantagem”

No final de 2005, na Bolívia, Evo Morales teve uma vitória esmagadora nas eleições presidenciais com base em uma reforma constitucional, direitos indígenas e a promessa de lutar contra a pobreza e o neoliberalismo. No dia 3 de Janeiro, apenas dois dias após a sua tomada de posse, Morales recebeu uma visita do embaixador David L. Greenlee. O embaixador foi direto ao assunto: O visto dos EUA sobre a ajuda multilateral à Bolívia dependeria do bom comportamento do governo de Morales. Podia ser uma cena do Poderoso Chefão.

[O embaixador] mostrou a importância crucial das [instituições] financeiras internacionais, das quais a Bolívia dependia para assistência, tais como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional. “Quando pensar no BID, deve pensar nos EUA,” disse o embaixador, “isto não é chantagem, é a simples realidade.”

No entanto, Morales aferrou-se à sua agenda. Durante os dias seguintes forjou planos para regular novamente o mercado de trabalho, renacionalizar a indústria dos hidrocarbonetos e estreitar a cooperação com o arqui-inimigo de Washington, Hugo Chavez. Em resposta, Greenlee sugeriu um menu de opções para forçar Morales a curvar-se perante a vontade do seu governo. Estas incluíam; vetar empréstimos multilaterais de vários milhões de dólares, adiar os já agendados alívios multilaterais da dívida, desencorajar os fundos da Millennium Challenge Corporation (que a Bolívia nunca recebeu até hoje, apesar de ser um dos países mais pobres do hemisfério) e cortar o “apoio material” às forças de segurança bolivianas.

Infelizmente para o Departamento de Estado, em pouco tempo, ficou claro que este tipo de ameaças seriam devidamente ignoradas. Morales já tinha decidido reduzir drasticamente a dependência da Bolívia nas linhas de crédito multilaterais que requisitassem uma habilitação do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos. Poucas semanas depois de tomar posse, Morales anunciou que a Bolívia já não estaria dependente do FMI, e deixaria o acordo de empréstimos com o Fundo expirar. Anos mais tarde, Morales, aconselharia a Grécia e outros países endividados da Europa a seguir o exemplo de Bolívia e a “libertarem-se da ordem do Fundo Monetário Internacional.”

Não conseguindo forçar Morales às suas jogadas, o Departamento de Estado começou, então, a centrar-se no fortalecimento da oposição boliviana. A região controlada pela oposição, Media Luna, começou a receber cada vez mais assistência dos Estados Unidos. Um telegrama de Abril de 2007, discute “um maior esforço da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) para fortalecer os governos regionais como contrapeso ao governo central.”

Um relatório da USAID de 2007 mencionava que o seu Office of Transition Initiatives (OTI) tinha aprovado 101 bolsas por US$4.066.131 para ajudar os governos departamentais a operar mais estrategicamente.” Também se fez chegar fundos aos grupos indígenas que se opunham à visão de Morales para as comunidades indígenas.”

Um ano mais tarde os departamentos de Media Luna, iriam empenhar-se na rebelião contra o governo de Morales, primeiramente com um referendo sobre a autonomia, apesar destes terem sido considerados ilegais pelas autoridades judiciais; e posteriormente apoiando os protestos violentos pró-autonomia que tiveram como consequência pelo menos 20 simpatizantes do governo mortos.

Muitos acreditavam que se estava a desenvolver uma tentativa de golpe de estado. A situação apenas se acalmou com a pressão de todos os outros presidentes da América do Sul, que emitiram uma declaração conjunta de apoio ao governo constitucional do país. Mas enquanto que a América do Sul se unia em apoio a Evo, os Estados Unidos seguiam em comunicação regular com os líderes da oposição do movimento separatista, mesmo quando estes falavam em “rebentar com as condutas de gás” e usar a “violência como uma probabilidade de forçar o governo a levar a sério qualquer diálogo.”

Contrariamente à posição oficial durante os eventos de Agosto e Setembro de 2008, o Departamento de Estado, levou muito a sério a possibilidade de um golpe de estado ou assassinato do presidente boliviano, Evo Morales. Um telegrama revela planos da Embaixada dos EUA em La Paz para tal caso: “[o Emergency Action Committee] irá desenvolver, com [o US Southern Command Situational Assessment Team], um plano de resposta no caso de uma urgência repentina, i.e. um golpe de estado ou a morte do Presidente Morales,” lê-se no telegrama.

Os acontecimentos de 2008 foram o maior desafio até agora da presidência de Morales e a situação em que ele esteve mais perto de ser derrubado. As preparações para uma possível saída da presidência de Morales revelam que os Estados Unidos, pelo menos, acreditaram que a ameaça a Morales era bastante real. O fato de não ter dito nada publicamente apenas sublinha de que lado Washington se posicionava durante o conflito e qual desfecho provavelmente preferiria.

Como Funciona

Alguns dos métodos de intervenção usados na Bolívia foram emulados de outros países com governos de esquerda ou com movimentos fortes de esquerda. Por exemplo, após o regresso dos Sandinistas ao poder, em Nicarágua, no ano 2007, a embaixada dos EUA em Manágua trabalhou “a toda a velocidade” para reforçar o apoio ao partido de oposição de direita, o Alianza Liberal Nicaraguense (ALN). Em Fevereiro de 2007, a embaixada reuniu com o coordenador estratégico do ALN e explicou-lhe que os EUA “não providenciavam assistência direta a partidos políticos,” mas — de maneira a ultrapassar esta restrição — sugeriu que o ALN estivesse mais estreitamente coordenado com ONGs amigas que pudessem receber fundos dos EUA.

A líder do ALN disse que “avançaria com uma lista extensiva da lista ONGs que, de fato, apoiam os esforços do ALN” e a embaixada proporcionou-lhe “encontros com os diretores para o país do IRI [Instituto Republicano Internacional] e NDI [Instituto Internacional Democrata para os Assuntos Internacionais].” O telegrama também faz notar que a embaixada iria “dar seguimento ao incremento de angariação de fundos” para o ALN.

Telegramas como este deveriam ser de leitura obrigatória para estudantes da diplomacia dos EUA e aqueles que querem perceber como o sistema de “promoção de democracia” realmente funciona. Através do USAID, Fundação Nacional para a Democracia (NED), NDI, IRI e outras entidades para-governamentais, o governo dos EUA fornece uma ampla assistência aos movimentos políticos que apoiem os objetivos econômicos e políticos dos EUA.

Em Março de 2007, o embaixador dos EUA na Nicarágua pediu ao Departamento de Estado que providenciasse aproximadamente 65 milhões de dólares acima dos níveis de base recentes nos próximos quatro anos — ao longo das próximas eleições presidenciais de maneira a financiar o “fortalecimento dos partidos políticos, ONGs “democráticas” e “pequenas e flexíveis subvenções de decisão rápida a grupos comprometidos em desenvolver esforços críticos que defendam a democracia em Nicarágua, que façam avançar os nossos interesses e se contraponham a aqueles que se mobilizam contra nós.”

No Equador, a embaixada dos EUA opôs-se ao economista de esquerda, Rafael Correa, vencedor destacado nas eleições de 2006 e o levaram ao cargo presidencial. Dois meses antes dessas eleições, o conselheiro político da embaixada alertou Washington que “se podia esperar que Correa se juntasse ao grupo Chavez-Morales-Kirchner de líderes sul americanos nacionalistas-populistas,” e fazia notar que a embaixada tinha “avisado os nossos contatos políticos, econômicos e midiáticos da ameaça que Correa representa para o futuro de Equador e desencorajou as alianças políticas que podiam equilibrar a percepção de Correa com o radicalismo.” Imediatamente após a eleição de Correa, a embaixada enviou um telegrama ao Departamento de Estado com o seu plano de jogo:

Não mantemos ilusões de que as tentativas do Governo dos Estados Unidos possam influenciar a direção do novo governo ou do Congresso, mas esperamos maximizar a nossa influência junto com outros equatorianos e grupos que partilham os nossos pontos de vista. As propostas de reformas de Correa e atitude perante o Congresso e partidos políticos tradicionais, se não for controlada, pode prolongar o período atual de conflitos e instabilidade.

Os maiores medos da embaixada foram confirmados. Correa anunciou que fecharia a base aérea dos EUA em Manta, aumentaria os gastos sociais, e avançaria uma assembleia constituinte. Em Abril de 2007, 80 porcento de eleitores equatorianos validaram a proposta de uma assembleia constituinte e em 2008, 62 porcento aprovaram a nova constituição que consagrava uma série de princípios progressistas, incluindo a soberania alimentar, direito à habitação, saúde e emprego e controle governamental sobre o banco central (um enorme não-não à cartilha neoliberal).

No início de 2009, Correa anunciou que o Equador cumpriria parcialmente com a sua dívida externa. A embaixada estava furiosa com esta decisão e outras ações recentes, como a decisão de Correa de alinhar Equador mais estreitamente com a Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (ALBA) de esquerda (que tinha sido iniciada pela Venezuela e Cuba em 2004 como contrapeso à Área de Comércio Livre das Américas (ALCA), naquela altura promovida pela administração Bush. Mas o embaixador estava também consciente de que tinha pouca influência sobre ele:

Estamos a transmitir a mensagem em privado de que as ações de Correa irão ter consequências na sua relação com a nova administração de Obama, enquanto evitamos comentários públicos que seriam contraproducentes. Não recomendamos que se termine qualquer programa do Governo dos Estados Unidos que sirvam os nossos interesses uma vez que essa opção apenas enfraqueceria os incentivos de Correa de retroceder para uma posição mais pragmática.

O incumprimento parcial teve sucesso e aforrou ao governo equatoriano aproximadamente 2 bilhões de dólares. Em 2011, Correa recomendou o mesmo tratamento para os países europeus endividados, particularmente Grécia, aconselhando-os a não cumprir os pagamentos da dívida e 'ignorar o conselho do FMI.'

As Ruas Estão Quentes

Durante a Guerra Fria, a suposta ameaça do avanço soviético e cubano serviu para justificar um sem número de intervenções para remover governos de inclinação de esquerda e apoiar regimes militares de direita. De maneira similar, os telegramas do WikiLeaks mostraram como, nos anos 2000, o espectro do “Bolivarianismo” foi usado para validar intervenções contra novos governos de esquerda anti-liberais, como o da Bolívia, representado como tendo “caído sem reservas no abraço venezuelano;” ou do Equador, visto como um “testa-de-ferro” para Chávez”

As relações com o governo de esquerda de Hugo Chávez amargaram desde o início. Chávez eleito presidente pela primeira vez em 1998, rejeitando amplamente as políticas econômicas neoliberais, desenvolveu uma relação estreita com Cuba de Fidel Castro e criticou, bem alto, o assalto da administração Bush ao Afeganistão após os ataques de 9/11 (os EUA retiraram o seu embaixador de Caracas após Chavéz ter proclamado: “Não podes lutar contra o terrorismo com terrorismo”).

Mais tarde fortaleceu o controle governamental do setor petrolífero, aumentando os valores de royalties pagos pelas empresas estrangeiras e usou as receitas do petróleo para financiar o sistema público de saúde, educação e programas alimentares para os pobres.

Em Abril de 2002, a administração Bush validou publicamente um golpe de estado, de pequena duração, que removeu Chávez do poder por quarenta e oito horas. Os documentos da Fundação Nacional para a Democracia, obtidos através da Freedom of Information Act [Lei pela Liberdade de Informação], mostraram que os EUA forneceram fundos para a “promoção da democracia” e treinamento a grupos que apoiassem o golpe de estado e que mais tarde viriam a estar envolvidos em esforços para remover Chávez através de “greves” administrativas que paralisaram a indústria petrolífera, nos finais de 2002 e mergulharam o país em recessão. Os telegramas da WikiLeaks mostram que após essas tentativas falhadas de derrubar o governo eleito venezuelano, os EUA continuaram a apoiar a oposição venezuelana através da NED e USAID.

Em um telegrama de Novembro de 2006, William Brownfield, embaixador naquela altura, explicava a estratégia de USAID/OTI para debilitar a administração de Chávez:

Em Agosto de 2004, o embaixador delineava os 5 pontos estratégicos da sua equipe para o país neste período [2004-2006] que serviriam de guia para a embaixada... o foco da estratégia é: 1) Fortalecimento das Instituições Democráticas, 2) Penetrar na Base Política de Chávez, 3) Dividir o Chavismo, 4) Proteger os negócios vitais dos EUA, e 5) Isolar Chávez internacionalmente.

Os laços apertados que existem entre a embaixada dos EUA e os vários grupos de oposição são evidentes em numerosos telegramas. Um telegrama de Brownfield relaciona a Súmate — uma ONG que teve um papel central nas campanhas de oposição — aos “nossos interesses na Venezuela.” Outros telegramas revelam que o Departamento de Estado fez pressão internacional para que se demonstrasse apoio à Súmate e encorajou apoio financeiro, político e legal dos EUA a esta organização, muito dele canalizado através da NED.

Em Agosto de 2009, a Venezuela foi atingida por protestos violentos de oposição (como tinha ocorrido um variado número de vezes sob Chávez e depois com o seu sucessor Nicolas Maduro). Um telegrama secreto de 27 de Agosto cita o contratante Development Alternatives Incorporated (DAI) referindo-se a “todas” as pessoas protestando naquele momento como “nossos beneficiários”:

[O empregado da DAI] Eduardo Fernandez disse que “as ruas estão quentes” referindo-se aos cada vez maiores protestos contra as tentativas de Chávez de consolidar o poder e que “todas estas pessoas (organizando os protestos) são nossos beneficiários.”

Os telegramas também revelam que o Departamento de Estado providenciou treinamento e apoio a um líder estudante que reconhecidamente tinha liderado multidões com a intenção de “linchar” um governador Chavista: “Durante o golpe de estado de Abril de 2002, [Nixon] Moreno participou nas manifestações no estado de Merida, liderando multidões que marcharam na capital do estado para linchar o governador Florencio Porras do MVR.”

No entanto, uns anos depois disto, outro telegrama mostra: “Moreno participou no International Visitor Program [do Departamento de Estado] em 2004.” Moreno viria mais tarde a ser procurado por tentativa de homicídio e ameaças a uma polícia, além de outras acusações. Também na linha da estratégia dos cinco pontos, como delineava Brownfield, o Departamento de Estado priorizava os seus esforços no isolamento internacional do governo venezuelano e em contrabalançar a sua influência em toda a região. Os telegramas mostram como os chefes das missões diplomáticas na região desenvolveram estratégias coordenadas para contrabalançar a “ameaça” regional.

Assim como a WikiLeaks inicialmente revelou em Dezembro de 2010, os chefes de missão para 5 países sul americanos encontraram-se no Brasil em Maio de 2007 para desenvolver uma resposta conjunta aos alegados “planos agressivos” do Presidente Chávez… de criar um movimento unificado Bolivariano por toda a América Latina.” Entre as áreas de ação que os chefes de missão havia um plano de “continuar a fortalecer laços com aqueles líderes militares na região que partilham a nossa preocupação com Chávez.” Um encontro similar dos chefes de missão dos EUA da América Central — focada na “ameaça” de “atividades políticas populistas na região” — realizou-se na embaixada dos EUA em El Salvador em Março de 2006.

Os diplomatas dos EUA fizeram grandes esforços para tentar prevenir que os governos das Caraíbas e América Central se juntassem à Petrocaribe, um acordo regional de energia de Venezuela que providencia petróleo aos seus membros em termos extremamente preferenciais. Telegramas vindos a público mostram que os oficiais norte-americanos reconheciam, de forma privada, os benefícios econômicos do acordo para os países membros, assim como mostravam preocupação que a Petrocaribe fosse aumentar a influência daVenezuela na região.

No Haiti, a embaixada trabalhou de forma estreita com grandes empresas de petróleo para tentar prevenir que o governo de René Préval se juntasse à Petrocaribe, apesar de reconhecerem que “liberaria 100 milhões de dólares por ano,” como foi reportado por Dan Coughlin e Kim Ives na Nation. Em Abril de 2006 a embaixada “telegrafou” de Porto Príncipe: “Continuaremos a pressionar [o presidente René do Haiti] Preval contra a sua adesão à PetroCaribe. O embaixador verá hoje o conselheiro chefe de Preval, Bob Manuel. Em reuniões anteriores este compreendeu as nossas preocupações e está consciente que um acordo com Chávez iria provocar problemas conosco.”

O Histórico da Esquerda

Devemos ter em conta que os telegramas do WikiLeaks não mostram vislumbres das atividades mais secretas das agências de informação dos EUA e são provavelmente apenas a ponta do icebergue no que toca às interferências políticas de Washington na região. No entanto os telegramas fornecem evidências alargadas da persistência e dos esforços determinados dos diplomatas dos EUA em intervir contra os governos de esquerda na América Latina, usando a alavancagem financeira e os múltiplos instrumentos disponíveis na caixa de ferramentas para a “promoção da democracia” — e às vezes até através de meios violentos e ilegais.

Apesar do restabelecimento das relações diplomáticas com Cuba por parte da administração Obama, não há indicações de que as políticas em relação à Venezuela e outros governos de esquerda da América Latina tenham mudado significativamente. Não há dúvida que a hostilidade da administração em relação ao governo eleito da Venezuela é inexorável. Em Junho de 2014, o Vice Presidente Joe Biden deu início à Caribbean Energy Security Initiative, visto como um “antídoto” à Petrocaribe. Em Março de 2015, Obama declarou Venezuela como “ameaça extraordinária à segurança nacional” anunciado sanções contra oficiais venezuelanos, uma atitude criticada de forma unânime por outros países na região.

Mas, apesar das agressões incessantes dos EUA, a Esquerda, em grande medida, tem prevalecido na América Latina. Com a excepção de Honduras e Paraguai, onde golpes de estado de direita derrubaram líderes eleitos, quase todos os movimentos de esquerda que chegaram ao poder nos últimos quinze anos mantêm-se ainda hoje no poder.

Principalmente como resultado destes governos, de 2002 a 2013 a taxa de pobreza da região baixou de 44% para 28% após ter, de fato, piorado nas duas décadas anteriores. Estes sucessos e vontades dos líderes de esquerda de correr riscos de maneira a se libertarem do diktat neoliberal, deve hoje ser uma fonte de inspiração para a esquerda anti-austeridade da Europa. É certo que alguns dos governos estão hoje a passar por dificuldades significativas, em parte devido à recessão econômica regional que afetou os governos de direita e de esquerda de igual maneira. Mas visto através das lentes dos telegramas, há boas razões para questionar se todas estas dificuldades são fomentadas internamente.

Por exemplo, em Equador — onde o presidente Correa está sob ataque da Direita e de alguns setores da Esquerda — os protestos contra as novas propostas de impostos progressivos envolve os mesmos homens de negócios, alinhados com a oposição, com quem os diplomatas dos EUA são vistos a definir estratégias nos telegramas.

Em Venezuela, onde um sistema de controlo monetário disfuncional gerou uma enorme inflação, protestos violentos de estudantes de direita desestabilizaram seriamente o país. As probabilidades são extremamente altas de que alguns destas pessoas que protestam tenham recebido financiamentos e/ou treinamento da USAID ou NED, que viram o seu orçamento para Venezuela aumentar 80 porcento de 2012 para 2014.

Ainda há muito mais a aprender dos telegramas da WikiLeaks. Para os capítulos América Latina e as Caraíbas” do “The WikiLeaks Files”, examinamos atentamente centenas de telegramas e fomos capazes de identificar distintos padrões de intervenção dos EUA que descrevemos em maior profundidade no livro (alguns destes já previamente reportados por outros). Outros autores do livro fizeram o mesmo para outras regiões do mundo. Mas há mais de 250,000 telegramas (quase 35,000 só da América Latina) e há sem dúvida muitos outros aspectos referenciáveis da diplomacia dos EUA na atualidade que estão à espera de ser desmascarados.

Tristemente, após a excitação inicial, na altura que os telegramas foram inicialmente divulgados, poucos jornalistas e acadêmicos têm mostrado grande interesse no assunto. Até que isto mude, não teremos uma discrição completa de como os EUA se vêem a si mesmos no mundo e como o seu braço diplomático responde aos desafios à sua hegemonia. 
 
Fonte: CARTA MAIOR
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Lula e caçada da mídia

Lula, na calada da noite

redacao
Por redacao outubro 30, 2015 13:09
  
Lula, na calada da noite        
Não é coincidência que um dos filhos do ex-presidente Lula tenha sido intimado às 23h do dia do aniversário de 70 anos do pai.
Lula tem razão ao dizer isso.
Ele sabe há muito tempo como se joga o jogo dos que operam na calada da noite.
Lula foi enterrar sua mãe Lindu de algemas, acompanhado por policiais.
Tratado como um criminoso porque defendia o direito legítimo de greve num momento em que a lei e ordem eram o arbítrio.
O que está acontecendo com Lula e sua família, por mais incrível que possa parecer, se assemelha em muito à perseguição que ele viveu na ditadura militar.
O Estado de Direito e o respeito aos direitos cidadãos e humanos básicos estão sendo deixados de lado para subjugá-lo e intimidá-lo.
Um dos filhos de Lula, o de nome Luis Cláudio, que não é aquele Lulinha que durante anos e anos foi dito como um dos donos da Friboi, foi intimado e teve todos os documentos e computadores de sua empresa apreendidos por conta de um contrato de R$ 1,8 milhão com uma empresa do ramo automobilístico que, como dezenas de outras empresas, foi favorecida por uma MP justa de redução de impostos.
Luis Cláudio não era investigado no relatório elaborado pela Polícia Federal e nem pelo Ministério Público, mas um procurador externo à investigação acrescentou seu nome motivado por reportagens de veículos da imprensa.
A juíza que recebeu o pedido acatou. Sem também ter sequer um elemento concreto de qualquer ilegalidade no contrato. Pelo simples fato de o procurador externo ao processo ter dito que achava o contrato suspeito.
Isso não é pouca coisa.
Esse tipo de ousadia jurídica estabelece um novo padrão de autoridade no Brasil.
Juízes, procuradores, delegados e promotores têm se pronunciado fora dos processos e cada vez mais têm manifestado opinião a respeito de questões eleitorais e políticas em redes sociais e/ou eventos públicos.
E têm feito justiça sem levar em consideração os ritos processuais. E sem que haja nenhum controle social.
Lula, sua família e também o ex-ministro Gilberto Carvalho são as vítimas mais recentes e talvez mais importantes dos últimos tempos, mas o risco de isso vir a atingir qualquer um é imenso.
A democracia brasileira e suas instituições nunca correram tanto risco como no momento atual. O que estão fazendo com Lula é o teste para um xeque mate final.
Se a sociedade civil não reagir. Se os homens e mulheres públicos decentes não reagirem. Se os movimentos sociais não reagirem. O Brasil da calada da noite vai se ver livre para operar supostamente com base na lei e na ordem.
Na lei e na ordem que já nos levaram a ser um dos piores países em desigualdade do mundo e uma terra sem qualquer liberdade.
Por isso que a defesa de que Lula seja tratado com base no Estado de Direito passa a ser uma luta de todos que defendem a democracia.
Foto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula

Fonte: Blog do Rovai
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Lula: até feto na barriga da minha nora é suspeito     

publicado 29/10/2015
        
"Eu sobreviverei. E eles?"
lula no diretorio nacional
"É importante manter as conquistas que tivemos", disse Lula (foto: Dida Sampaio / Estadão Conteúdo)
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou da reunião do Diretório Nacional do PT, nesta quinta-feira (29). No discurso de abertura, Lula criticou a perseguição que sofre por parte do PiG, em relação a ele e até aos seus familiares.

"Eu ainda tenho mais três filhos que não foram denunciados e tenho sete netos. Isso não vai terminar nunca. Ainda tenho uma nora grávida, não sei qual é o processo que virá contra o meu neto que vai nascer", ironizou o ex-presidente, após as recentes denúncias contra seu filho, Luis Cláudio Lula da Silva.

Lula garantiu que a campanha difamatória da mídia não irá afetá-lo. “Serão três anos de pancadaria, mas eu vou sobreviver. Tem uma coisa que aprendi: enfrentar a diversidade. Podem ficar certos: eu vou sobreviver. E eles, terão a credibilidade que imaginam?”, indagou.

No encontro, Lula defendeu que a prioridade do PT no Congresso deve ser a aprovação das medidas de ajuste fiscal enviadas pelo governo. "Não podemos ficar mais seis meses discutindo o ajuste e a CPMF. Ou a gente vota, ou não governa e não passa dessa fase", disse. Para o Nunca Dantes, a ação é necessária para a economia voltar a crescer. "Sem a conclusão desse ajuste, ficamos numa confusão política muito grande", ponderou.

O ex-presidente criticou a onda de manobras que a oposição tenta emplacar para derrubar a presidenta Dilma. "Primeiro pediram recontagem de votos. Depois foram 19 pedidos de impeachment e quatro ações no TSE", enumerou o Nunca Dantes, que concluiu: "Se a moda pega, qualquer um que perca a eleição entra com pedido de impeachment".

Lula ressaltou que a crise econômica é mundial. "A economia internacional só vai se recuperar se o mundo voltar a consumir. É o único jeito. Apenas o Brasil no G-20 estimulou isso", disse.

Para o mercado interno, o ex-presidente vê duas soluções: aprovação de impostos ou políticas de crédito. "Por que a gente não faz um crédito consignado para o setor privado? A melhor forma de recuperar receita é voltar a crescer", sugeriu Lula. "O fortalecimento das políticas de crédito já acontece. O Banco do Brasil financia as cadeias produtivas", concluiu.

Apesar do pessimismo com o cenário atual, Lula declarou que é importante comparar os dados de hoje com os de 1999, no governo FHC. "O Brasil quebrou três vezes, teve que pedir socorro ao FMI e aceitou todas as políticas que o FMI mandou cumprir. Temos que mostrar o que foi o governo FHC e dizer a eles: parem de ser bestas", disse o ex-presidente, aplaudido pela plateia.

Além de Lula, participam do encontro o presidente do partido, Rui Falcão, os governadores Wellington Dias (PI) e Tião Viana (AC), o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), o líder do PT no Senado, Humberto Costa (CE) e o líder do PT na Câmara, Sibá Machado.

Fonte: CONVERSA AFIADA
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Instituto Lula desmonta o “outro lado” de Época: Manipula dados, não respeita contraditório e engana os leitores; vende como “exclusivo” tema já tratado por sua concorrente mais famosa e ainda mais mentirosa

publicado em 31 de outubro de 2015 às 13:40
época
O lado escuro do ”outro lado” no jornalismo sensacionalista de Época
31/10/2015 08:53
da Assessoria de Imprensa do Instituto Lula 
A revista Época especializou-se em distorcer e manipular documentos, muitos deles vazados de forma ilegal, para difamar e caluniar o ex-presidente Lula. Esta semana, a revista, e o autor da matéria, Thiago Bronzatto, fazem isso novamente.
A revista não tem interesse em entender ou reportar os fatos de forma fiel, quer apenas construir ilações. Não tem o que se chama de jornalistas investigativos: são apenas redatores sensacionalistas, operando documentos vazados ilegalmente. Não apresenta fatos, quer apenas especular e fazer barulho em cima de tais documentos, tentando criar factoides políticos, vender mais revista e fazer audiência em redes sociais.
Não respeita o contraditório e engana os leitores, vendendo como “novidade” matérias requentadas. Por exemplo, colocando a tarja “Exclusivo” na capa desta semana, para um tema tratado em agosto por sua concorrente mais famosa e ainda mais mentirosa.
Para simular que ouve o “outro lado”, quase toda sexta-feira envia à assessoria do Instituto Lula burocráticos e-mails com perguntas cifradas, que escondem tema principal da matéria e o teor das ilações. A essa altura da produção da revista, as teses e especulações já estão prontas e, muitas vezes, até divulgadas no twitter do editor-chefe.
Nestes e-mails, seus jornalistas disfarçam ou sonegam informações necessárias para as respostas adequadas, como aconteceu mais uma vez nesta sexta-feira. Procurada pelo repórter Thiago Bronzatto, com perguntas que remetiam a um relatório do Coaf vazado de forma ilegal para a revista Veja, em agosto, a assessoria de imprensa do Instituto Lula perguntou diretamente: “É sobre o relatório do Coaf que a Veja já deu em agosto?”. O repórter de Época se recusou a esclarecer essa questão simples. Pior: ele mentiu, associando as perguntas a diferentes operações da Polícia Federal e Ministério Público, quando na matéria ele diz, e não dá para saber se é verdade também, que obteve o documento através da CPI do BNDES.
A questão não é menor: existe hoje uma investigação sobre o vazamento das informações desse relatório do COAF. O ex-presidente Lula e a empresa LILS solicitaram ao Ministério da Justiça, ao Ministério da Fazenda e à Procuradoria-Geral da República que apurem, na competência de cada instituição, as responsabilidades pela violação criminosa do sigilo bancário da empresa de palestras criada por Lula após deixar a presidência da República, a LILS.
No e-mail, o repórter já criminaliza os fatos, ao dizer que Lula teria feito “operações atípicas” no “mercado segurador”. Na realidade Lula apenas adquiriu um plano de previdência privada com o dinheiro ganho em palestras. É isso que informa o relatório do COAF, vazado criminosamente para Veja e requentado pela Época.
Numa apuração honesta, não era necessário perguntar nada ao Instituto Lula; bastaria conferir a nota que emitimos em 18 de agosto.
Não há nada de ilegal na movimentação financeira do ex-presidente. Os recursos são oriundos de atividades profissionais, legais e legítimas de quem não ocupa nenhum cargo público: os valores mencionados no vazamento ilegal se referem a 70 palestras contratadas por 41 empresas diferentes, listadas no link acima. Todas palestras realizadas, contabilizadas e com os devidos impostos pagos. Tem palestra até para a Infoglobo, do mesmo grupo de comunicação que edita a revista Época.
Se Época acha que o valor pago é alto, poderia perguntar à direção do Infoglobo, que pagou o valor da palestra e que explicou, no jornal O Globo, que o fez por “participar de iniciativas que contribuem para o desenvolvimento e a promoção do Rio de Janeiro. Em 2013, com esse objetivo, a empresa apoiou a Fecomércio-RJ na realização de um seminário sobre o mapa do comércio no Estado do Rio. Além de divulgar o evento em seus jornais, a Infoglobo arcou com os custos dos palestrantes, inclusive do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.”
Fazer palestras para uma empresa não implica em nenhuma outra relação e é uma prestação de serviço pontual que mantém a total independência do ex-presidente em relação ao contratante. Tanto que o ex-presidente ter feito uma palestra para a Infoglobo não o impede, ou sua família ,de mover processos contra o jornal, por exemplo, pela mentira contra o filho do ex-presidente publicada por Lauro Jardim em sua estreia em O Globo, na capa dominical do diário.  Mentira pela qual até hoje, nem o colunista nem o jornal se retrataram publicamente.
Jornalistas de Época caluniam, mais uma vez, ao chamar Lula de lobista e já estão sendo processados por isso na justiça, junto com o editor-chefe Diego Escosteguy.
Sobre a patética campanha de parte da imprensa tradicional e familiar brasileira contra Lula e sua família, que só esse mês rendeu 5 capas ofensivas de revistas semanais contra ele, o ex-presidente, com tranquilidade, declarou na última quinta-feira em Brasília:
“Eu só queria que vocês não ficassem preocupados com esses problemas porque digo sempre: ninguém, podem ter certeza, ninguém precisa ficar com pena. Se tem uma coisa que aprendi na vida é enfrentar adversidades. Podem ter certeza. Se o objetivo é truncar qualquer perspectiva de futuro, então vão ser três anos de muita pancadaria. Três anos. E podem ficar certos: eu vou sobreviver. Não sei se eles sobreviverão com a mesma credibilidade que eles acham que tem. Mas eu vou sobreviver.”

ÍNTEGRA DA TROCA DE E-MAIL COM THIAGO BRONZATTO, FUNCIONÁRIO DA REVISTA ÉPOCA
Thiago Bronzatto – Redação Época Brasília – Editora Globo tbronzatto@edglobo.com.br
30 de outubro de 2015, 11:25

Caros,
Tudo bem?
Estamos fazendo uma matéria para a próxima edição da revista ÉPOCA na qual mencionaremos o ex-presidente Lula. Vocês poderiam, por favor, me ajudar a esclarecer as dúvidas abaixo?
1-) No âmbito da operação Zelotes, foram identificados repasses de recursos da empresa L.I.L.S. para os filhos do ex-presidente e as suas respectivas empresas. Qual a razão dessas transferências?
2-) Qual a posição do ex-presidente Lula em relação à intimação da PF para ouvir o seu filho Luis Cláudio?
3-) No âmbito das investigações da Lava Jato e do MPF, há informações de que Lula tenha realizado movimentações financeiras no mercado segurador consideradas atípicas. O ex-presidente tem conhecimento disso? Qual a sua posição?
Estamos fechando hoje às 16h. Qualquer dúvida, estou nos contatos abaixo.
Aproveito este e-mail para reiterar o pedido de entrevista presencial com o ex-presidente Lula, enviado no dia 29 de junho deste ano, conforme sugerido pelo próprio Instituto Lula em nota publicada em seu site. Até agora, não tive nenhuma resposta sobre a minha demanda.
Abraço e obrigado,

Resposta da Ass. De Imprensa do Instituto Lula imprensa@institutolula.org
30 de outubro de 2015, 13:25

Caro Thiago,
É sobre o relatório do Coaf que a Veja já deu em agosto?
Att,

Thiago Bronzatto às 13:29
Caro,
Trata-se de matéria diferente, como você deve ter percebido em nossas perguntas.
Abraço,
Thiago
Ass. De Imprensa Instituto Lula às 13:54
Caro,
Que é outra matéria é óbvio. O tempo espaço impede que uma matéria da Época em outubro seja a mesma da Veja em agosto. Seria até plágio.
O documento base, o qual você não identifica, nem explica, como é habitual nos seus “outros lados”, parece o mesmo, pelas perguntas 1 e 3. Como não tenho certeza ser o mesmo, perguntei. E você não respondeu.
Sobre esse documento, há uma investigação em curso sobre o vazamento das informações nele, que estavam sob sigilo de justiça.
A Veja fez até um infográfico com ele na época, com perdão do trocadilho.
Tiago, a gente já respondeu ao seu pedido de entrevista faz tempo, você apenas falha em compreender isso e faz esse copiar-colar toda a sexta-feira. Não haverá entrevista para a Época, porque a revista é considerada um lixo, como foi publicamente dito. E pela existência de ações judiciais e a necessidade de correções factuais em matérias anteriores que a revista Época, e você especificamente, jamais fizeram.
Atenciosamente,
Thiago Bronzatto, às 14:02
Caro, eu gostaria apenas que você respondesse objetivamente as minhas questões. Posso considerar o seu e-mail como resposta oficial da assessoria de imprensa do Lula?
Abraço,
Thiago
Assessoria de Imprensa do Instituto Lula, às 14:19
Caro Thiago,
E eu gostaria apenas que você fizesse matérias de forma objetiva, imparcial, sem sensacionalismo e com correção factual. E também com  a devida checagem de informações, sem pegadinhas e realmente interessado em ouvir o outro lado. Mas como dizem os Rolling Stones, você não pode ter sempre o que você quer.
Todos os meus e-mails para você, assim como todas as suas mensagens para mim, podem se tornar públicos a qualquer momento que você quiser ou que nós quisermos, como já fizemos em outras ocasiões.
Atenciosamente

Fonte: VIOMUNDO
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Instituto Lula: “revista Época é um lixo”


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Esta semana foi interessante.
Desesperados e derrotados, golpistas se acorrentaram numa pilastra da Câmara. Ficaram apenas pouco tempo, naturalmente, porque eram meia dúzia de engomadinhos covardes e oportunistas, provavelmente pagos por políticos corruptos da oposição.
Agora as revistas semanais emulam a ação patética e, igualmente desesperadas com o fracasso do golpe contra o voto, acorrentaram-se a sua nova tara: prender o ex-presidente Lula.
Os golpistas só querem saber de prisão, prisão, prisão. São tão tarados por isso que estão se acorrentando eles mesmos.